OPINIÃO: E a Celpe, hein?

Por HEITOR SCALAMBRINI COSTA*

A privatização da Celpe em fevereiro de 2000 foi um verdadeiro engodo. A justificativa dada à população por aqueles que estavam no poder na época, e que são oposição hoje, e por aqueles que eram oposição na época e que estão no poder hoje, para a transferência da companhia para o setor privado, foi de que a tarifa da energia cairia, e o serviço oferecido seria de melhor qualidade. Além de propagandearem que os recursos obtidos pela venda seriam aplicados em benefício da população. Pois bem, nem se viu a redução das tarifas – ao contrário, elas aumentaram vertiginosamente – e a qualidade do serviço deteriorou, conforme atestam os indicadores medidos pela própria Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). E nem claramente a população viu os resultados concretos da aplicação dos 1,7 bilhão de reais apurados com a venda da empresa.

Enfim, o que se constatou ao longo destes 13 anos de privatização foi mostrado nos balancetes anuais divulgados pela companhia. Os lucros líquidos subiram de elevador, muitos além dos aumentos salariais e da realidade econômica do Estado. O que foi suficiente para, após cinco ou seis anos da privatização, a soma dos lucros anuais suplantar o valor pago no leilão da venda, em que um único interessado participou. Recorde mundial de retorno do investimento neste tipo de empreendimento.

Enquanto os lucros aumentavam ano a ano, os consumidores cativos da empresa viram a qualidade dos serviços se deteriorarem. Isso acabou fazendo com que a empresa ficasse conhecida pela população como “vagalume”. O órgão que deveria fiscalizar essa ação danosa e ilegal praticada contra os consumidores, a Agência de Regulação de Pernambuco (Arpe), uma autarquia especial vinculada ao gabinete do governador, não cumpriu sua missão, prevaricando. Por anos seguidos o Tribunal de Contas do Estado (TCE) apontou para o governo estadual as inúmeras deficiências do órgão. Mas nada foi feito. O governo prevaricou.

Enquanto o poder público se exime de suas responsabilidades, a população pernambucana de uma forma geral (não somente os consumidores) sofre as mazelas de uma empresa privada que obteve a concessão de explorar um serviço essencial por 30 anos, com regras contratuais definidas: o fornecimento de energia elétrica.

No mês passado, no Recife, a morte de um cidadão de classe média eletrocutado por um fio energizado, que ficou desprendido de um poste de propriedade da Celpe por mais de uma semana, conforme relatos da vizinhança, mais uma vez mostrou o completo desrespeito da empresa com a população pernambucana. Não somente pela falta de reparos na instalação, o que poderia ter evitado a tragédia, mas pelas declarações oficiais diante do ocorrido e pelas suas atitudes, demonstrando o quanto se considera acima da lei.

Diante da indignação e dos protestos, a Arpe, querendo mostrar serviço e se livrar da pecha de incompetente e de cúmplice da Celpe, anunciou que a morte do cidadão em questão não era a única, e que somente no ano anterior 31 pessoas no Estado morreram eletrocutadas.

Diante desse anúncio, a Celpe passou para as páginas policiais. Todavia, nada de concreto – nem judicialmente, nem criminalmente e nem administrativamente – ocorreu. O que vimos foi um conjunto de ações desacreditadas pela opinião pública. Uma CPI foi convocada pela Câmara do Recife, entre tantas outras audiências publicas já realizadas naquela Casa sobre os péssimos serviços prestados, mas não resultou em nada. Uma multa foi aplicada pela Arpe/Aneel contra a empresa, das tantas outras já aplicadas, e que as brechas na legislação permitem que os advogados da companhia protelem “ad infinitum” o pagamento. Também foram convocados pela Comissão de Minas e Energia da Câmara Federal os diretores da empresa para as devidas explicações que, como sabemos, não resultarão em grande coisa para a mudança da conduta da empresa frente as suas obrigações contratuais.

Portanto, é previsível afirmar que “tudo continuará como Dante no quartel de Abrantes”. Mas existe um caminho que poderá mudar esse quadro, que é o da mobilização, da pressão popular. Não se iluda, pois esse é o caminho para que sejamos respeitados como cidadãos/consumidores. É o que as manifestações de rua em todo o Brasil exigem hoje: melhorias nos serviços públicos oferecidos à população na saúde, na educação, no transporte e no fornecimento de energia.

