Artigo: Nova geração quer uma escola que a acompanhe e entenda

Por Dolores Affonso 

Quando fiz o primário, ginásio e o segundo grau, que até já mudaram de nome, estudávamos em salas físicas com carteiras, divididos por série, idade, turnos etc. Copiávamos do quadro negro em cadernos, fazíamos exercícios, líamos textos mimeografados e fazíamos provas assim também. Não estou reclamando, era o que tínhamos.

Em casa, era a mesma coisa: brincávamos na rua, de pique, jogávamos banco imobiliário e outros jogos de tabuleiro etc. Escrevíamos cartas para os amigos e paqueras. E tudo era maravilhoso! Muitos dizem que até mais saudável, mas não é isso o que importa aqui! O que quero dizer é que tínhamos na escola o que tínhamos em casa, na rua, na vida. Isso acontece hoje com você, com seus filhos, sobrinhos, alunos? Na maioria das vezes, não. É verdade! Observe!

Hoje, crianças e jovens têm acesso a tudo o que há de mais moderno em termos de tecnologias: computadores, tablets, smartphones conectados à internet. Eles se comunicam na velocidade da luz, utilizam diversos sistemas de áudio, vídeo, sociais, de compartilhamento etc. Suas vidas são em rede e tudo acontece em tempo real. Jogam pelo computador e outros dispositivos online com pessoas em qualquer lugar do mundo, comunicando-se de forma instantânea. Têm acesso a todo tipo de informação sobre qualquer assunto na palma da mão. E a escola acompanha estas mudanças? Reflete a realidade social em que vivem? Normalmente, não! Muitos pais e educadores reclamam que as crianças e os jovens de hoje não querem nada! Não gostam da escola, nem se interessam em estudar.

Se fosse você, ficaria interessado pelos estudos, com um mundo muito mais atraente do lado de fora da escola? Eu não!

A escola, não conseguindo se antecipar às tendências, precisa ao menos acompanhar as transformações sociais. Escolas, educadores, pais, governos e alunos precisam se unir na busca de soluções educacionais que atendam às necessidades dos alunos, aliando os objetivos educacionais aos instrumentos, ferramentas e critérios.

As inovações não devem ocorrer somente no uso de tecnologias, mas nos instrumentos e formas de promover o aprendizado, de avaliar o desempenho, de criar alunos mais autônomos e ativos no processo de ensino-aprendizagem e mais responsáveis neste processo.

Seguem abaixo alguns exemplos:

– O uso de novas formas de avaliação do aluno que não sejam focadas apenas na identificação e punição dos erros, mas no incentivo de posicionamentos mais críticos, fortalece a interação com as novas gerações que já se acostumaram a ser participativas em diversos processos em suas vidas.

– É possível usar novas ferramentas e metodologias, seja na construção e adaptação do currículo, ou no desenvolvimento dos momentos de aprendizado, como a gamificação. Não me refiro aqui ao uso de games ou jogos educacionais somente, mas da estratégia dos jogos, tornando as aulas mais desafiadoras, repletas de enigmas interessantes, de roteiros de aprendizagem em que o aluno pode escolher caminhos mais adequados e condizentes com seus estilos de aprendizagem, inteligências, experiências e conhecimentos prévios.

– Também é possível inserir os dispositivos móveis como notebooks, tablets e celulares como instrumentos de integração e aprendizado. Usar tecnologias que os alunos já conhecem, gostam e se sentem bem, ajuda a criar interesse pela escola.

– Os professores podem ter grupos em redes sociais, blogs, comunicadores instantâneos, listas de emails etc. O uso conjunto de blogs, canais de vídeos produzidos pelos próprios alunos e compartilhados, alia a vida física à virtual dos alunos.

– Aplicativos de comunicação, de gravação e edição de áudio, vídeo, imagem, texto, de compartilhamento, de segunda tela, fóruns, blogs, games, segunda vida, wikis, aliando pesquisa, criatividade e interação ao conteúdo, objetivos e instrumentos inovadores de avaliação.

– Outra proposta é não dividir os alunos em salas, séries, idade, mas unir diversos alunos para que um aprenda com o outro, interaja, compartilhe, ensine. Trabalhar por temas e não por série. Já há escolas sem paredes, sem professor, que reúnem educadores e educandos num mesmo espaço educativo. Diminuir a distância entre educador e educando, mudar o foco do repasse massivo de conteúdos para a construção colaborativa do conhecimento, mudar os instrumentos e critérios de avaliação por formas de compartilhamento de resultados e desempenho em grupo, junto a um atendimento personalizado.

Não parece fácil, e não é a realidade na atual situação do Brasil, mas é um caminho que pode transformar a educação, a vida das pessoas e a nossa sociedade. Tudo começa no planejamento educacional, na adaptação do currículo, no desenvolvimento e implementação dos projetos educacionais, dos “planos de aula” e da ação do educador e termina, quer dizer, não termina. É só o começo, uma semente que devemos plantar para as novas gerações.

Sei que as escolas, os educadores e até a sociedade ainda não se sentem preparados para acompanhar tantas mudanças, mas será que estamos preparados para “perder” toda uma geração, até nos sentirmos prontos para compreendê-los e atender suas necessidades?

Dolores Affonso é coach, palestrante, consultora, designer instrucional, professora e idealizadora do Congresso de Acessibilidade (www.congressodeacessibilidade.com ).

Natural do Rio de Janeiro, é jornalista formado pela Favip. Desde 1990 é repórter do Jornal VANGUARDA, onde atua na editoria de política. Já foi correspondente do Jornal do Commercio, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e Portal Terra.

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