A Polícia Federal prendeu, na manhã desta quinta (17), o ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Além dele, outros mandados foram expedidos pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, sob a acusação de cobrança de propina em contratos com o poder público. Contra Cabral também está sendo cumprido um mandado de prisão expedido pelo juiz Sergio Moro, em Curitiba, no âmbito das investigações da Eletronuclear.
Sérgio Cabral é alvo de dois mandados de prisão preventiva, um pela Operação Calicute, que tem como base a delação premiada do empresário Fernando Cavendish, outro, pela Lava Jato, com base na delação da Andrade Gutierrez e da Carioca Engenharia. A esposa de Cabral, Adriana Anselmo, é alvo de condução coercitiva. Por volta das 6h50, um carro saiu da garagem do ex-governador e muitas pessoas que estavam na porta tentaram invadir o local e gritavam pela prisão dele. Para sair do local, a polícia chegou a jogar spray de pimenta.
A ação tem o objetivo de investigar o desvio de recursos públicos federais em obras realizadas pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro, cujo prejuízo estimado é superior a R$ 220 milhões.No início da manhã também foi preso o assessor de Cabral, Wagner Jordão Garcia, na Barra da Tijuca, Zona oeste do Rio. Ao todo, a polícia visa cumprir 38 mandados de busca e apreensão, 8 de prisão preventiva, dois de prisão temporária e 14 conduções coercitivas.
A polícia chegou à casa de Cabral, no Leblon, Zona Sul do Rio, por volta das 6h. Cabral e os outros acusados são suspeitos de receber propina em troca da concessão de obras públicas como a reforma do Maracanã e a construção do Arco Metropolitano. A investigação teve como ponto de partida as delações de Clóvis Primo e Rogério Numa, executivos da Andrade Gutierrez, feitas no âmbito do inquérito do caso Eletronuclear. Os dois revelaram à força-tarefa que os executivos das empreiteiras se reuniram no Palácio Guanabara, sede do governo, para tratar da propina e que houve cobrança nos contratos de grandes obras. Só a Carioca Engenharia comprovou o pagamento de mais de R$ 176 milhões em propina para o grupo.
O mandado expedido pelo juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, visa cumprir, de forma coordenada, 14 mandados de busca e apreensão, 2 mandados de prisão preventiva e 1 mandado de prisão temporária. Além de Cabral, a polícia também busca cumprir mandados de prisão preventiva contra o ex-secretário de governo de Cabral, Wilson Carlos, e do ex-secretário de obras,
Hudson Braga.
A operação foi batizada de “Calicute”, região da Índia onde o descobridor do Brasil, Pedro Álvarez Cabral, teve uma de suas maiores tormentas. No início desse ano, dois ex-executivos da Andrade Gutierrez afirmaram, em delação premiada a procuradores da Lava Jato, que Sérgio Cabral cobrou propina da empreiteira Andrade Gutierrez em obras do Maracanã para a Copa do Mundo.
De acordo com os ex-executivos da Andrade Gutierrez Rogério Nora de Sá e Clóvis Peixoto Primo, Cabral cobrou pagamento de 5% do valor total do contrato para permitir que a construtora se associasse à Odebrecht e à Delta, no consórcio que disputaria a reforma do Maracanã, em 2009.
Na época, por meio de nota, o ex-governador disse que manteve apenas relações institucionais com a empresa Andrade Gutierrez e negou que tenha interferido em processos de licitação de obras ou solicitado benefício financeiro para ele ou para campanha eleitoral. A Delta pertencia a Fernando Cavendish, amigo de Cabral que foi preso em julho deste ano ao desembarcar no Aeroporto Internacional Tom Jobim. Cavendish também foi preso após o juiz Marcelo Bretas aceitar uma denúncia contra 22 suspeitos de participar de um esquema que desviou R$ 370 milhões dos cofres públicos.
De acordo com a revista “Época”, Nora de Sá contou que conseguiu uma reunião com o ex-governador para tratar da inclusão da Andrade Gutierrez no grupo e, segundo os delatores, Cabral concordou. Determinou, no entanto, que a empresa acertasse os percentuais com a Odebrecht, já que os 30% da Delta não poderiam ser modificados. Um trecho da delação, citado pela revista, diz que “o então governador não permitiria a exclusão da Delta” porque “tinha consideração pela empresa e gostava dela”. Os dois contam que Cabral deixou claro que havia um pedágio a ser pago pela “bondade”.
Ainda segundo a “Época”, Nora disse que a “conversa foi franca”, mas o pedido de propina foi veiculado com o uso de outra palavra: “contribuição”. Nora procurou Benedicto Júnior, executivo da Odebrecht, preso na 23ª fase da Operação Lava Jato com uma planilha com o nome de mais de 200 políticos, entre eles o de Sérgio Cabral.
Os pagamentos, de acordo com as delações, começaram em 2010 e foram feitos “parte em espécie, parte em doações oficiais”. Segundo a revista, a “operacionalização” coube a outro diretor da Andrade Gutierrez, Alberto Quintaes – que tinha participado da reunião com Cabral –, com a ajuda de Primo. Os pagamentos, segundo a delação, ocorreram somente até 2011. Nenhum dos dois informou aos procuradores quanto foi desembolsado.