Coluna: A família e o Enem

Por Menelau Júnior

Pesquisadores da USP chegaram a uma conclusão: 80% da nota que um aluno obtém no Enem está diretamente relacionada a seu estilo de vida, e não à escola onde estuda. Traduzindo: alunos com mais condições financeiras têm, teoricamente, mais chances na hora da prova.

A constatação não é nova. Pesquisadores dos Estados Unidos já haviam chegado à mesma conclusão: a participação da escola em resultados de testes dessa natureza não é tão grande quanto se imaginava. Mas, antes que comecem a pensar que boas escolas e bons professores não fazem diferença, vamos compreender melhor esses resultados. Sem demagogia.

O que os pesquisadores constataram é meio óbvio: alunos com maior poder aquisitivo têm mais oportunidades de acesso à cultura. E aí se incluem viagens a museus, leitura de livros e revistas diversos, viagens e mais viagens com roteiros culturais. Famílias com mais condições financeiras dão mais condições para que seus filhos façam matérias isoladas, cursos de extensão, aulas de outro idioma. Adolescentes com melhores condições financeiras vão mais a teatros, a cinema, a livrarias. Passam mais tempo acessando a internet, relacionam-se com pessoas com grau de instrução geralmente mais elevado. Ou seja, têm uma vida que os direciona ao conhecimento que não está necessariamente nos livros didáticos. E isso faz muita diferença.

Além disso, esses jovens normalmente não precisam trabalhar, não passam horas em transporte público e têm tudo nas mãos. Com todas as condições favoráveis para que aprendam, a escola acaba não fazendo tanta diferença como se imaginava. Indubitavelmente ela ajuda, mas não é determinante.

Os resultados da pesquisa ainda precisam ser mais bem avaliados e discutidos. Entretanto, muito mais que colocar as escolas contra a parede, o estudo coloca uma responsabilidade gigantesca nas mãos das famílias. Não é o caso de pensar que dinheiro é tudo, mas seria bobagem negar que ele ajuda – e muito. O desafio é fazer com que esses alunos transformem as oportunidades que a vida lhes deu em conhecimento. É mais ou menos como o indivíduo que chega ao restaurante e encontra a mesa posta, com tudo de que mais gosta: os melhores pratos, os melhores vinhos e talheres banhados a ouro para adornar a refeição. O indivíduo só precisa pegar os talheres e levar o alimento à boca. Se não fizer isso, morrerá de fome, porque não haverá alguém para fazê-lo em seu lugar. É mais ou menos o que acontece com alguns alunos: têm tudo de que precisam para saciar o conhecimento. Só não conseguem sentir fome. Ficam a olhar a comida e não sabem o que fazer com ela. A escola pode até oferecer um bom cardápio, mas aperitivo não mata a fome.

Enquanto tantos alunos pobres conseguem superar as dificuldades e limitações que a condição financeira lhes impõe, outros desperdiçam o tempo negando-se a aprender. Pobres famílias ricas…

Menelau Júnior é professor de português

Coluna: Se vier noite traiçoeira…

Por Menelau Júnior

Existem certos hinos religiosos que ficam na cabeça na primeira execução. Como se fossem uma boa música pop, essas melodias “grudam” rápido, e a gente acaba saindo da igreja assoviando os acordes.

Impossível resistir aos versos “E ainda se vier noites traiçoeiras,/ Se a cruz pesada for, Cristo estará contigo/ O mundo pode até fazer você chorar,/ Mas Deus te quer sorrindo”. Imagino que aqueles que frequentam igreja conhecem bem a canção, já gravada até pelo padre Marcelo Rossi. Ótimo, a mensagem é bela, a melodia é inspiradora, mas o pessoal dos corais deveria ter mais cuidado na concordância verbal: o trecho “Se vier noites traiçoeiras” apresenta problema.

O engraçado é que a letra original não traz o termo “noite” no plural. Em sua origem, a canção diz “E ainda se vier noite traiçoeira”. Tudo bem assim: “noite traiçoeira” funciona como sujeito e por isso o verbo fica no singular. Ao usarem “noites traiçoeiras” junto à forma “vier”, os desavisados cometem deslize na concordância verbal. É como se estivessem cantando: “E ainda se noites traiçoeiras vier…”.

