Da Agência Brasil
A pouco mais de dois meses da Desvinculação de Receitas da União (DRU) perder validade, o governo corre contra o tempo para tentar prorrogar a medida. O mecanismo, que permite o uso livre de parte da arrecadação, vence em 31 de dezembro deste ano e a proposta de emenda à Constituição (PEC) que estende este prazo, enviada pelo Executivo ao Congresso no início de julho, ainda aguarda votação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ). Como o relatório foi apresentado na última semana, a expectativa é que a matéria seja votada na próxima terça-feira (27) pelos deputados da comissão.
Atualmente, a DRU corresponde a 20% da receita dos tributos de modo geral. “São de livre alocação pelo governo, que não fica comprometido a utilizar estes recursos para as finalidades definidas. Isto dá mais flexibilidade na definição das destinações dos recursos orçamentários”, explicou o economista Roberto Piscitelli, professor do departamento de ciências contábeis da Universidade de Brasília (UnB).
Uma das principais alegações para a existência da DRU, desde que foi implantada em 1994, é que o orçamento é sempre “muito amarrado, vem muito carimbado”, lembrou Piscitelli.
“Fica muito rígida a destinação orçamentária por lei e isto aumenta os graus de liberdade do governo de redistribuir os recursos”, disse, citando como exemplo a antiga Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que era cobrada para que o dinheiro fosse usado exclusivamente na área da saúde.
NOVO PERCENTUAL
Se aprovado pelo Congresso Nacional como o Planalto propôs, o texto garantirá, além de prazo maior – até 31 de dezembro de 2023 –, uma ampliação da margem que o governo pode usar, sem vinculações, em áreas que considera prioritárias. E é justamente o aumento do percentual desejado pelo governo – dos atuais 20% para 30% – que deve provocar maior polêmica.
“A grande discussão não é quanto à prorrogação. A maior resistência do Congresso deve residir no aumento deste percentual. A manutenção do atual percentual não acarretaria grandes resistências”, prevê o economista. Para Piscitelli, o governo terá que redobrar esforços para convencer os parlamentares sobre esta necessidade. “Num momento em que a receita está caindo, a economia em recessão, quanto mais rígido o orçamento, quanto maior destinação tiver para os recursos, mais amarrado fica o governo para aplicar estes recursos, mais dificuldade terá para garantir uma sobra para aplicar onde é mais necessário ou urgente”, completou.
O relator da matéria, deputado Marcos Rogério (PDT-RO), foi favorável à prorrogação do mecanismo em seu parecer. Rogério analisou apenas o aspecto legal da proposta, mantendo no texto quase todas as expectativas do Executivo, inclusive a ampliação da margem de desvinculação. Mas, para que a matéria avance, o deputado tirou do texto a previsão de que esta porcentagem recaia também sobre fundos constitucionais de desenvolvimento das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
“Não é difícil perceber que a inclusão, na DRU, de significativa parcela dos recursos hoje destinados aos Fundos Constitucionais de Financiamento ao Setor Produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste vulneraria o princípio federativo, tendendo a abolir a cláusula pétrea prevista no art. 60, § 4º, I, da Constituição da República”, explicou.
O Planalto e a base aliada trabalham para que a tramitação da PEC ganhe mais velocidade. Para isto, o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE) já defendia a mudança que envolve os fundos antes mesmo de ser feita pelo relator. Isto porque, se a prorrogação não for aprovada a tempo pela Câmara e pelo Senado, o Executivo terá que administrar suas contas de forma mais engessada, seguindo à risca o que define o orçamento. A desvinculação precisa estar prevista, inclusive, na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2016, que também aguarda votação no Congresso.
“Os fundos constitucionais têm os recursos mais atrativos para as regiões mais pobres do país. Sem estes fundos constitucionais, as regiões, como o Nordeste, não teriam tido, nos últimos anos, altas taxas de crescimento econômico e geração de emprego acima da média nacional. [Retirar a desvinculação dos fundos] é mais uma facilidade para aprovar a DRU”, avaliou Guimarães.
Caso seja aprovada na CCJ, a proposta ainda precisará ser analisada por uma comissão especial e votada, em dois turnos, pelo plenário da Câmara. Depois, ainda tem que passar pelo crivo dos senadores.