Luiz Pladevall (*)
O saneamento voltou para a pauta das prioridades nacional nos últimos meses. O tema estava esquecido nas gavetas da burocracia palaciana, mas ganhou destaque com a MP 844/18, que perdeu a validade no mesmo ano e propunha um novo marco legal para o setor. No último dia do seu governo, Michel Temer editou a MP 868/18, com acompanhamento do grupo de transição do presidente Jair Bolsonaro. A Medida Provisória também “caducou”, como se diz no jargão político, no dia 3 de junho.
No mesmo dia, o senador Tasso Jereissati apresentou um Projeto de Lei para tratar do marco legal do saneamento básico. O plenário do Senado aprovou urgência para a proposta, que foi ajustada e aprovada pela comissão de Infraestrutura e, posteriormente, pelo plenário da Casa. Agora o PL 3.261/19 vai para a análise da Câmara dos Deputados. Mas, da maneira como foi apresentado, o Projeto de Lei vai abrir novas brechas para futuras judicializações.
Um assunto de tamanha envergadura tem sido tratado com pressa desnecessária diante dos impactos que poderão causar a milhões de brasileiros. As decisões contraproducentes só vão adiar o avanço da infraestrutura do setor, afastando eventuais investidores e fazendo com que os escritórios de advocacia continuem a ganhar importância ainda maior em detrimento das empresas de engenharia consultiva responsáveis pelos planejamentos e projetos. Por isso, a população precisa ser esclarecida sobre essa urgência de se acelerar a privatização dos serviços de saneamento e os desdobramentos que isso pode alcançar.
As experiências pelo mundo sinalizam a importância de uma decisão consciente sobre o tema. A Inglaterra, por exemplo, foi o primeiro país a privatizar completamente o setor de saneamento básico. Passadas três décadas dessa experiência, a população convive com descumprimentos frequentes de metas de aumento de eficiência e redução de desperdício, entre outros problemas. Isso nos leva a aprofundar a discussão sobre o liberalismo exacerbado, que tem apenas o papel de atrair o capital especulativo, capaz de inclusive desestruturar as operadoras privadas que estão atuando no país. O setor de saneamento precisa, indiscutivelmente, da iniciativa privada diante da incapacidade financeira do estado de dar conta das nossas demandas. Mas esse processo precisa ser adotado com profundas reflexões.
Por isso, a urgência brasileira deve ser substituída pelo planejamento de curto, médio e longo prazo. Não conseguiremos avançar minimamente na ampliação dos serviços de saneamento, seja por órgão público ou empresas privadas, se não tivermos um panorama detalhado do setor. Infelizmente, os dados disponíveis ainda trazem dúvidas e requerem uma revisão e até mesmo um levantamento minucioso.
Precisamos ainda olhar para as experiências exitosas, como a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), que tem desempenho referência no setor. Assim como para os casos de privatização de sucesso que já temos no território brasileiro.
A complexidade do saneamento requer a participação de todos os atores envolvidos com o tema. A imposição de uma nova legislação é insuficiente para atender às demandas dos municípios nesse setor. O Brasil precisa começar a planejar o seu futuro.
(*) Luiz Pladevall é engenheiro, presidente da Apecs (Associação Paulista de Empresas de Consultoria e Serviços em Saneamento e Meio Ambiente) e vice-presidente da ABES-SP (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental).