Trump usa brecha para levar pena de morte a Estados que proíbem execuções

Diário de Pernambuco
Trump levantou a moratória federal de 2014 sobre a pena de morte aumentando os riscos de um cidadão ser executado nesses Estados. Foto: Reprodução / Internet
Trump levantou a moratória federal de 2014 sobre a pena de morte aumentando os riscos de um cidadão ser executado nesses Estados. Foto: Reprodução / Internet

“Traga de volta a pena de morte”, dizia o anúncio de página inteira veiculado em jornais de Nova York em 1989. Quem pagou foi o magnata Donald Trump, que defendia a retomada da pena capital. Nova York permanece entre os 21 Estados que não executam condenados, mas 30 anos depois, agora como presidente, Trump levantou a moratória federal de 2014 sobre a pena de morte aumentando os riscos de um cidadão ser executado nesses Estados.

Com a decisão, anunciada em julho, seu governo comunicou que as primeiras cinco execuções estão programadas para ocorrer entre 9 de dezembro e 15 de janeiro de 2020. É quase o dobro de execuções conduzidas pelo governo desde que a pena de morte foi instituída para crimes federais, em 1988 – a pena capital voltou a ser permitida pela Suprema Corte em todo os EUA em 1976. A última execução do governo federal foi em 2003.
No corredor da morte federal americano há 62 condenados, mas críticos e advogados temem que esse número aumente em breve. Segundo a especialista Andrea Lyon, os processos federais quase quadruplicaram sob Trump. “Há tantos processos federais envolvendo pena de morte que os escritórios e ONGs não estão conseguindo encontrar pessoas qualificadas o bastante para ajudar (na defesa dos acusados)”, disse Andrea ao Estado.
Advogada de dois homens que podem ser condenados à morte, Andrea afirma que as pessoas ficam surpresas com sua atuação em Illinois, um Estado onde a pena capital foi abolida em 2011. A grande mudança no país sob Trump, segundo ela, é o que passou a ser considerado crime federal passível de execuções.
“A pena de morte está em declínio nos EUA há muito tempo. O que tem acontecido, desde que Trump assumiu, é que promotores e procuradores federais estão retirando a jurisdição de casos ordinários que pertencem aos Estados e levando para a esfera federal. Isso é atípico e perturbador por muitas razões”, disse.
Precedentes
De acordo com o Death Penalty Information Center, instituto que concentra informações sobre pena capital, a execução federal é autorizada para uma variedade de crimes que diretamente implica em interesse federal, incluindo terrorismo e espionagem.
No entanto, segundo o centro, nenhum dos cinco prisioneiros, cujas execuções foram agendadas para este ano, se encaixam nesse perfil. Apenas 1 dos 62 condenados, atualmente no corredor da morte federal, foi sentenciado por terrorismo – Dzhokhar Tsarnaev, que atacou com explosivos a Maratona de Boston, em 2013.
“O governo federal está impondo a pena de morte a Estados que a rejeitaram”, afirma Andrea. “Procuradores federais deveriam estar processando políticos corruptos, indo atrás de fraudadores de bancos, fazendo coisas que o Estado não pode fazer. Mas, em vez de atuarem nesses casos, estão lidando com crimes de rua.”
O problema desse cenário, na avaliação de Ruth Friedmnan, diretora do Federal Capital Habeas Project, é a precariedade desses processos. “Em vez de ser aplicada a um grupo específico de crimes hediondos de interesse federal, com advogados qualificados e recursos dos dois lados, a pena de morte federal é arbitrária, racista, tendenciosa e repleta de problemas na defesa e nos recursos científicos forenses”, afirmou Ruth.
De acordo com Andrea, não há uma explicação clara para a federalização dos crimes, uma vez que a violência tem caído nos EUA nos últimos 30 anos – entre 30% e 40%. Em comunicado, em julho, o Departamento de Justiça afirmou, ao justificar sua decisão, que o governo devia “às vítimas e às famílias avançar com a sentença imposta pelo sistema de Justiça” e, por isso, seguia uma orientação do presidente para aplicar sentenças mais duras para crimes violentos.
A advogada, porém, vê uma tentativa de impulsionar a pena de morte no momento em que o apoio a ela vem se reduzindo nos EUA. A última pesquisa do Instituto Gallup, em 2018, mostrou que, pela primeira vez, menos da metade dos entrevistados (49%) disseram acreditar que a pena de morte é aplicada de maneira justa nos EUA.
A persistência da pena capital, segundo ativistas, é particularmente preocupante quando se considera os problemas que ela envolve como, por exemplo, os custos. De acordo com Andrea, é mais caro para o Estado conduzir um processo envolvendo uma pena de morte do que manter o prisioneiro detido. Além disso, nesses casos, a margem de erro é bastante alta e mais comum do que em outros crimes, segundo Andrea, por mexer muito mais com o aspecto emocional.

Natural do Rio de Janeiro, é jornalista formado pela Favip. Desde 1990 é repórter do Jornal VANGUARDA, onde atua na editoria de política. Já foi correspondente do Jornal do Commercio, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e Portal Terra.

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