O trâmite para aprovação do projeto de reforma da Previdência, que ocorreu na última semana antes do recesso parlamentar, marcou o fim do primeiro semestre do período legislativo da Câmara dos Deputados de 2019. Como principal resultado dessa fase, após ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, bem como na Comissão Especial da Reforma da Previdência, o projeto de emenda constitucional (PEC 6/2019) passou com larga margem de aprovação no plenário da Câmara.
O trâmite da PEC indica, para além de seu trajeto formal, o perfil do jogo entre o Executivo e o Legislativo no Brasil no atual governo. Como uma pequena amostra do que essa relação tem sinalizado, constata-se: i) a formação de uma coalizão parlamentar permanente de apoio ao Executivo, como era característica do presidencialismo de coalizão clássico, encontrado nos primeiros governos pós-redemocratização. Essa coalização cedeu espaço para uma composição temática, que demanda ser reordenada a cada projeto de lei; ii) maior espaço para atuação do parlamento em relação ao poder de agenda do presidente da república, derivado desses vazios que se abrem a cada novo projeto de interesse do Executivo; iii) o aumento do apoio popular à mudança na previdência, com claro impacto sobre o comportamento parlamentar; iv) a resposta do Executivo às exigências de negociação dos parlamentares, o que pode ser verificado pela liberação das emendas orçamentárias aos deputados.
Para o segundo semestre, ainda restam a aprovação em segundo turno no plenário da Câmara e a tramitação no Senado, com processo idêntico ao exigido na Câmara baixa. O que está em aberto, entretanto, é se os municípios e os estados vão ser inseridos na emenda constitucional, já que o relatório final do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) acabou excluindo as subunidades federativas da reforma. A inclusão dos estados e municípios na nova previdência é um dos pontos mais delicados da negociação entre o Executivo e Legislativo e foi retirada para poder ser aprovada na Câmara. A despeito dos esforços dos reformistas no Senado favoráveis à inclusão e ao próprio Planalto, ela continuará sendo tema controverso no segundo semestre.
A reforma da previdência parece sinalizar uma mudança de relação entre o Executivo e o Legislativo no âmbito do processo decisório nacional. Se o presidente prefere não formar uma base de apoio regular e distribuir cargos ministeriais em troca de apoio parlamentar, permite que lideranças parlamentares atuem decisivamente alterando o conteúdo das reformas. Essa estratégia leva o presidente a transferir parte dos custos de negociação ao parlamento sem, no entanto, abrir mão de reivindicar os méritos das vitórias. Entretanto, essa estratégia passa por mais ativismo do Legislativo, mais barganhas políticas e, consequentemente, maior demanda por recursos orçamentários aos parlamentares.
Autores:
André Frota é membro do Observatório de Conjuntura e professor do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Internacional Uninter.
Luiz Domingos Costa é professor dos cursos de Ciência Política e Relações Internacionais do Centro Universitário Internacional Uninter.