Roberto Amaral: ‘Eletrolão depredará o Brasil’

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Ex-ministro foi presidente e um dos principais dirigentes e ideólogos do PSB até o ano passado (Foto: ABr)

Por TEREZA CRUVINEL
Colunista do Brasil 247

“Estamos assistindo à depredação do Brasil. A Lava Jato pode destruir as bases da geração de energia, e com isso inviabilizar o desenvolvimento do país. Coincidência ou não, isso atende aos objetivos de potências estrangeiras que não desejam nossa afirmação como Nação”, diz em entrevista ao 247 o ex-ministro da Ciência e Tecnologia, Roberto Amaral.

Embora considere a prisão do Almirante Othon Pinheiro Silva, presidente afastado da Eletronuclear, “um fato grave que exige nossa reflexão”, Amaral acha que a crise política perderá força a partir de setembro: “As forças produtivas – governo, trabalho e capital – precisam de um mínimo de tranquilidade, de estabilidade na ordem político-jurídica-econômica”.

Roberto Amaral, advogado e professor, foi secretário-geral, presidente e um dos principais dirigentes e ideólogos do PSB até o ano passado, quando discordou do apoio do partido ao candidato do PSDB Aécio Neves no segundo turno e afastou-se da direção, com a qual hoje tem conflitos notórios. Entre 2003 e 2004, foi ministro da Ciência e Tecnologia do primeiro governo Lula.

Confira a entrevista:

Como o senhor viu o último lance da Operação Lava Jato, a Operação Radioatividade, que realizou prisões e apreensões na Eletronuclear, e o anúncio de que todo o setor elétrico será investigado? Já chamam isso de “eletrolão”…

Estamos assistindo à depredação do Brasil e de seus ativos estratégicos, o que começou com a Petrobras. Com uma devassa no setor elétrico a Lava Jato pode destruir as bases da geração de energia, e com isso inviabilizar o desenvolvimento do país. Coincidência ou não, isso atende aos objetivos de potências estrangeiras que não desejam nossa afirmação como Nação. Com essa Operação Radioatividade, que prendeu o pai do programa nuclear brasileiro, o ex-presidente da Eletronuclear Othon Pinheiro da Silva, já é certo novo atraso no cronograma da terceira usina nuclear do país, Angra 3. Sua produção será importante para o abastecimento do Rio de Janeiro, liberando energia de outras fontes para o resto do país.

As investigações começaram pela área nuclear por conta de revelações do executivo da Camargo Corrêa Dalton Avancini. O senhor acha que a Lava Jato agora avançará sobre as empresas do grupo Eletrobras, que tocam as obras das grandes hidrelétricas como Jirau, Santo Antônio e Belo Monte?

Ninguém conhece os desígnios da Lava Jato, mas se isso acontecer, as três fontes mais importantes da matriz energética brasileira serão atingidas: petróleo, energia hidrelétrica e energia nuclear. O melhor caminho para quebrar um país é afetando o suprimento de energia.

O juiz Moro, num artigo já muito citado, endossa a tese do juiz da operação italiana Mãos Limpas, Giovanni Falcone, de que o combate à corrupção exige a deslegitimação dos políticos e partidos para que algo novo surja na política. Como PMDB e PT são os partidos mais fortes no setor elétrico, o senhor acha que tais investigações podem realimentar a crise política para produzir mais “deslegitimações”?

O objetivo pode ser este, mas eu pergunto: será que não é possível combater corruptos e corruptores sem comprometer as empresas responsáveis pelos mais importantes projetos de geração de energia e de infraestrutura? Não será possível separar pessoa física de pessoa jurídica? Com esta depredação, o Brasil perderá anos na caminhada para o desenvolvimento e daqui a pouco estarão chegando aqui navios chineses cheios de operários, como na África, para assumirem as grandes obras. Todos nós sabemos que o capital internacional sempre cobiçou o setor de serviços no Brasil. E o governo, não poderia ser mais ágil na criação de condições para que as empresas atingidas possam se reestruturar? Por que não criar algo como o Proer que o Fernando Henrique fez para salvar os bancos? O filho do Magalhães Pinto foi preso e processado, mas o espólio do Banco Nacional foi salvo e vendido ao Unibanco. Por que demoram tanto com os tais acordos de leniência? Não compreendo que estejamos assistindo tão passivos à depredação do que já foi acumulado. Agora, a própria política de defesa parece ameaçada.

