Por João Américo de Freitas
O Ministro Edson Fachin ,em uma decisão monocrática (singular), inesperada, surpreendendo até os seus mais otimistas defensores, “anulou” todos os processos contra o ex-presidente, que tramitavam na décima terceira vara federal de Curitiba, na operação lava jato. Essa decisão, que implodiu o escombro da operação lava jato, possui, secundariamente, o objetivo de preservar, minimamente, a reputação da lava jato e do ex-juiz Sérgio Moro. Mas a decisão não deve ser festejava, sob vários aspectos.
O primeiro e mais importante é o fator culpa.
Lula é culpado ou inocente?
Talvez nunca iremos saber, pois Lula não foi julgado por um juiz imparcial. Nos diálogos revelados pela impressa na “vaza jato” e, posteriormente, na operação spoofing, ficou claro que Moro rasgou a toga, pulou o balcão e vestiu a beca da acusação, contaminando todo o processo. Desse modo, a culpa ou não de Lula ficou para segundo plano. Existe uma expectativa real de que possa ocorrer a prescrição dos processos em que o ex-presidente é réu, junção de fatores temporais, data do crime, denúncia e idade. Ocorrendo a prescrição, Lula não poderá ser julgado e a sua culpa ou inocência aferidas.
O patriarca do direito nacional e um dos pais fundadores do nosso pensamento jurídico nacional, Rui Barbosa, cunhou frase para posteridade nos seguintes termos: “A justiça tardia não é justiça; senão injustiça qualificada”. Lula é réu na lava jato desde setembro de 2016 e, desde essa data, a tese da defesa era de que Curitiba e, consequente, a vara em o ex-juiz Sérgio Moro era titular não seriam onde Lula deveria ser julgado. Inúmeros recursos, habeas corpus e reclamações foram apresentados, mas só 5 (cinco) anos depois o que era óbvio foi aceito. Quatro processos, dois com condenações serão remetidos para o Distrito Federal, desfazendo assim o que nunca deveria ter sido feito, ou seja, Lula não deveria ter sido julgado por Moro em Curitiba, segundo a decisão do Ministro Fachin.
O político e intelectual francês François Pierre Guillaume Guizot legou frase imortal, que pode ser aplicada aos dias atuais:
“Quando a política penetra no recinto dos tribunais, a justiça se retira por alguma porta”
A demora em reconhecer o fato de que Moro não poderia julgar Lula, apesar de acertada tecnicamente, trouxe um sentimento de desconfiança, oportunismo, reforçando a insegurança jurídica que o Supremo representa, bem como a imagem de um tribunal político. Ademais, o cavalo de pau jurídico trouxe uma mancha negra, uma sombra de suspeita contra o judiciário e a lava jato, que deveria ser, a todo custo, evitada. Rui Barbosa já havia alertado acerca da injustiça qualificada e, para muitos, a decisão soa como injusta, reforçando a ideia de impunidade em nosso país e em outros perseguição política. O tema competência, ou seja, se Lula poderia ou não ser julgado por Moro, foi objeto de análise em outras oportunidades pelo STF. O Ministro Fachin rejeitou em outras 10 (dez) oportunidades o pedido de deslocamento de competência da lava jato.
Mais uma nota negativa da decisão de Fachin é que outros políticos e empresários, presos e condenados da lava jato, tais como Geddel Vireira, Guido Mantega, André Esteves entre outros, podem ser beneficiados pela decisão do Ministro, se essa for convalidada pelo STF.
Outro fator deletério da anulação dos processos contra o ex-presidente Lula, em nossa avaliação, ocorre no campo político. Não estamos negando que Lula deve e pode ter seus direitos políticos reabilitados, ou seja, Fachin tronou Lula “ficha limpa” e, desse modo, ele poderá se candidatar. Mas presença de Lula levará a uma polarização que apresentará ao país o mais do mesmo. Alternativas novas, principalmente no campo da esquerda, serão fatalmente asfixiadas, e veremos uma radicalização nos lares, nas ruas e nas urnas.
A operação lava jato, vemos agora, não só fez o bem ao país. Existe sobre Curitiba uma mancha negra irreparável a justiça e ao povo brasileiro.
João Américo de Freitas é advogado e comentarista político na Caruaru FM