“Se alia pra transformar, para amar e proteger! Criança não tem trabalho, tem que se desenvolver!” Este é o convite do poeta Bráulio Bessa para que todas e todos se unam à luta contra o trabalho infantil no Brasil. Os versos especialmente escritos por Bessa são parte da campanha que terá como slogan este ano: “Proteger a infância é potencializar o futuro de crianças e adolescentes. Chega junto para acabar com o trabalho infantil.”
O propósito é promover, por meio de ações de comunicação nas redes sociais, a conscientização da sociedade sobre a importância de se reforçar o combate a este problema no país e no mundo. Cerca de 1,8 milhão de crianças e adolescentes com idades entre 5 e 17 anos estavam em situação de trabalho infantil em 2019 no Brasil, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE.
Promovida pelo Ministério Público do Trabalho, pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), pelo Programa de Combate ao Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho e pelo Ministério do Trabalho e Emprego, a campanha nacional marca o Dia Mundial e Nacional contra o Trabalho Infantil, celebrado em 12 de junho.
O trabalho infantil é uma gravíssima violação dos direitos humanos, é uma violência contra a infância. Crianças e adolescentes têm o direito de brincar, de aprender e de se manter seguras e saudáveis, inclusive em tempos de crise. No entanto, o trabalho infantil ainda é uma realidade presente em muitos países, nas zonas urbanas, nas áreas rurais e até no mundo digital, impedindo a plena
concretização dos direitos de crianças e adolescentes.
A pobreza e a desigualdade social fazem com que os filhos e as filhas de famílias mais pobres tenham poucas oportunidades de escolha e desenvolvimento na infância e adolescência. Ao atingirem a vida adulta, tornam-se, majoritariamente, trabalhadores com baixa escolaridade e qualificação, ficando sujeitos a menores salários e mais vulneráveis a empregos em condições degradantes, perpetuando, assim, um círculo vicioso de pobreza.
“O trabalho infantil é uma violência contra crianças e adolescentes. E todas as formas de violência contra a infância são um problema nosso, do Estado, das instituições e de toda a sociedade. Uma sociedade omissa em relação ao trabalho infantil é condescendente com essa forma de violência e será cobrada futuramente”, afirma a coordenadora nacional de Combate ao Trabalho Infantil e de Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes, Ana Maria Villa Real.
“A campanha de 2023 tem por objetivo sensibilizar a sociedade sobre a questão através da poesia. A sensibilização é um processo contínuo de desconstrução da naturalização do trabalho infantil, que é um fenômeno que tem cor, raça e endereço.”
A secretária-executiva do FNPETI, Katerina Volcov, reforça que proteger a infância significa cuidar de todas as interfaces nas quais crianças e/ou adolescentes estão envolvidos. “Significa observar como a família dessa criança vive e com quais recursos. Significa saber quais são as condições da escola a fim de proporcionar uma educação de qualidade à criança e ao adolescente, para que não abandonem os estudos. Significa verificar também como e se funciona a rede de proteção no território em que a criança vive. Ou seja, é fundamental que o enfrentamento ao trabalho infantil seja visto de modo intersetorial: emprego decente da mãe, pai e/ ou responsáveis, educação em tempo integral à criança e ao adolescente e uma rede socioassistencial presente são peças-chave no combate ao trabalho infantil”, pontua Katerina Volcov.
Os dados mais recentes da OIT e do UNICEF revelam que, pela primeira vez, em 20 anos, houve uma estagnação na redução do número de crianças em situação de trabalho infantil globalmente. Em 2020, 160 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos eram vítimas de trabalho infantil no mundo (97 milhões de meninos e 63 milhões de meninas). Isto significa, que 1 em cada 10 crianças e adolescentes ao redor do mundo se encontravam em situação de trabalho infantil.
Igualmente alarmante é o fato de que, entre 2016 e 2020, o número de crianças de 5 a 17 anos que realizam trabalhos perigosos, isto é, todo trabalho suscetível de prejudicar a saúde, segurança ou a integridade psicossocial de crianças e adolescentes, subiu, em todo o mundo, para 79 milhões. Só no Brasil, temos mais de 700 mil crianças e adolescentes em piores formas de trabalho infantil, o que não reflete a totalidade de pessoas nessa situação, já que as estatísticas oficiais não contemplam algumas das piores formas de trabalho infantil, como a exploração sexual de crianças e
adolescentes e o trabalho infantil no tráfico de drogas.
“O trabalho infantil é a antítese do trabalho decente e um freio ao desenvolvimento dos países. Priva as crianças e adolescentes de ter acesso a uma educação de qualidade, reduzindo oportunidades de um trabalho decente com renda digna na vida adulta. Por essa razão, o trabalho infantil deve ser erradicado. Para isso, é indispensável um trabalho articulado, políticas integradas e uma vontade coletiva de garantir direitos para fomentar o desenvolvimento pleno das crianças e adolescentes. O fim do trabalho infantil é o caminho para o alcance da justiça social.”, disse Maria Cláudia Falcão, Coordenadora do Programa de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho do Escritório da OIT no Brasil.
O coordenador nacional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho, ministro Evandro Valadão, ressalta que, além de ações de conscientização, é necessário atuar com medidas concretas para combater o trabalho precoce na infância. Nesse sentido, ele destacou a realização, nesta semana, de uma pauta de julgamento temática, a pedido do MPT, em todo país, de processos trabalhistas envolvendo trabalho infantil e aprendizagem.