É daí que pode sair a solução do problema, pois o povo não se deixará enrolar.

* Heitor Scalambrini Costa é professor da Universidade Federal de Pernambuco

OPINIÃO: Mídia será alvo das manifestações

Por PEDRO CARDOSO DA COSTA*

Alguns segmentos sociais precisam entrar em consonância com a sociedade brasileira. Um desses é a mídia brasileira, em especial os canais de televisão aberta.

Na cobertura das manifestações era claro o viés para desmoralizá-las, quando tratava de forma generalizada como vândalos, baderneiros e depredadores, cujos adjetivos visavam enfraquecer os movimentos. Outro posicionamento que deixava isso muito claro era responsabilizarem os manifestantes pelo início dos incidentes contra a Polícia Militar.

Essa cobertura tendenciosa continua com as tais respostas das autoridades às reivindicações. As matérias são sempre narrativas, sem qualquer análise técnica para comprovar a viabilidade dos delírios das autoridades.

Quando o Supremo Tribunal Federal – STF – mandou prender o deputado Natan Donadon, ninguém se dignou a questionar o relator ou presidente da Corte por que a prisão só ocorreu três anos depois da condenação e logo após a insurgência nacional. Além disso, nenhuma pesquisa é feita para averiguar os muitos processos contra parlamentares que continuam mofando nos escaninhos dos tribunais brasileiros.

Mesmo conclamando por melhor qualidade na saúde e educação e maior segurança, a resposta federal girou em torno da reforma política. Todos aceitaram como se fosse algo sério e não disseram uma vírgula no que isso melhoraria nessas áreas. Também não se compreende por qual motivo não há uma menção à extinção do voto obrigatório. Não há questionamento sobre o fato das medidas só trazerem resultados para prazo longínquo, quando a necessidade é para ontem. Nada, absolutamente nada, está sendo feito para melhorar essas três maiores reivindicações imediatamente. O resultado mais próximo seria o trabalho compulsório por dois anos para os alunos de medicina que ingressarem a partir de 2015 nas faculdades. Ou seja, no mínimo teria início em seis anos. Até lá milhares já morreram sem atendimento nas filas.

A cereja desse bolo de embromação foi a aprovação de uma emenda constitucional para a retirada do segundo suplente de senador. Não há registro na história de que um segundo suplente tenha ocupado a vaga de senador, já que para isso teria que saírem o titular e o primeiro suplente. Mas essa enganação conseguiu até manchete de primeira página do jornal O Estado de S. Paulo sobre a retirada do segundo suplente, que, numa análise séria, traz zero de benefício à população.

Muitos apresentadores de televisão instigam a violência policial. José Luiz Datena, um verdadeiro camaleão nas suas posições, lidera com a frase matreira de que a “cobra vai fumar”, numa alusão explícita à truculência policial. Quando vier a revanche, eles não vão se lembrar do telhado de vidro. Assim como os políticos, a mídia, liderada pela Rede Globo, está atravessada na garganta da sociedade brasileira. Nas manifestações anteriores muitos jornalistas já foram hostilizados, e se a mídia não encontrar o rumo certo de fazer jornalismo, a “cobra vai fumar” nos próximos protestos.

* Pedro Cardoso da Costa é bacharel em direito

 

OPINIÃO: Trabalho no SUS, contrapartida da universidade pública

Por EMIR SADER*

Os cursos de medicina são os mais elitistas, aquele onde nem mesmo a política de cotas conseguiu superar a composição quase que na sua totalidade de jovens provenientes da burguesia ou da classe média alta, branca.

São os mais concorridos, aqueles com relativamente menos vagas, que exigem maior preparação e que impõem dedicação exclusiva ao longo dos seus seis anos. Além de requerer muitos livros caros. As universidades públicas são, de longe, as melhores.

Assim, um número relativamente pequeno de pessoas tem acesso a esses cursos, gratuitamente. As famílias com maior nível de renda prepararam seus filhos de todas as formas, valendo-se do seu poder aquisitivo para prepará-los nas melhores condições para ingressar nas universidades públicas. Isso acontece de forma mais flagrante nos cursos de medicina.