Portanto, líderes de corais, meu conselho: cantem muito essa música (é linda!), mas respeitem a concordância! Basta cantar: “E ainda se vier noite traiçoeira,/ Se a cruz pesada for…”. Tudo bem que Deus não esteja nem aí para regras gramaticais, mas não custa nada dar o bom exemplo àqueles que usam a língua portuguesa, certo?

Meus críticos ferrenhos vão dizer: “Herege! Fica olhando essas coisas até na hora de rezar!” Não é bem assim. Mas observar letras é hábito de quem gosta de ler. Perceber deslizes é quase inevitável. Deus há de perdoar a mim, que observo, e a quem canta errado, pois o faz sem maldade. Que Ele tenha piedade de nós… e da língua portuguesa.

Menelau Júnior é professor de português

Coluna: Reta final para o Enem

Por Menelau Júnior

Em 15 dias, mais de 8 milhões de brasileiros estarão diante da porta que leva às principais universidades públicas. Essa porta se chama Enem. Criado em 1998, o Exame Nacional do Ensino Médio tornou-se o segundo maior “vestibular” do planeta, perdendo em número de candidatos apenas para o processo seletivo chinês.

Neste sábado, 25 de outubro, são esperados mais de 2 mil jovens para um aulão no Shopping Difusora. Professores de um colégio particular da cidade estarão, durante 4 horas, respondendo a questões que poderão “cair” no Enem. Para os alunos, uma boa oportunidade de tirar algumas dúvidas e de se avaliar também. Como diz aquele programa de TV, “se liga aí, que é hora da revisão”.

Aliás, nesta reta final não adianta querer aprender tudo de uma vez. A prova do Enem avalia a aprendizagem de toda a vida escolar. E não há muita mágica: quem leu mais, quem se informou mais, quem adquiriu mais cultura ao longo dos anos vai se dar melhor.

E qual o papel de pais e professores neste processo?

Bom, aos pais cabe – e sempre caberá – o papel do conforto, do carinho, da compreensão e da motivação. A hora de cobrar é durante o ano. Quem nunca cobrou resultados do filho, quem nunca acompanhou seus estudos, quem faz de conta que o adolescente sabe se virar sozinho não tem moral para exigir nada. Aos professores, cabe o papel do incentivo e da dedicação em busca de resultados. Não sejamos hipócritas: vivemos num mundo de resultados. Escolas particulares vivem disso. As públicas devem ser exigidas quanto a isso. Valorizar as boas escolas e cobrar das ruins é papel do estado nesse processo. Sem cobranças não há resultados.

E aos alunos, o que fazer nesses quinze dias restantes? Responder a muitas questões é uma boa pedida. Enem também é treino. Mas nada de desespero. É hora também de ver um bom filme, de ficar perto dos amigos, de conversar com os pais e professores. Se há angústias, revele-as! Vai ajudar. E se não há, melhor ainda. Nada como fazer uma prova com a confiança de quem se dedicou como deveria e tem tudo para conseguir a tão sonhada vaga na universidade.

Menelau Júnior é professor de português 

Coluna: Sobre leviandades e fabulações

Por Menelau Júnior

Na última terça-feira, Dilma e Aécio protagonizaram um debate “quente” na Rede Bandeirantes. Num dos momentos mais tensos, Aécio pediu que Dilma o olhasse nos olhos, que o encarasse, e foi direto: “A senhora está sendo leviana”.

Chamou a candidata pelo menos três vezes de “leviana”. O que significa essa palavrinha? Os dicionários trazem muitos sinônimos, entre eles “irrefletido”, “imprudente”, “ precipitado” e “ que não tem seriedade ou que procede repreensivamente”. A palavra vem do latim “Levis”, que significa “de pouco peso, leve. Não foi a primeira vez que Aécio usou o adjetivo. Já o fizera com Luciana Genro, aquela do PSOL que participou dos debates para dar uma forcinha a Dilma.

Dilma, a rainha dos anacolutos, não consegue usar um período composto com conectivos adequados. Em seu idioma, o “dilmês”, usou o verbo “fabular”. Logo após mentir, dizendo que o Bolsa Família não teve suas raízes no governo FHC, Dilma afirmou que Aécio estava “fabulando”. Durante a semana, a candidata voltou a usar a palavra em algumas entrevistas.