“Esse mutirão de julgamentos é uma resposta concreta da Justiça do Trabalho a essa grave violação contra crianças e adolescentes”, disse. “O Ministério Público do Trabalho é parceiro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e de todos os 24 Tribunais Regionais do Trabalho do país nesse esforço concentrado para marcar o mês de Combate ao Trabalho Infantil”, completou.
Coordenador nacional de Fiscalização do Trabalho Infantil e auditor-fiscal do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, Roberto Padilha Guimarães destaca a importância de ações integradas para combater essa chaga. “O trabalho infantil, ainda presente em números elevados no Brasil, trata-se de uma grave violação aos direitos de crianças e adolescentes, com prejuízos ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social. Além disso, prejudica os estudos e contribui para a evasão escolar”, disse Roberto Padilha. “O trabalho infantil é um fenômeno social multicausal e complexo que transita nas dimensões sociais, econômicas e culturais. Nesse contexto, o seu enfrentamento de forma adequada só pode ser alcançado através da ação integrada entre governo e sociedade e da articulação dos diferentes níveis e setores de governo. Assim, apenas com a união de esforços conseguiremos erradicar o trabalho infantil!”
DIA 12 DE JUNHO
O dia 12 de junho foi instituído, em 2002, como o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil, pela OIT. A data tem o objetivo de alertar a sociedade, trabalhadores, empresas e governos sobre os perigos deste tipo de trabalho.
A Constituição Federal proíbe que crianças e adolescentes com menos de 16 trabalhem, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. É vedado o trabalho noturno, perigoso ou insalubre antes dos 18 anos. A mesma proibição está na CLT e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O trabalho infantil deve ser denunciado e pode ser feito por canais como Disque 100, no site do MPT, no sistema Ipê de trabalho infantil do Ministério do Trabalho, perante Conselhos Tutelares, Promotorias e Varas da Infância e demais órgãos integrantes do Sistema de Garantia de Direitos.
PERNAMBUCO
Segundo dados do projeto Criança Livre de Trabalho Infantil, em 2019, 64.980 crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade estavam em situação de trabalho infantil no Estado de Pernabuco. Tendo em vista, que a estimativa populacional de pessoas na faixa etária de 5 a 17 anos no estado era de 1.875.814 no mesmo ano, o universo de crianças e adolescentes trabalhadores equivalia a 3,5% do total de crianças e adolescentes do estado.
As crianças e adolescentes trabalhadoras em Pernambuco dedicaram 16,9 horas de seu tempo em atividades laborais em 2019. Em relação ao trabalho infantil no Estado, 47,0% das crianças e adolescentes de 5 a 17 anos exerciam alguma das piores formas de trabalho infantil nos termos da lista TIP, percentual equivalente a 30.521 crianças e adolescentes. Por sua vez, do total de adolescentes de 14 a 17 anos ocupados, 95,6% (ou 49.469) eram informais.
Ainda em 2019, as crianças e adolescentes trabalhadores em Pernambuco empenharam 16,9 horas de seu tempo em atividades laborais. Em relação ao trabalho infantil no Estado, 47,0% dos individuos de 5 a 17 anos exerciam alguma das piores formas de trabalho infantil nos termos da lista TIP, o equivalente a um percentual de 30.521 crianças e adolescentes.
O número total de crianças e adolescentes empregados é de 48.762 (75%) meninos e 16.219 (25%) meninas. Em termos de idade, 5,4% (3.492 pessoas) têm 5-9 anos, 15,0% (9.736 pessoas) têm 10-13 anos e 27,0% (27,0%) têm 14-15 anos de idade (17.547 pessoas). 52,6% (34.205) entre os 16-17 anos. Do total de crianças trabalhadoras, 23,7% (15.412) eram não negras e 76,3% (49.569) eram negras, enquanto 50,3% (32.701) das crianças e adolescentes empregados no meio rural eram negros e 49,7% (32.280 pessoas) viviam em áreas urbanas.
Ocupacionalmente, a maioria das crianças e adolescentes de Pernambuco nessa situação eram ‘trabalhadores elementares da construção de edifícios’, sendo que esta ocupação representa 9,2% (5.957 pessoas) das pessoas de 5 a 17 anos; sendo seguida por ‘confecção de artigos do vestuário e acessórios, exceto sob medida’ 6,6% (4.298 pessoas) e ‘manutenção e reparação de veículos automotores’ 5,0% (3.261 pessoas).
Para a procuradora do Trabalho e coordenadora regional de Combate ao Trabalho Infantil e de Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes (Coordinfância), Jailda Pinto, esses números são ainda maiores. “A subnotificação é uma realidade muito latente quando se fala em trabalho infantil. Ao longo dos anos, a sociedade internalizou como algo normal a presença de crianças e adolescentes como vendedores ambulantes, limpando carros nos semáforos, ou fazendo transporte em feira livres, o famoso frete. Porém, não é algo normal. Crianças e adolescentes, são seres em condição peculiar de desenvolvimento, e devem passar por esse período de formação em casa, com as suas famílias, ou na escola, praticando esportes, recebendo a educação formal, assim como se relacionando com outros da mesma idade e aprendendo sobre cultura e artes” pontou Jailda Pinto.
“Neste mês de junho, bem como em todos os outros meses do ano, vamos juntos combater o trabalho infantil. Família, sociedade, órgãos públicos e rede de proteção juntos conseguiremos pensar formas de prevenir e reduzir casos de exploração da força de trabalho infantil” conclui a coordenadora da Coordinfância.