Esse privilégio tem que ter contrapartidas para a sociedade, especialmente para aqueles setores que, mesmo pagando impostos, não podem ver seus filhos ingressarem nos cursos de medicina e ainda têm que sofrer as dificuldades de atendimento do SUS.

A decisão do governo de agregar dois anos na carreira de medicina com trabalho no SUS vai na direção correta de estabelecer contrapartidas dos que têm acessos a esses cursos para o conjunto da sociedade.

Haverá muita choradeira, como tem havido em relação à vinda de médicos estrangeiros. Considerarão uma violação ao “direito inalienável” de fazer os melhores cursos de medicina em universidades públicas sem nenhuma contrapartida social. Dirão que “já pagam impostos” para a educação pública, que conseguiram seus lugares na universidade por méritos próprios. Que têm o direito de trabalhar onde bem entender, quando quiserem.

A decisão do governo fortalece a esfera pública, tanto na esfera educacional, como na de saúde pública. É uma decisão que necessita da mobilização e do apoio de todos – estudantes, médicos, profissionais de saúde em geral, cidadania. É um critério que tem que se estender para o conjunto das políticas governamentais – as contrapartidas sociais.

* Extraído do Blog do Emir

OPINIÃO: Novas ações em defesa das mulheres

Por ARMANDO MONTEIRO*

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Violência contra a Mulher, criada pelo Congresso Nacional e da qual tive a honra de participar, aprovou no último dia 4 o seu relatório final, após mais de um ano de intenso trabalho.

Deputados federais e senadores percorreram 17 Estados brasileiros e o Distrito Federal para investigar casos de violência e apurar denúncias de omissão do poder público na proteção às mulheres.

O relatório final, que conta com mais de mil páginas, consubstancia o terrível quadro existente em nosso país. Os dados indicam que, nos últimos 30 anos, mais de 90 mil mulheres foram assassinadas no Brasil, 43,5 mil somente na última década. Dentre 84 países, ocupamos a 7ª posição, com taxa de 4,4 homicídios em 100 mil mulheres.

Para a CPMI, ficou clara, ao fim dos trabalhos, a inexistência ou a ineficácia das políticas públicas de enfrentamento à violência contra mulheres. Esse exaustivo trabalho resultou na formulação de 69 recomendações gerais aos governos federal, estaduais e municipais; ao Judiciário; ao Ministério Público; às Defensorias Públicas; e às Assembleias Legislativas. Teve, ainda, o mérito de analisar o panorama de cada Unidade da Federação e formular propostas específicas a cada uma delas.

O grupo de trabalho sobre legislação da CPMI estudou também, em conjunto com representantes da sociedade, mais de 50 projetos em tramitação no Congresso Nacional. A partir daí, propôs mudanças nas legislações penal; processual penal; de seguridade social; sobre educação; na Lei de Tortura; e na Lei Maria da Penha.

Uma recomendação significativa feita foi a tipificação do feminicídio como circunstância qualificadora de homicídio. No total, foram propostos 13 projetos de lei e um projeto de resolução.

Apenas a passagem da CPMI pelas Unidades Federadas foi suficiente para gerar efeitos positivos nessa luta. Varas judiciais de violência doméstica e familiar foram criadas em Minas Gerais, Paraná, Mato Grosso do Sul e Pernambuco, onde foi aberta, também, uma câmara técnica para análise dos casos dessa natureza.

Ao nosso Estado, que ocupa o 10º lugar no Brasil no ranking de violência contra as mulheres, a Comissão fez 21 recomendações específicas, como a implementação de mais Delegacias da Mulher; a ampliação das políticas e dos equipamentos para que cheguem às mulheres da Zona da Mata, Agreste e Sertão, bem como às quilombolas; e a criação de mais Juizados Especializados de Violência Doméstica; de Promotorias e de Defensorias da Mulher.

Com os resultados dessa CPMI, o Congresso Nacional oferece ao nosso país uma contribuição significativa no combate a essa chaga social tão alarmante para a nossa sociedade, que é a violência contra a mulher.

* Armando Monteiro (PTB) é senador por Pernambuco