Em evento de inauguração da Escola Internacional de São Paulo, o ex-presidente e professor Fernando Henrique Cardoso ilustrou as evoluções da educação brasileira ao longo de sua experiência acadêmica e política. Realizada no Buffet França, no bairro de Higienópolis, na última terça-feira (02), a palestra contou com a presença de mais de 600 convidados, dentre empresários do setor educacional, políticos e convidados dos idealizadores da Escola Interacional de São Paulo, Michel e Raquel Lam.
Passando por temas como sexualidade, drogas e tecnologia, o ex-presidente foi entrevistado pelo psicólogo e escritor José Ernesto Bologna. Traçando uma linha histórica sobre a educação no Brasil, a primeira pergunta da noite abordou as diferenças de relação institucional entre família e escola de antigamente com as atuais. Para o ex-presidente, as relações institucionais entre escola e a comunidade mudaram a forma como professor e aluno são tratados dentro da sala de aula: “A escola do passado acentuava diferenças e criava hierarquias. O professor era o único e exclusivo detentor de uma autoridade na produção do saber, e isso inibia qualquer troca de informação entre o docente e o discente. A escola de hoje não pode mais continuar assim. O ensino deve ser mais humanizado, porque o professor, acima de tudo, também é humano, e uma relação mais próxima com seu pupilo enriquece o aprendizado”, comenta.
A autonomia, desenvolvida pela imaginação e por uma relação mais aberta com o professor, possibilitou uma evolução na formação do estudante, que hoje encontra-se multifacetado pela aquisição de outras culturas: “Ter um ensino multicultural é fundamental hoje em dia. Aprender diferentes visões de mundo sob outros aspectos culturais é enriquecedor”, afirma.
Conquistando uma maior proximidade e cultura, os temas contemporâneos aparecem dentro das salas de aula de forma surpreendente, sem que todos estejam preparados para lidar com a situação. Os antigos dilemas da sexualidade, principalmente feminina, foram destaque em uma época em que o ensino estava começando a ser moldado para o que conhecemos hoje. “Os dilemas [sexuais] antigos basicamente não eram discutidos, nem pela escola nem pelos pais. Tínhamos que descobrir o que nossos desejos físicos nos mostravam e tentar entendê-los”, comentou.
Fernando Henrique explica que, após as grandes manifestações culturais da década de 60, a sexualidade passou a ser inserida dentro do contexto escolar, como forma de educar tais desejos: “A escola acabou se tornando naquela época o melhor espaço para debater sexualidade, já que a igreja se afastou dessa responsabilidade e os pais não conseguiam entender as angústias de seus filhos”, concluiu.
A questão das drogas também foi abordada pelo ex-presidente, em que reiterou a escola como sendo a melhor instituição para lidar abertamente com o tema: “No Brasil, a discussão é mais importante do que a legalização ou repressão inicial. O debate deve passar pela escola para garantir um consenso maior sobre o tema”, disse.
Por último, o papel da escola e sua relação com as mudanças tecnológicas foram alvo de inúmeras perguntas feitas ao professor. Segundo FHC, as escolas adquiriram um papel triplo dentro da sociedade: “A escola hoje tem um triplo papel institucional no mundo contemporâneo: o de culturalizar, moralizar e socializar. Esse papel também é papel da família, da sociedade e outros organismos inseridos nela. Porém, o mais importante é que a escola consiga interligar esses outros organismos para que criem relações e possam aperfeiçoar as novas demandas que aparecem na sociedade. Ou você consegue ter uma boa formação ou você se perde em meio a uma grande quantidade de perspectivas e não conseguirá sobreviver na vida. A educação de hoje deve ser focada em garantir a autonomia do sujeito para que ele possa tomar decisões sozinho”, analisa.
Tudo não vai se resumir a máquinas, de acordo com Fernando Henrique Cardoso. Nossa vida será realizada por escolhas, como sempre foi, com base na ética e na moral. “O papel da escola é inspirar pessoas através do comportamento. Fazer as pessoas a se interessarem pelas coisas motivando-as com a mesma motivação que você tem ao transmitir o conhecimento. A escola tem que transmitir humanidade aos alunos.”