Por Menelau Júnior
Não adianta mais resistir: a palavra “sofrência” ganhou a boca do povo. A razão, ao que parece, é um estilo musical cujo principal representante atende pelo nome de Pablo. Seus shows são vendidos com a ideia de que é “100% sofrência”. As músicas, claro, são bregas até onde isso é possível. Há quem goste, claro.
Esta semana, duas pessoas me procuraram perguntando se “sofrência” existe. Minha resposta foi simples: se está aí, já existe. Quanto ao fato de essa palavra estar dicionarizada, então a resposta é “não”.
A questão é que “sofrência” surgiu para substituir “sofrimento”. Não sei quem inventou a danada, mas o Pablo está fazendo sucesso na moda dos “sofrentes”. Ah, achou estranha a palavra “sofrente”? Pois é justamente por causa dela que “sofrência” não está nos dicionários – pelo menos ainda.
Em português, temos muitas palavras terminadas em “-ência”: paciência, demência, insistência, incoerência, conveniência. Se você parar para pensar, verá que todas vêm adjetivos terminados em “-ente”: paciente, demente, insistente, incoerente e conveniente.
E aí entra a questão de “sofrência”. Seguindo a lógica da língua, “sofrência” seria natural se houvesse a palavra “sofrente”. O problema é que aquele que sofre é chamado de “sofredor”. E desta palavra vem “sofrimento”.
Essas palavras novas – chamadas de neologismos – surgem naturalmente, mas só acabam existindo nos dicionários quando passam do estágio do modismo. Foi assim com “imexível”, usada por um ministro de Collor no início da década de 90 e que hoje consta nos dicionários. Por enquanto, “sofrência” não passa disso: um modismo criado para designar certo gênero musical de gosto duvidoso. Se alguém está sofrendo muito, está passando por sofrimento, e não por “sofrência.
Menelau Júnior é professor de português