Por Magno Martins
Maurílio Ferreira Lima, que partiu ontem para a última viagem, pertence a uma geração que está chegando ao fim no Brasil: a dos políticos idealistas, sonhadores, com coragem cívica e retidão moral. Convivi de perto com ele em Brasília, integrando uma bancada pernambucana de notáveis igualmente dotados de elevado espírito público, entre os quais destacaria Cristina Tavares, Egydio Ferreira Lima, Osvaldo Lima Filho e Fernando Lyra.
Cassado pelo regime militar em 1968, com apenas seis meses de mandato, tendo chegado ao Congresso como suplente do então deputado João Lyra Filho, pai de Fernando e do ex-governador João Lyra Neto, que havia se licenciado apenas para dar uma oportunidade ao bravo companheiro, Maurílio combateu o regime de exceção e em sua terra natal, Limoeiro, as bravuras do Coronel Chico Heráclito. Baixinho na estatura, gigante na disposição física, bateu de frente com os que usaram a chibata e outras armas para perseguir, torturar e matar.
Maurílio era vaidoso, como todo político, mas suas ideias se sobrepunham a qualquer gesto ou iniciativa para atrair os holofotes, porque era o tipo de parlamentar que dizia o que o povo queria ouvir. Criativo e ousado, era presença frequente nos telejornais nacionais. Até no modo de vestir era diferenciado: adepto dos tênis coloridos combinando com camisas estampadas. Seu vestuário compunha um perfil próprio, muito parecido com o de Fernando Gabeira.
Mas diferente de Gabeira, Maurílio não era usuário de bicicleta para se deslocar de casa ao Congresso. Tinha, entretanto, algo que combinava com Gabeira, companheiro de Exílio na Argélia, em saraus culturais e etílicos na casa de Miguel Arraes, que varavam a madrugada: o lado festeiro. E foi essa faceta que ajudou Maurílio a criar uma relação bem familiar com os jornalistas em Brasília. Era uma excelente fonte. Eu próprio fui várias festas em sua casa, na Asa Norte.
Parlamentar, o que impressionava nele era a coragem no período em que esteve na oposição, destacando-se pelos virulentos ataques aos governos que combateu – e foram muitos. Nunca conheci um político tão inteligente para criar fatos e virar notícia. Não é fácil chegar a uma Casa parlamentar, como a Câmara dos Deputados, com 513 almas brigando por um lugar ao sol, e ganhar notabilidade. Maurílio foi notável em todos os seus mandatos, sempre destacado entre os 100 congressistas mais influentes pela lista do Diap.
Conhecia o que interessava à mídia e ao País. Defendeu as mais legítimas bandeiras de Pernambuco. Como constituinte, enfrentou a direita e o centrão de Ricardo Fiúza. Sem ocupar a galáxia dos congressistas financiados pelas mesmas empreiteiras e o mesmo modus operandi que deu origem ao escândalo da Lava-Jato, apostou no rádio e na fama de radialista para renovar o seu mandato, única alternativa que lhe restou para conquistar o voto de opinião, mas acabou numa distante suplência, obrigado a ficar recluso na sua Recife, que tanta amava.
Se o homem é um animal político, na expressão legítima da palavra isso se aplica ao bravo Maurílio. Em tempos de paz, soube agir com serenidade e humildade, mas quando foi para a guerra campal da política, em defesa dos interesses da coletividade, agiu como um tigre. Maurílio militou na vida pública porque gostava de servir sem servir-se.
Era um político limpo, altivo, reto, um belo exemplo para as próximas gerações. A verdadeira medida de um homem não se vê na forma como se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas em como se mantém em tempos de controvérsia e desafio. Maurílio era assim: cultivou a esperança, que é o sonho do homem acordado.