Da Folha de S. Paulo
Uma investigação da Polícia Federal indica que o ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) Augusto Nardes foi acionado para tratar de assuntos da empresa de consultoria Planalto quando já ocupava uma cadeira na corte. A firma é investigada sob suspeita de fraude fiscal.
Os indícios, datados de novembro de 2006, contradizem a versão de Nardes, que afirmou ter se afastado completamente em maio de 2005 da empresa, da qual era sócio, para assumir a vaga no TCU.
A Planalto Soluções e Negócios, registrada em nome do sobrinho do ministro, Carlos Juliano Nardes, e de Clorimar Piva, é investigada na Operação Zelotes, que apura suposto esquema de pagamento de propina no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), órgão vinculado ao Ministério da Fazenda.
Segundo os investigadores, Nardes e o sobrinho receberam, na Planalto, R$ 2,6 milhões da SGR Consultoria, que teria corrompido conselheiros do Carf para favorecer diversas empresas.
As informações sobre os pagamentos deram origem, a pedido do Ministério Público Federal de Brasília, a inquérito que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal) desde 21 de outubro, sob relatoria da ministra Cármen Lúcia.
A menção a Nardes, porém, já aparece nos autos de outra investigação, iniciada pela PF em 2006, denominada Operação Aqueronte, que não chegou a ser desencadeada. Isso porque havia suspeitas sobre pessoas com foro privilegiado e o caso seguiu para o STF, onde acabou arquivado pelo ministro Luiz Fux, em 2012.
A movimentação do processo mostra que a Procuradoria-Geral da República voltou a consultar os autos em setembro deste ano. Ali, João Augusto Nardes surge como interlocutor de Piva e Carlos Juliano, em documentos coletados com autorização judicial.
Segundo o e-mail ao qual a Folha teve acesso, Piva pediu, a uma pessoa que a PF identifica como Nardes, ajuda para renovar contrato de uma empresa gaúcha vencedora de licitação no valor de R$ 25 milhões no Ministério da Saúde. O objetivo era a confecção de cartões do SUS.
Na mensagem dirigida a “caro João Augusto”, enviada em 27 de novembro de 2006 a um endereço de e-mail que os investigadores dão como sendo do ministro, Piva afirma que é preciso “renovar o contrato” da empresa, “uma vez que o prazo expira em 31/12/06”. Piva escreveu: “Temos até quarta para tentar solucionar o problema”.
Ele explicou que o Ministério da Saúde não liberou todos os nomes para a empresa fazer o serviço e “resolveu licitar a confecção de cartões ‘provisórios’, com data marcada para 04/12/06”.
Piva completou: “Parece que tem outros interesses envolvidos. A empresa EGEL é séria, comprou equipamentos quando venceu a licitação e agora corre o risco de perder o contrato”.
Na documentação a que a reportagem teve acesso, não aparece uma eventual resposta de Nardes ao e-mail.
OUTRO LADO
O ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) Augusto Nardes disse à Folha que não se recorda de ter recebido e-mail do sócio da Planalto, Clorimar Piva, para tratar de licitação no Ministério de Saúde de interesse da empresa do Rio Grande do Sul.
“Não me recordo porque não recebo todos os e-mails. Eu não devo nem ter respondido a ele. Pode ser que ele tenha mandado para mim”, disse o ministro. Nardes voltou a dizer que se afastou da Planalto em maio de 2005.
Indagado se fala com frequência com Piva, o ministro disse que não. “Faz muito tempo que não falo com ele.”
A Folha quis saber se o e-mail interceptado pela PF, de endereço Gmail, pertence ou pertenceu a Nardes, mas o ministro disse que não poderia confirmar nem negar. “Eu não sei se era do meu gabinete. Eu não me recordo, porque eu não devo ter respondido isso aí.”
Nardes negou ter se reunido alguma vez com representantes da empresa Egel que, segundo a investigação da PF, tinha interesse em licitação no Ministério da Saúde.
Em entrevista à Folha em outubro, Juliano Nardes, sobrinho do ministro e sócio da Planalto, negou ter cometido quaisquer irregularidades e disse que a empresa está inativa desde 2008.
Clorimar Piva e representantes da empresa Egel não foram localizados.