O governo de Michel Temer, marcado pela mais baixa popularidade de um Presidente desde a redemocratização, ficará também conhecido por ter sido o governo que foi a nocaute pela maior greve dos caminhoneiros no Brasil, com suspensão do abastecimento de alimentos, combustíveis e medicamentos, entre outros. A paralisação dos caminhoneiros é mais um capítulo que retrata a insatisfação dos brasileiros, que, desde as manifestações de junho de 2013, reclamam de governos, partidos e políticos taxados pela corrupção e pela ineficiência frente à representação das demandas da população brasileira.
Estudos clássicos sobre o governo representativo partem da ideia de que, em democracias, o povo não governa diretamente – para fazer parte do governo, o povo precisa do mecanismo da representação política formado por partidos e políticos. Os argumentos pró-representação política são os mais variados possíveis. Em suas obras, os sociólogos Max Weber (1864-1920) e Joseph Schumpeter (1883-1950) limitam a participação do povo no voto nas democracias, porque ambos entendiam que a complexidade administrativa da sociedade moderna atrelada à incapacidade do indivíduo comum em tomar decisões frente a assuntos complexos se colocavam como condições óbvias que inviabilizavam a participação mais ampla do povo.
Na segunda metade do século passado, no livro Poliarquia, Robert Dahl (1914-2014), bem mais otimista quanto à participação do povo, assevera que, para ser uma democracia, o regime deve conceder ao cidadão diferentes níveis de participação, não restritos ao mecanismo de representação puramente eleitoral. O que acompanhamos em maio último é justamente isso: a ampliação dos níveis de participação do cidadão brasileiro para além do mecanismo puramente eleitoral. Esse é o sentido das greves, manifestações de rua, grupos de interesse, associações da sociedade civil, movimentos sociais etc. São canais de participação não eleitoral que trazem consigo oportunidades reais para a defesa de interesses da população brasileira como: educação, segurança pública, contra corrupção, defesa de direitos políticos, sociais e econômicos.
A greve dos caminhoneiros, por um lado, levou a nocaute o governo de Michel Temer ao mostrar sua incapacidade em conter crises e reduziu qualquer expectativa de sucesso eleitoral deste governo nas eleições de 2018. Por outro lado, greves, manifestações de rua e passeatas, quando organizadas com valores da não-violência e da tolerância a diferenças, mostram-se como eficientes instrumentos à disposição da população brasileira para vetar políticas e contestar presidentes.
Autor: Doacir Gonçalves de Quadros, professor do curso de Ciência Política e do mestrado acadêmico em Direito do Centro Universitário Internacional Uninter.