Horas depois de ter anunciado que o Parlamento manteria o veto do presidente Jair Bolsonaro a pontos do Orçamento impositivo, o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP), suspendeu a sessão conjunta de senadores e deputados que tratava do assunto, ontem. Mesmo após um dia inteiro de discussões, os impasses sobre a distribuição de recursos do Orçamento de 2020 continuaram intensos, com o envio, no fim da tarde, de três projetos do governo que buscam regulamentar o assunto.
As lideranças partidárias devem se encontrar novamente hoje para tentar chegar a um consenso sobre as próximas votações. Ontem, embora tenha afirmado que o veto será mantido, Alcolumbre reclamou da demora do governo em enviar os projetos que vão regulamentar a distribuição dos recursos das emendas parlamentares. “Eu estava esperando os PLNs para as 9h e eles só chegaram às 17h05. Legitimamente, vários senadores se manifestaram para cumprir o regimento para a votação”, afirmou o presidente do Congresso.
As proposições do governo são uma forma de contrapartida pela manutenção do veto ao Orçamento impositivo. A ideia é garantir que o Congresso tenha, ao menos, direito de indicar a prioridade de execução de R$ 15 bilhões dos R$ 30 bilhões que geraram brigas entre Legislativo e Executivo nas últimas semanas. Na LDO, antes da sanção presidencial, o valor era destinado a emendas do relator do Orçamento, mas Bolsonaro vetou o trecho. É a manutenção desse veto que tem sido discutida pelo Parlamento desde antes do carnaval.
Mas, devido à demora de Bolsonaro em enviar os projetos, Alcolumbre anunciou ontem à noite que os vetos podem ser votados hoje, mas os projetos só começarão a ser apreciados na semana que vem. Parte dos deputados, no entanto, defende que os vetos só sejam analisados depois que os PLNs sejam aprovados e sancionados pelo presidente Jair Bolsonaro, para garantir que o governo não vai voltar atrás no acordo. A ideia é defendida por líderes do chamado centrão – grupo informal que inclui partidos como MDB, PP, PL, DEM, PSD.
Projetos de lei demoram mais para tramitar, enquanto os vetos são votados de imediato na sessão conjunta. Por pressão dos parlamentares, ficou decidido, em reunião com Maia e com os líderes, que os três PLNs do Executivo vão tramitar de acordo com o regimento – ou seja, encaminhados primeiro para a Comissão Mista de Orçamento (CMO), onde tramitará com pelo menos cinco sessões para a inclusão de emendas.
Crise A sessão foi suspensa pouco depois de o presidente ter dito, no Twitter, “que não houve qualquer negociação em cima dos R$ 30 bilhões”. Bolsonaro se refere a um dos trechos da LDO vetados por ele, que garantia esse valor a emendas sob gestão do relator do Orçamento, deputado Domingos Neto. “A proposta orçamentária original do Governo foi 100% mantida”, disse o presidente.
A possibilidade de derrubada dos pontos da LDO que tratam do Orçamento impositivo, em especial o das emendas do relator, foi o pano de fundo da crise mais recente entre o Executivo e o Legislativo. Ontem, antes da sessão conjunta, Alcolumbre tentou apaziguar os ânimos. O senador explicou que “a independência é fundamental, mas a harmonia também”. Segundo ele, “jamais o Congresso quis fazer, como se diz na rua, o parlamentarismo branco”.
O maior impasse em relação às emendas parlamentares é até que ponto o Congresso deve ter liberdade total de decidir a ordem e o prazo em que os valores serão aplicados. As individuais já são impositivas, o que significa que têm preferência. O problema é que, em 2020, os senadores e deputados inseriram na LDO, pela primeira vez, a impositividade também para as emendas das comissões permanentes e para as do relator-geral do Orçamento, deputado Domingos Neto (PSD-CE).
A mudança não agradou o presidente, que decidiu vetá-la. Segundo ele, a aplicação automática do dinheiro, sem interferência do Executivo, é uma forma de engessar o Orçamento. Os parlamentares agora devem manter o veto, mas pedem em contrapartida que também tenham participação na ordem de execução do valor, mesmo que não fique nas mãos do relator.
Entenda a polêmica Antes do carnaval, os parlamentares haviam costurado um acordo com o governo para derrubar parte do veto e garantir a aplicação automática de R$ 30 bilhões, com base em diretrizes definidas pelo relator-geral do Orçamento, Domingos Neto. A medida gerou controvérsia e não foi bem-aceita por parte dos senadores e por Bolsonaro. Alguns líderes partidários – do PSL, da Rede e do Podemos – não concordaram com os termos e impediram a votação, na última sessão conjunta, em 12 de fevereiro. Sem conseguir avançar, Alcolumbre adiou as tratativas para depois do carnaval.
A discussão continuou durante o carnaval. Em 19 de fevereiro, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, acusou o Parlamento de “chantagear” o governo, o que gerou fortes reações políticas. Foi nesse cenário que Bolsonaro enviou vídeos, no WhatsApp, em apoio a uma manifestação que propõe, entre outras pautas, o fechamento do Congresso.