Não precisa ser estudioso do idioma para perceber que “fabular” vem de “fábula”. E como “fábula” é uma narrativa de ficção, ou seja, não tem compromisso com a realidade, o verbo “fabular” foi criado com a intenção de dizer que alguém está “inventando”. No jargão político, “mentindo” mesmo. Não se confunda “fabular” com o verbo “confabular”, que significa “conversar em segredo”, ou seja, “tramar algo”.

O período eleitoral é especialmente rico para estudos linguísticos. O vocabulário dos candidatos revela um pouco do que eles são, de suas intenções discursivas. Infelizmente, a maior parte da população brasileira não dá a devida importância ao processo eleitoral ou mesmo o entende.

Esta semana, mais debates, mais palavrinhas interessantes. Estejamos de olho nas leviandades, mentiras, fabulações e confabulações dos candidatos.

Menelau Júnior é professor de português

Coluna: As palavras e a festa da democracia

Por Menelau Júnior

No próximo domingo, milhões de brasileiros vão às urnas exercer o papel de cidadão. É a “festa da democracia”. Uma festa mesmo! Todos se divertem, todos se enganam e ninguém pensa no dia de amanhã. Numa festa, cada um só quer saber do seu copo.

Nessa “festa”, mais de 80% dos convidados não têm Ensino Superior. Sou capaz de garantir que, nessa “festa”, mais de 90% dos convidados não sabem o que é “peculato”. Não sabem o que é “lobby”. Não sabem o que é “tráfico de influência”. Não sabem o que é “nepotismo”. Ou seja, é a festa da democracia, mas também é a da ignorância! Vivam os brasileiros!!

Pouquíssimos convidados da festa pagam para entrar. E olha que pagam caro! Há um “leão” que exige quantias exorbitantes! Os que pagam têm de garantir a assistência aos que não pagam! Os que pagam não se conformam com determinados crimes, não aceitam que seus dados sejam roubados e depois vendidos. Os que pagam pela festa sustentam a farra dos milhões que não pagam, mas que recebem mesada pelo voto. Isso é que é “festa”.

O dicionário Houaiss define “peculato” como “crime que consiste na subtração ou desvio, por abuso de confiança, de dinheiro público ou de coisa móvel apreciável, para proveito próprio ou alheio, por funcionário público que os administra ou guarda”. O mesmo dicionário diz que “lobby” é “atividade de pressão de um grupo organizado (de interesse, de propaganda etc.) sobre políticos e poderes públicos, que visa exercer sobre estes qualquer influência ao seu alcance, mas sem buscar o controle formal do governo”. O site Wikipédia define “tráfico de influência” como ato que “consiste em solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem (“como se fosse um investimento”), a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função”. Já “nepotismo” é definido como “favorecimento de parentes em detrimento de pessoas mais qualificadas, especialmente no que diz respeito à nomeação ou elevação de cargos”. Alguém se candidata a explicar tudo isso?

Segundo o resultado do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), 80% dos alunos que terminam o Ensino Médio não conseguem entender um texto mais complexo. Em outras palavras, juntam frases, mas não compreendem um texto. E assim são os brasileiros. Portanto, há um crime maior do que a prática do “peculato”, do “lobby”, do “tráfico de influência” e do “nepotismo”.

O maior crime é passar horas e horas discutindo isso na imprensa. Mostrando isso no “Hilário” Eleitoral Gratuito. Ora, somos ignorantes! A eleição é uma grande festa, em que todos devem estar felizes e alegres para escolher seus representantes. Para que saber o que significam certas palavras? Para que se chocar com crimes dessa natureza? Na festa da democracia, o copo de cada um é o que interessa. Quem não bebe – como eu –  e se recusa a ficar embriagado não acha a menor graça.

Menelau Júnior é professor de português

Coluna da Semana: Os fichas-sujas

Por Menelau Júnior

Fruto da iniciativa popular, com 1,6 milhão de assinaturas, a Lei da Ficha Limpa foi aprovada em 2010 e sancionada pelo Congresso e pelo ex-presidente. Pretendia-se tornar inelegíveis os políticos condenados por corrupção, improbidade, quebra de decoro e abuso de poder econômico. O Supremo Tribunal Federal indicou que a Lei só valeria a partir de 2012. E assim, acabou mais um episódio em que nossos políticos fichas-sujas se safaram das frágeis leis brasileiras. Em todos os órgãos de imprensa, o assunto foi amplamente divulgado e comentado na época. Vamos aproveitar e explicar o porquê de o plural de “ficha-suja” ser “fichas-sujas”.

