Por Adilson Lira
No final dos anos 80, mais precisamente em 1988, o SINDECC- Sindicato dos Empregados e Empregadas no Comércio de Caruaru passava por um processo de renovação de suas concepções políticas, com a eleição de uma nova diretoria, o fim do ciclo de uma direção pelega e o início da implantação de um novo modelo, uma nova concepção sindical, que em muito se diferenciava da concepção até então vigente na categoria.
Surgia assim em Caruaru, a partir do Sindicato dos Comerciários, o sindicalismo classista, que passava a ocupar o lugar do sindicalismo pelego, velha concepção sindical advinda do período do getulismo no Brasil.
Oxigenada pelos ares de redemocratização que vivia o país nos anos 80, a nova direção do SINDECC, adotou lemas como: “só a luta faz a lei” ou “quem luta conquista”, transformando o então sindicato pelego, numa das maiores e mais importantes trincheiras da luta de classes, não apenas para a categoria dos empregados e empregadas no comércio de Caruaru, mas também abrindo suas portas para a organização e apoio à luta de outras categorias de trabalhadoras e trabalhadores em Caruaru e região.
A concepção de polo sindical foi capitaneada, organizada e apoiada pela nova direção do SINDECC. Com isso, importantes categorias como a das costureiras e costureiros; trabalhadoras e trabalhadores da indústria têxtil etc., foram se agregando a essa concepção e passaram a adotar políticas sindicais em conjunto com o sindicato das comerciárias e comerciários.
Não foi por acaso que o SINDECC no início dos anos 90 se transformou no maior e mais importante sindicato de trabalhadoras e trabalhadores do interior de Pernambuco, no ramo sindical da iniciativa privada, sendo reconhecido nos meios sindicais da capital pernambucana pela organização e luta em defesa dos interesses não apenas da categoria comerciária, mas de toda classe trabalhadora.
As acirradas disputas com os representantes da categoria patronal em Caruaru faziam das negociações anuais (Convenções coletivas da categoria), uma verdadeira escola sobre como fazer a luta de classes, tanto para empregadas e empregados no comércio, quanto para as categorias patronais, que se dividiam, naquela época, entre os representantes do comércio varejista e atacadista.
A organização do sindicato dos comerciários e das comerciárias, a partir de 1988, com a vitória nas eleições sindicais daquela companheirada que pretendia deixar de lado o velho modelo de sindicalismo pelego e ingressar num novo período do sindicalismo de luta de classes, foi de tamanha importância para a organização da classe trabalhadora em geral, em Caruaru e região, que até a classe patronal foi levada a melhor se organizar em suas entidades de classe, ou seja, a luta organizada dos empregados e empregadas no comércio de Caruaru, a partir da nova concepção de organização sindical adotada pelo SINDECC foi também, de certa forma, responsável pelo surgimento do SINDLOJA- Sindicato dos Lojistas do Comércio de Caruaru, que tem sua fundação datada de 21 de julho de 1989, portanto, no ano posterior ao advento da concepção de sindicalismo de luta de classes adotada pela nova direção do SINDECC a partir de 1988.
O tempo passou, o mundo do trabalho evoluiu, as concepções sindicais, antes revolucionárias, se tornaram arcaicas, e o que vemos hoje é um sindicalismo bastante fragilizado, sem apoio das bases e sem poder de persuasão. O sindicalismo brasileiro vive atualmente uma crise de concepção sem precedentes. Podemos dizer que o modelo sindical vigente hoje no Brasil “ficou parado no tempo e no espaço”, não conseguiu ultrapassar a barreira do Século XX para o Século XXI. Portanto a crise de concepção e a falta de evolução do sindicalismo brasileiro, o situa com atraso de umas duas ou três décadas, em relação ao novo mundo do trabalho do Século XXI.
A situação de fragilidade do sindicalismo no Brasil refletiu fortemente em Caruaru, lógico. O SINDECC, que antes liderava um processo de articulação dos sindicatos de trabalhadoras e trabalhadores na região, hoje, infelizmente, não passa de mais uma entidade sindical que tenta resistir e sobreviver nesse novo cenário de evolução do mundo do trabalho e, assim como a entidade de classe dos comerciários e comerciárias, as demais entidades sindicais também padecem do mesmo problema.
Resumindo, o sindicalismo vive, não apenas em Caruaru, mas no Brasil, uma crise de concepção, de identidade e de projeto político. A classe trabalhadora já não se sente mais representada por esse tipo de sindicalismo, daí a baixa adesão aos sindicatos cujo índice de filiação já chegou, em média, a 30% ou 40%, mas agora, não passam de insignificantes 10% a 15% do número de trabalhadoras e trabalhadores associados a suas entidades de classe (sindicatos). Mas o maior problema é que não vemos o movimento sindical empenhado em discutir esse novo momento e buscar nova forma de luta, se renovar, se adaptar ao novo momento que vive o mundo do trabalho.
Os sindicatos estão muito rapidamente se transformando em meras entidades cartoriais. O que vemos hoje são as velhas representações de dirigentes, agarradas no que restou da velha estrutura sindical, e dela não querendo se soltar por nada. Sem mudanças, sem renovação de concepção, sem atualização, sem querer adentrar ao novo tempo do mundo do trabalho, estão fadados ao fracasso!
Portanto, nesse dia dos comerciários e comerciárias, queremos chamar a categoria e as direções sindicais, não apenas as ligadas ao comércio, mas de uma forma geral, todas as representações de trabalhadoras e trabalhadores, para uma profunda reflexão a respeito de quê sindicalismo queremos, já que esse modelo atual está esgotado, não atende mais aos interesses da classe trabalhadora como um todo. Vivemos no Século XXI e precisamos trazer os sindicatos para esse novo tempo, para esse novo mundo do trabalho que se coloca diante de nós.
Apesar da avaliação um tanto quanto drástica, saudamos a categoria das trabalhadoras e trabalhadores do comércio de Caruaru e de todo Brasil, pelo seu dia, acreditando que vamos sim sair do marasmo e apatia na qual o movimento sindical se colocou, e se mantém, e avançaremos para um novo tempo, atualizando concepções e avançando na luta pelo empoderamento e autonomia da classe trabalhadora. Precisamos urgentemente trazer o movimento sindical para esse novo tempo, para o Século XXI.
A inesquecível Elis Regina nos dá o mote da mudança necessária, na antológica interpretação da canção, “Como nossos pais”, de autoria de Belchior, quando em determinado trecho da música diz: “Minha dor é perceber, que apesar de termos feito tudo, tudo, tudo o que fizemos, nós ainda somos os mesmos e vivemos… como os nossos pais.
*Adilson Lira, foi assessor político do SINDECC, nos anos 90; é advogado, pós-graduado em Gestão Pública e Ciências Políticas e pós-graduando em Sociologia; coordenador da organização social Via Trabalho e Membro da Executiva Estadual do PT, onde exerce a função de Secretário Agrário Estadual.