Com o acirramento político no país, especialmente a partir de 2018, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) passaram a ser alvos frequentes de ataques e xingamentos de extremistas. Tanto nas redes sociais como em saguões de aeroportos e outros espaços públicos, os magistrados têm enfrentado uma série de hostilidades, que parte de pessoas anônimas e também de políticos conhecidos.
A Polícia Federal tem investigado os casos, sendo que pelo menos três envolvidos nos ataques estão presos. No dia 23 de outubro de 2022, o ex-presidente do PTB foi preso após veiculação de vídeos com ataques ao processo eleitoral e a ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Na ocasião, Jefferson reagiu com tiros e granadas à ação dos agentes, deixando dois policiais feridos. Ele cumpria prisão domiciliar.
No final de janeiro, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), manteve a prisão preventiva do ex-deputado Roberto Jefferson, argumentando, na ocasião, que a situação que motivou a prisão preventiva dele se mantinha. Segundo Moraes, “em diversas ocasiões, foram trazidas aos autos notícias de diversos descumprimentos das medidas cautelares impostas em face de Roberto Jefferson, a revelar a sua completa ineficácia em cessar o periculum libertatis do investigado”.
Além da detenção judicial em 23 de outubro, o ex-parlamentar foi preso em flagrante sob a acusação de tentativa de homicídio. Quatro dias depois, a prisão foi convertida em preventiva, e Jefferson se tornou réu por quatro tentativas de homicídio.
Daniel Silveira
Já Daniel Silveira foi preso inicialmente em fevereiro de 2021, em flagrante, após gravar um vídeo com críticas a ministros do STF e em defesa do Ato Institucional nº 5 (AI-5), considerado a medida mais dura na ditadura militar. Em abril de 2022, o plenário do STF condenou o ex-deputado a oito anos e nove meses de reclusão em regime inicial fechado e multa de R$ 192 mil, rechaçando a tese de que suas declarações estariam protegidas pela liberdade de expressão.
Com uma defesa enfática da manifestação de opiniões que não abriguem “discurso de ódio” e “prática de delitos”, os ministros também determinaram a perda do mandato e dos direitos políticos enquanto durarem os efeitos da pena. No dia seguinte, Jair Bolsonaro editou um decreto concedendo a Silveira o instituto da graça — perdão judicial individual exclusivamente do presidente da República para extinguir ou reduzir a pena imposta.
Em 2 de fevereiro deste ano, em seu primeiro dia sem mandato, Daniel Silveira foi novamente preso em sua casa, em Petrópolis, na Região Serrana do Rio. Na decisão, o STF apontou o recorrente descumprimento de medidas cautelares, como o uso da tornozeleira eletrônica. No imóvel, policiais federais apreenderam cerca de R$ 270 mil em espécie.
Em uma cela coletiva na Cadeia Pública de Bangu 8, o ex-parlamentar divide espaço com o ex-vereador Gabriel Monteiro e outros detentos com nível superior. Perto dali, também está preso preventivamente Roberto Jefferson.
Candidato a vereador
Em julho do ano passado, a PF também prendeu Ivan Rejane Fonte Boa Pinto, em Belo Horizonte (MG), após publicação de vídeos nas redes sociais com ameaças aos ministros do STF, a Lula e a outras personalidades de esquerda. Rejane foi candidato a vereador por BH nas eleições municipais de 2020, pelo extinto PSL.
Na ocasião, ele resistiu à prisão, mas a PF arrombou o portão do local onde ele estava e cumpriu o mandado. Em um dos vídeos que motivaram a prisão, Ivan Rejane disse ia “caçar principalmente” ministros do STF e cita os nomes de Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Luiz Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Rosa Weber. Também disse que iria pendurar os ministros do supremo de cabeça para baixo.
Na mesma gravação, Rejane disse que Lula deveria andar com segurança porque ele iria “caçar” o então ex-presidente, a deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR) e o deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ).
Em 16 de fevereiro deste ano, o ministro Alexandre de Moraes decidiu manter a prisão preventiva de Rejane. Na ocasião, Moraes justificou que, como a Polícia Federal ainda investigava um grupo de usuários de um aplicativo de mensagens que teria ligação com Rejane, ainda permaneciam os elementos que justificam a manutenção da preventiva.
No último dia 17 de junho, foi a vez do ministro Luís Roberto Barroso negar um novo pedido de habeas corpus feito pela defesa de Rejane, alegando que, segundo a jurisprudência da corte, não caberia ao magistrado conceder habeas corpus “impetrado contra decisão monocrática de ministro da Corte”.
No caso de Rejane, a Polícia Federal apontou o possível cometimento dos crimes de associação criminosa e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, “ao propor a destituição dos ministros do Supremo Tribunal Federal e sua expulsão do país, com isso impedindo o exercício desse órgão do Poder Judiciário, ameaçando reunir pessoas voltadas a um mesmo propósito de ‘caçar’ os ministros do STF”.
Ataques a Moraes
Logo no início do governo, em 6 de janeiro, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, prometeu ser implacável contra ataques a ministros e anunciou que pediria à PF para abrir investigações contra as agressões. Na ocasião, entre os casos elencados, estava o ataque sofrido pelo ministro Luís Roberto Barroso em novembro, em Santa Catarina. O magistrado teve de interromper o jantar e ser escoltado em Porto Belo, no litoral norte do estado, após ser hostilizado por bolsonaristas radicais.
Na sexta-feira (14), o ministro Alexandre de Moraes e sua família sofreram agressões em um aeroporto em Roma. De viagem, o magistrado foi abordado por três brasileiros que chamaram-no de “bandido, comunista e comprado” e um deles tentou desferir um tapa em seu filho. O caso começou a ser investigado pela Polícia Federal.
Segundo especialistas ouvidos pelo GLOBO, agressores de ministros de cortes superiores podem ser investigados por crimes contra a honra ou até por tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito. Embora os ataques possam configurar delito contra a dignidade pessoal magistrado, com pena de até seis meses de detenção, a avaliação é de que a Polícia Federal ou o Ministério Público Federal podem considerar que a violência do grupo teve por objetivo coagi-lo ou constrangê-lo no exercício de seu ofício, aumentando a pena para até oito anos de reclusão.
O Globo