Quando estamos lidando com substantivos compostos, devemos observar a classe gramatical de cada palavra que forma o vocábulo. No caso de “ficha-suja”, temos a junção de “ficha”, que é um substantivo, e “suja”, um adjetivo. Ao pluralizarmos um composto, normalmente colocamos no plural as palavras que pertencem à classe dos substantivos, dos adjetivos e dos numerais. Exatamente por isso temos o plural “fichas-sujas”.

E já que falamos em fichas-sujas, não podemos nos esquecer do MST, organização que também coleciona crimes em seu vastíssimo currículo de “reivindicações”. Por que a imprensa usa “os sem-terra”?

Para os que defendem a forma invariável, a explicação é a seguinte: o substantivo “sem-terra” seria uma redução de “trabalhador sem terra”. E quando temos um composto ligado por preposição, apenas o primeiro elemento varia. Assim sendo, o plural seria “trabalhadores sem terra”. Como “trabalhadores” acaba ficando elíptico, sobra apenas “sem-terra”: “os sem-terra”.

Na hora de usar o plural de um substantivo composto, é preciso sempre ter cuidado. Num dos primeiros escândalos do governo Lula (foram tantos…), o ex-presidente usou várias vezes a expressão “máquinas caças-níquel”. Essas nunca existiram. “Caça” é verbo e “níquel” é substantivo. A língua portuguesa só admite “caça-níqueis”.

Menelau Júnior é professor de português

Coluna: Educação: as pedras no meio do caminho

Por Menelau Júnior

Divulgado no início do mês, o resultado do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) revelou uma realidade que expusemos neste espaço há algumas semanas: o ensino médio no Brasil é desastroso. Em 16 estados brasileiros, a meta do governo não foi alcançada. E, diga-se de passagem, as “metas” são notas na casa dos 4 pontos. Parece piada: o Brasil está lutando para ter uma nota quatro.

Os números oficiais também mostram que, nos anos iniciais do ensino fundamental, as metas estão sendo cumpridas. Mas a partir do 6º ano os problemas se intensificam. No 9º ano, quando os alunos terminam o ensino fundamental, o rendimento deles já está bem abaixo do esperado. Quem vai segurar a “bomba”? Os professores do ensino médio, claro. Recebem alunos incapazes de entender um texto, sem conhecimentos mínimos em matemática e “viciados” em aprovações que envergonhariam qualquer aluno medíocre de países desenvolvidos.

É importante salientar, claro, que o Ideb – assim como o Enem – não deve ser o único meio para considerar melhorias na educação, mas é um indicador. Fatores como tempo que o aluno passa na escola, realidade sociocultural e econômica devem ser levados em conta. A formação dos professores também. Aliás, aí está outro problema: a cada ano cai o número de alunos que ingressam em cursos de licenciatura. O caso mais grave é o do curso de Letras, que teve uma diminuição de 13% no número de matrículas entre 2012 e 2013. Resumindo: professores formam juízes, advogados, engenheiros, médicos, jornalistas. Mas os jovens não querem ser professores.

Caiu também, pela primeira vez nos últimos 10 anos, o número de alunos que concluem um curso superior. A redução ficou em torno de 5%. Mas o ministério da Educação comemorou o aumento no número de matrículas, que foi de 3,8%. Em outras palavras, para o governo o importante é dizer que os alunos estão chegando à universidade. Se vão sair, isso é um problema deles. E não é preciso pensar muito para entender porque está caindo o número de formandos do ensino superior: muitos chegam à universidade sem hábitos de estudos, sem conhecimento necessário e precisando trabalhar.

As médias que permitem aprovação em muitos cursos ficam abaixo de 3,0. Ou seja, há uma “bola de neve” na educação brasileira: os alunos saem muito ruins do ensino fundamental, ficam ainda piores no ensino médio e são jogados nas universidades. Pesquisa feita no Distrito Federal revelou que 50% dos alunos que terminam um curso superior são analfabetos funcionais – não conseguem entender um texto mais complexo, mesmo em sua área de atuação.