O senhor se refere à intenção da Lava Jato de investigar o projeto do submarino nuclear?

Sim, o submarino não é um luxo da Marinha, é um elemento fundamental da política de defesa nacional e muito importante para a própria exploração do pré-sal. É fruto de um acordo bilateral Brasil-França. Sem o submarino não seremos capazes de vigiar e defender a costa continental, onde está o pré-sal, da predação ilegal e clandestina por grupos ou países com tecnologia avançada de extração.

O senhor acha que esta ofensiva da Lava Jato sobre o setor elétrico produzirá, além dos danos econômicos, um prolongamento da crise política?

Não creio. Com a ressalva de que é muito difícil prever os desdobramentos de uma crise política quando observada em seu ápice, penso que a atual não ultrapassará setembro: o país está parado e as forças produtivas (governo, trabalho e capital) precisam de um mínimo de tranquilidade, de previsibilidade na ordem política, política e econômica para realizar seus fins. Mas tudo está a depender das denúncias que o procurador Janot oferecerá ou não. A inacreditável prisão do Almirante Othon é um fato novo e grave, que exige nossa reflexão.

No momento atual, o senhor acha que a crise ainda pode levar ao afastamento da presidente, seja por impeachment ou cassação da chapa pelo TSE?

Não. O impeachment depende da prévia comprovação de um ilícito da presidente, o que não está na ordem do dia. As contas de campanha já foram julgadas. A tese só interessa à tucanagem, ao setor da oposição que deseja reverter no tapetão o resultado negativo das eleições democráticas de 2014. Mas o Brasil de hoje não é uma republiqueta. O empresariado está preocupado em realizar seus lucros e por isso mesmo mais interessado na normalidade constitucional-administrativa. Por que trocar Dilma por Temer ou Dilma-Temer por Cunha-Calheiros? Quem tem coragem de pensar nisso?

O senhor se sente confortável no PSB depois das divergências públicas que teve com a direção por conta do apoio ao Aécio Neves?

O desconforto é notório e não o minimizo. Sinto-me honrosamente distante da atual direção que cometeu, por oportunismo político, uma felonia ideológica, traindo a história do partido, negando a opção de esquerda e conspurcando a bandeira socialista. O oportunismo neste caso se soma à burrice: retirando-se do campo da esquerda a troika que hoje manda no PSB fechou suas portas a centenas de quadros socialistas que hoje estão na míngua de opção partidária.

Fala-se, principalmente no PT, na recriação de uma frente de esquerda, como a antiga Frente Brasil Popular que reunia PT, PSB e PC do B. Ela ainda é possível? O senhor apoiaria?

Não. Não vejo sentido numa frente de esquerda, nem numa frente de partidos e muito menos na reedição da Frente Brasil Popular, hoje superada historicamente. Ela tinha sentido em 1990 logo após as eleições. Quando proposta por nós, foi rejeitada pelo PT. Defendo uma frente ampla, nacional e popular, aberta aos partidos, mas nascida do movimento social, que congregue a esquerda mas congregue também os liberais, os progressistas e os democratas de um modo geral. Uma frente apta a se confrontar com o avanço do pensamento conservador, à defesa da integridade do mandato da presidente Dilma, à defesa do desenvolvimento com distribuição de renda e à defesa dos interesses nacionais.

Este pode ser o caminho para a superação das crises política e econômica?

A saída será política. Vamos sair da crise mediante um pacto em torno de dois princípios básicos: governabilidade e retomada do desenvolvimento com distribuição de renda. Esse pacto, porém, só será viável se forjado na sociedade, cansada e desenganada, e se for por ela imposto aos agentes políticos. Mas já é hora de pensarmos grande, para além dos projetinhos individuais, das vaidades e das vaidadezinhas e do ódio, do rancor e da intolerância. Será muito pedir isso? É hora de pensar no Brasil, que para desgraça de nossos filhos, está ameaçado de viver – se isso é viver – mais uma década perdida.

Natural do Rio de Janeiro, é jornalista formado pela Favip. Desde 1990 é repórter do Jornal VANGUARDA, onde atua na editoria de política. Já foi correspondente do Jornal do Commercio, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e Portal Terra.

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