Por João Américo de Freitas
A pandemia é um fenômeno antes de tudo coletivo. Todos somos impactados pelos seus efeitos, e para superá-la só existe um caminho, qual seja, a ciência, ciência que fabricou a vacina, que imuniza a população e que faz voltar, coletivamente, à vida normal
O brasileiro entendeu que só a vacina salva. O governo federal, tardiamente, de forma criminosa, também entendeu que não existe outra alternativa que não seja a vacina. Algumas vozes irresponsáveis, criminosas, embebecidas no charco da ideologia burra e arrogante ainda defendem o tratamento precoce, fruto muito mais de uma posição política do que de evidências científicas.
Para distribuir as vacinas pelo Brasil, o Governo Federal desenvolveu junto com estados e municípios o PNI – Plano Nacional de Imunização. A grosso modo, nesse plano, PNI, cabe ao Governo Federal a compra, aos Estados a distribuição e aos Municípios a aplicação na população elegível para ser vacinada.
Na compra das vacinas houve, como já mencionado acima, uma demora injustificada e criminosa por parte do Governo Federal. O Presidente da República chegou a dizer, em dezembro de 2020, que “Pressa da vacina não se justifica”. Essa frase foi exteriorizada na conduta do Governo Federal que deixou de responder 81 e-mails da Pfizer, para tratar da vacina. O atraso letal na compra das vacinas deixou a clara, nítida impressão de que, caso o Brasil houvesse respondido o pedido de venda da Pfizer em agosto de 2020, vidas teriam sido salvas.
Incrivelmente, a vacina Covaxin, desenvolvida pelo laboratório indiano Bharat Biotech, teve outra dinâmica na sua compra, diferente da Pfizer. A vacina indiana teve sua compra, pelo Governo Federal, pautada pela rapidez, presteza e muita vontade. A compra do imunizante indiano, diga-se de passagem, foi realizada na contramão do que o Presidente havia prescrito como metodologia de compras, ou seja, o Presidente havia qualificado como “irresponsabilidade” a compra de vacinas contra a Covid-19 antes da aprovação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). No entanto, a compra da vacina Convaxin foi aprovada no valor de R$ 1.61 bilhão e o valor empenhado, mesmo sem a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Sobre a vacina indiana pairam outras a suspeitas, e a mais grave é o superfaturamento em 1000%, sendo a vacina mais cara, com o maior preço, negociada pelo Brasil. Além disso, um intricado e suspeito acordo comercial envolvendo atravessadores com movimentações atípicas, demonstram fortes indícios de corrupção na compra do imunizante indiano. A compra da vacina indiana foi a única que precisou ser intermediada por uma empresa, a Precisa Medicamentos. Diante das suspeitas, foram feitas 10 recomendações contra a compra da vacina, emitidas pelo Ministério da Saúde e pela AGU, mas mesmo assim a compra foi validada.
O Presidente foi avisado e não acionou nenhum órgão de controle. Mesmo diante de indícios de corrupção, não foi instaurado nenhum procedimento, e após a sua divulgação, a compra foi suspensa.
Mais um indício de corrupção do governo de Jair Bolsonaro surgiu na compra de vacinas com um pedido de propina. Um representante da empresa vendedora de vacinas afirmou ao jornal Folha de S.Paulo que recebeu pedido de propina de US$ 1 por dose, em troca de fechar contrato com o Ministério da Saúde. De acordo com Luiz Paulo Dominguetti Pereira, que se apresentou ao jornal como representante da Davati Medical Supply, o diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, teria cobrado a propina em 25 de fevereiro, durante jantar no restaurante Vasto, no Brasília Shopping, no Distrito Federal.
Desse modo, diante da gravidade das acusações, estas devem ser aprofundadas. A CPI da COVID ganha um novo fôlego e renasce com o dever de investigar as acusações acerca da compra dos imunizantes, devendo, de todo modo, auditar todas as compras e, ao identificar casos de corrupção, deve revelá-los e encaminhá-los para as instâncias próprias, onde os eventualmente suspeitos, depois de exercerem seu direito de defesa, provada a culpa, sejam proporcionalmente punidos pelos seus crimes.
João Américo de Freitas é advogado e comentarista na Caruaru