Olho nas ruas, governo impedirá anistia a caixa 2

Folha de S.Paulo

A fórmula é antiga. Às vezes funciona, outras não. Depende do grau da confusão. Se o governo de plantão mergulha numa forte agenda negativa, procura-se uma positiva para sair da crise.

Foi o que o governo montou neste domingo (27). Desgastado pelo episódio que levou à demissão de Geddel Vieira Lima, o presidente Michel Temer anunciou que vai impedir qualquer tentativa de anistiar crimes de caixa dois em eleições passadas.

Para reforçar seu anúncio, numa raríssima entrevista num domingo, Temer convidou para o ato os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Rodrigo Maia. Sem gravata, os três disseram que não vão endossar uma anistia ao caixa dois.

A escolha do tema para virar o jogo da crise, gerada pelos torpedos disparados pelo ex-ministro Marcelo Calero na direção do próprio Temer, foi feita de “olho nas ruas”. O próprio presidente admitiu que há um movimento delas contra a anistia e “temos que atendê-las”.

Ou seja, para se desviar das críticas de que a cúpula do governo tentou enquadrar o ex-ministro da Cultura para resolver um problema particular de um ministro, o Palácio do Planalto busca fazer uma tabelinha com as ruas para ficar bem na foto.

Talvez o governo não estivesse tão acuado se, desde o início, houvesse optado por decisão mais sintonizada com a população: afastar de cara Geddel assim que foi revelado que ele pressionava um colega a liberar um empreendimento imobiliário na Bahia no qual tinha interesse direto.

Pegou muito mal saber que, num país ainda em forte crise econômica, a cúpula do governo gastou energia para solucionar uma questão menor.

Por sinal, o presidente Temer ainda não conseguiu atender a outras expectativas, como tirar o Brasil da recessão. Claro que, como ele próprio disse, o desafio era bem maior do que o previsto, mas esta frustração já preocupa sua equipe. Um assessor alerta: é preciso reagir antes que a paciência das ruas acabe.

Odebrecht diz que caixa 2 de Serra foi pago na Suíça

Folha de S.Paulo 

A Odebrecht apontou à Lava Jato dois nomes como sendo os operadores de R$ 23 milhões repassados pela empreiteira via caixa dois à campanha presidencial de José Serra, hoje chanceler, na eleição de 2010. A empresa afirmou ainda que parte do dinheiro foi transferida por meio de uma conta na Suíça.

O acerto do recurso no exterior, segundo a Odebrecht, foi feito com o ex-deputado federal Ronaldo Cezar Coelho (ex-PSDB e hoje no PSD), que integrou a coordenação política da campanha de Serra. O caixa dois operado no Brasil, de acordo com os relatos, foi negociado com o também ex-deputado federal Márcio Fortes (PSDB-RJ), próximo de Serra.

Os repasses foram mencionados por dois executivos da Odebrecht nas negociações de acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR), em Brasília, e a força-tarefa da Lava Jato, em Curitiba. Um deles é Pedro Novis, presidente do conglomerado de 2002 a 2009 e atual membro do conselho administrativo da holding Odebrecht S.A. O outro é o diretor Carlos Armando Paschoal, conhecido como CAP, que atuava no contato junto a políticos de São Paulo e na negociação de doações para campanhas eleitorais.

Ambos integram o grupo de 80 funcionários (executivos e empregados de menor expressão) que negociam a delação. Mais de 40 deles, incluindo Novis e Paschoal, já estão com os termos definidos, incluindo penas e multas a serem pagas. Falta apenas a assinatura dos acordos, prevista para ocorrer em meados de novembro.

A Folha revelou em agosto que executivos da Odebrecht haviam relatado à Lava Jato o pagamento de R$ 23 milhões (R$ 34,5 milhões, corrigidos pela inflação) por meio de caixa dois para a campanha de Serra em 2010, quando ele perdeu para a petista Dilma Rousseff. Foi a primeira menção ao nome de Serra na investigação que apura esquema de desvio de recursos na Petrobras.

Para corroborar os fatos relatados, a Odebrecht promete entregar aos investigadores comprovantes de depósitos feitos na conta no exterior e também no Brasil.

Segundo informações do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), a empreiteira doou oficialmente em 2010 R$ 2,4 milhões para o Comitê Financeiro Nacional da campanha do PSDB à Presidência da República (R$ 3,6 milhões em valores corrigidos).

Os executivos disseram aos procuradores que o valor do caixa dois foi acertado com a direção nacional do PSDB, que depois teria distribuído parte dos R$ 23 milhões a outras candidaturas.

O nome de Serra é um dos que apareceram na lista de políticos encontrada na casa do presidente da Odebrecht Infraestrutura, Benedicto Barbosa da Silva Júnior, o BJ, preso durante a 23ª fase da Operação Lava Jato, batizada de Acarajé, em fevereiro deste ano.