Coluna: Meio milhão de zeros

Por Menelau Júnior

O ministério da Educação (MEC) divulgou na última terça-feira o resultado individual dos alunos no Enem 2014. Em relação a 2013, as médias caíram 1%, percentual insignificante. Mas duas áreas chamaram a atenção: Matemática, com queda de 7%, e Redação, com queda nas notas de quase 10%.

Mesmo com queda, as notas de Matemática são as maiores. Não porque os alunos saibam mais – muito pelo contrário –, mas porque o cálculo adotado pelo Enem considera uma “média” de 500 pontos para quem acerta apenas 13 questões em Matemática (de 45 possíveis). Esse “desvio” acaba gerando médias mais altas. Nessa área, um aluno chega a tirar 700 pontos acertando aproximadamente 27 questões. Em Códigos e Linguagens (Português e Literatura), esses mesmos 700 pontos só seriam obtidos com aproximadamente 36 acertos.

Mas é em Redação que se evidencia todo o desastre da educação brasileira. Dos quase 6 milhões e duzendos mil candidatos, 529 mil receberam nota zero na produção do texto. Mais de mei milhão. E mais de 55% não conseguiram sequer a nota 500. Um vexame. Notas acima de 700 pontos foram de apenas 8,5% dos candidatos. Somente 2,5% superaram a barreira dos 800; 0,5% chegaram aos 900; e apenas 0,004% (250 alunos) tiraram a nota máxima.

Os porquês desse desastre na redação são muitos, mas o principal é óbvio: FALTA DE LEITURA. O estudante brasileiro lê pouco e, por isso, pensa pouco, reflete pouco, argumenta pouco. Uma boa nota em Redação não se dá apenas pela ortografia ou pela concordância. É preciso analisar o tema, refletir, argumentar de forma ampla e coerente. E nada disso se consegue com pouca leitura, com poucos debates, com pouca informação.

O ministro da Educação tentou explicar os quase 530 mil zeros com a justificativa de que o tema de 2014 (Publicidade Infantil) era mais difícil que o de 2013 (Lei Seca). Não convence. Os zeros vieram, principalmente, pela fuga ao tema. O que isso significa? Que milhares de estudantes foram incapazes de saber o que se queria. Leram e não entenderam.

Se quisermos jovens críticos, com capacidade de análise e percepção de mundo, precisaremos estimular a leitura, os debates, as discussões. Os professores de redação podemos ensinar técnicas, discutir assuntos, orientar para a estrutura de um texto, propor bons temas. Mas não podemos suprir uma cabecinha adolescente da criticidade necessária se não houver leitura.

Somos o que lemos. Sem leitura, não somos nada. E somos: um zero em Redação.

Menelau Júnior é professor

Coluna: Educação: as pedras no meio do caminho

Por Menelau Júnior

Divulgado no início do mês, o resultado do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) revelou uma realidade que expusemos neste espaço há algumas semanas: o ensino médio no Brasil é desastroso. Em 16 estados brasileiros, a meta do governo não foi alcançada. E, diga-se de passagem, as “metas” são notas na casa dos 4 pontos. Parece piada: o Brasil está lutando para ter uma nota quatro.

Os números oficiais também mostram que, nos anos iniciais do ensino fundamental, as metas estão sendo cumpridas. Mas a partir do 6º ano os problemas se intensificam. No 9º ano, quando os alunos terminam o ensino fundamental, o rendimento deles já está bem abaixo do esperado. Quem vai segurar a “bomba”? Os professores do ensino médio, claro. Recebem alunos incapazes de entender um texto, sem conhecimentos mínimos em matemática e “viciados” em aprovações que envergonhariam qualquer aluno medíocre de países desenvolvidos.

É importante salientar, claro, que o Ideb – assim como o Enem – não deve ser o único meio para considerar melhorias na educação, mas é um indicador. Fatores como tempo que o aluno passa na escola, realidade sociocultural e econômica devem ser levados em conta. A formação dos professores também. Aliás, aí está outro problema: a cada ano cai o número de alunos que ingressam em cursos de licenciatura. O caso mais grave é o do curso de Letras, que teve uma diminuição de 13% no número de matrículas entre 2012 e 2013. Resumindo: professores formam juízes, advogados, engenheiros, médicos, jornalistas. Mas os jovens não querem ser professores.

Caiu também, pela primeira vez nos últimos 10 anos, o número de alunos que concluem um curso superior. A redução ficou em torno de 5%. Mas o ministério da Educação comemorou o aumento no número de matrículas, que foi de 3,8%. Em outras palavras, para o governo o importante é dizer que os alunos estão chegando à universidade. Se vão sair, isso é um problema deles.

E não é preciso pensar muito para entender porque está caindo o número de formandos do ensino superior: muitos chegam à universidade sem hábitos de estudos, sem conhecimento necessário e precisando trabalhar. As médias que permitem aprovação em muitos cursos ficam abaixo de 3,0. Ou seja, há uma “bola de neve” na educação brasileira: os alunos saem muito ruins do ensino fundamental, ficam ainda piores no ensino médio e são jogados nas universidades. Pesquisa feita no Distrito Federal revelou que 50% dos alunos que terminam um curso superior são analfabetos funcionais – não conseguem entender um texto mais complexo, mesmo em sua área de atuação.

No Brasil da propaganda governamental, basta falar em construção de universidades, em programas de financiamento para que boa parte acredite em reais avanços. É o populismo desavergonhado a serviço da mediocridade. Há muitos cursos de universidades públicas sem alunos, sem estrutura adequada, sem professores assíduos. Enquanto isso, de cada R$ 100 arrecadados no Brasil, R$ 57 ficam com o governo federal, R$ 25 com os 26 estados e o Distrito Federal e apenas R$ 18 com os 5.700 municípios.

Aos estados e municípios cabe a educação básica, área em que está o grande problema da educação brasileira – o número de alunos é infinitamente superior aos da educação superior e a verba é infinitamente menor. Sem resolver o problema na base, oferecendo escolas com infraestrutura decente, com professores bem-remunerados e motivados, precisaremos maquiar as universidades para dizer que estamos avançando na educação. E o pior: precisaremos de metas ridículas para justificar esse avanço.

Menelau Júnior é professor de português