No Brasil da propaganda governamental, basta falar em construção de universidades, em programas de financiamento para que boa parte acredite em reais avanços. É o populismo desavergonhado a serviço da mediocridade. Há muitos cursos de universidades públicas sem alunos, sem estrutura adequada, sem professores assíduos. Enquanto isso, de cada R$ 100 arrecadados no Brasil, R$ 57 ficam com o governo federal, R$ 25 com os 26 estados e o Distrito Federal e apenas R$ 18 com os 5.700 municípios.

Aos estados e municípios cabe a educação básica, área em que está o grande problema da educação brasileira – o número de alunos é infinitamente superior aos da educação superior e a verba é infinitamente menor. Sem resolver o problema na base, oferecendo escolas com infraestrutura decente, com professores bem-remunerados e motivados, precisaremos maquiar as universidades para dizer que estamos avançando na educação. E o pior: precisaremos de metas ridículas para justificar esse avanço.

Menelau Júnior é professor de português

Coluna: Educação: as pedras no meio do caminho

Por Menelau Júnior

Divulgado no início do mês, o resultado do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) revelou uma realidade que expusemos neste espaço há algumas semanas: o ensino médio no Brasil é desastroso. Em 16 estados brasileiros, a meta do governo não foi alcançada. E, diga-se de passagem, as “metas” são notas na casa dos 4 pontos. Parece piada: o Brasil está lutando para ter uma nota quatro.

Os números oficiais também mostram que, nos anos iniciais do ensino fundamental, as metas estão sendo cumpridas. Mas a partir do 6º ano os problemas se intensificam. No 9º ano, quando os alunos terminam o ensino fundamental, o rendimento deles já está bem abaixo do esperado. Quem vai segurar a “bomba”? Os professores do ensino médio, claro. Recebem alunos incapazes de entender um texto, sem conhecimentos mínimos em matemática e “viciados” em aprovações que envergonhariam qualquer aluno medíocre de países desenvolvidos.

É importante salientar, claro, que o Ideb – assim como o Enem – não deve ser o único meio para considerar melhorias na educação, mas é um indicador. Fatores como tempo que o aluno passa na escola, realidade sociocultural e econômica devem ser levados em conta. A formação dos professores também. Aliás, aí está outro problema: a cada ano cai o número de alunos que ingressam em cursos de licenciatura. O caso mais grave é o do curso de Letras, que teve uma diminuição de 13% no número de matrículas entre 2012 e 2013. Resumindo: professores formam juízes, advogados, engenheiros, médicos, jornalistas. Mas os jovens não querem ser professores.

Caiu também, pela primeira vez nos últimos 10 anos, o número de alunos que concluem um curso superior. A redução ficou em torno de 5%. Mas o ministério da Educação comemorou o aumento no número de matrículas, que foi de 3,8%. Em outras palavras, para o governo o importante é dizer que os alunos estão chegando à universidade. Se vão sair, isso é um problema deles.

E não é preciso pensar muito para entender porque está caindo o número de formandos do ensino superior: muitos chegam à universidade sem hábitos de estudos, sem conhecimento necessário e precisando trabalhar. As médias que permitem aprovação em muitos cursos ficam abaixo de 3,0. Ou seja, há uma “bola de neve” na educação brasileira: os alunos saem muito ruins do ensino fundamental, ficam ainda piores no ensino médio e são jogados nas universidades. Pesquisa feita no Distrito Federal revelou que 50% dos alunos que terminam um curso superior são analfabetos funcionais – não conseguem entender um texto mais complexo, mesmo em sua área de atuação.

No Brasil da propaganda governamental, basta falar em construção de universidades, em programas de financiamento para que boa parte acredite em reais avanços. É o populismo desavergonhado a serviço da mediocridade. Há muitos cursos de universidades públicas sem alunos, sem estrutura adequada, sem professores assíduos. Enquanto isso, de cada R$ 100 arrecadados no Brasil, R$ 57 ficam com o governo federal, R$ 25 com os 26 estados e o Distrito Federal e apenas R$ 18 com os 5.700 municípios.

Aos estados e municípios cabe a educação básica, área em que está o grande problema da educação brasileira – o número de alunos é infinitamente superior aos da educação superior e a verba é infinitamente menor. Sem resolver o problema na base, oferecendo escolas com infraestrutura decente, com professores bem-remunerados e motivados, precisaremos maquiar as universidades para dizer que estamos avançando na educação. E o pior: precisaremos de metas ridículas para justificar esse avanço.

Menelau Júnior é professor de português