Brasil rumo a um Mercado de Carbono Regulamentado: O que esperar?

Por Marcelo Rodrigues

O Brasil está dando um passo importante rumo à regulação do mercado de carbono, com a recente aprovação do Projeto de Lei nº 182/2024 no Senado, que agora retorna à Câmara dos Deputados para ajustes finais. Esse projeto visa estabelecer um Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), uma estrutura que busca reduzir as emissões de gases que contribuem para as mudanças climáticas, ao mesmo tempo em que cria um mercado de carbono mais organizado e regulamentado no país. O texto aprovado, que passou por intensas discussões nos últimos anos, traz uma série de inovações e ajustes que podem impactar diretamente o setor empresarial e ambiental.

A principal ideia do SBCE é adotar o modelo internacional estabelecendo um limite máximo para as emissões de gases de efeito estufa e permitir que as empresas negociem direitos de emissão, conhecidos como as famosas “quotas de carbono”. Essas quotas representam o direito de uma instalação ou fonte emitir uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) e poderão ser compradas e vendidas no mercado. O objetivo é reduzir, gradualmente, as emissões, incentivando as empresas a adotarem práticas mais sustentáveis para evitar pagar por essas permissões de emissão.

O PL define claramente quem serão os agentes regulados pelo sistema: empresas ou pessoas físicas responsáveis por fontes ou instalações que emitem mais de 10 mil toneladas de CO2 equivalente por ano. Esses agentes terão que reportar suas emissões e, para aqueles que superarem as 25 mil toneladas anuais, haverá a obrigatoriedade de fazer a conciliação periódica de suas emissões, ou seja, comprovar que adquiriram créditos suficientes para cobrir o total de CO2 emitido. Essa conciliação será feita por meio da compra de Cotas Brasileiras de Emissões (CBE) ou Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVE), que comprovam que as emissões foram efetivamente reduzidas ou removidas do ambiente.

Mas não é só no mercado regulado que a regulação vai atuar. O projeto também inclui regras para o mercado voluntário de carbono, onde empresas e outras entidades podem, de forma opcional, comprar créditos de carbono para compensar suas emissões. Aqui, o Brasil abre espaço para uma gama de atores, como geradores de projetos de créditos de carbono, desenvolvedores e certificadores, além de envolver povos indígenas e comunidades tradicionais, que poderão gerar créditos a partir de projetos de preservação e restauração florestal, por exemplo.

A governança do SBCE será gerida por um Comitê Interministerial, responsável por definir as diretrizes gerais do sistema, e um Comitê Técnico Consultivo, que vai assessorar na melhoria contínua do sistema. Esses comitês terão um papel fundamental na transparência e na eficácia das políticas implementadas, sendo responsáveis por coordenar as alocações de quotas de carbono e garantir que o Brasil cumpra seus compromissos com o Acordo de Paris.

Falando em alocações, um dos aspectos mais interessantes do projeto de lei é o Plano Nacional de Alocação. Esse plano vai definir, periodicamente, o limite de emissões do país e como as quotas de carbono serão distribuídas entre os agentes regulados. O plano será ajustado a cada ciclo, garantindo que as empresas tenham previsibilidade e tempo suficiente para se adaptar às novas metas de redução de emissões.

Outro ponto relevante é a regulamentação das infrações e penalidades para aqueles que não cumprirem as regras do SBCE. A legislação prevê multas pesadas, que podem chegar a até 3% do faturamento bruto da empresa, além de outras penalidades como embargo de atividades e a perda de licenças ambientais. A implementação do SBCE será feita de forma gradual, com prazos definidos para a regulamentação do sistema e para o início das transações de créditos de carbono.

O projeto de lei também tem uma conexão direta com o Acordo de Paris, por meio do mecanismo, que permite a troca internacional de créditos de carbono. Isso significa que os créditos gerados no Brasil poderão ser vendidos para outros países, ajudando o Brasil a cumprir suas metas climáticas globais e a gerar receitas adicionais para o país.

Marcelo Rodrigues é advogado e professor universitário

Natural do Rio de Janeiro, é jornalista formado pela Favip. Desde 1990 é repórter do Jornal VANGUARDA, onde atua na editoria de política. Já foi correspondente do Jornal do Commercio, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e Portal Terra.