Depois de semanas de muita controvérsia e confusão, a novela da mal intitulada reforma política conseguiu enfim completar um capítulo inteiro na Câmara. Na última quinta-feira (21), deputados aprovaram aos trancos e barrancos, em dois turnos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 282/2016, que dispõe, entre outras coisas, sobre coligações partidárias e cláusulas de desempenho. Ainda restam destaques supressivos pendentes de análise do plenário, em votação que terá início às 11h30 de terça-feira (26).
Mas outro folhetim será reprisado na Casa em meio às tentativas de avanço na pauta: a tramitação da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer, agora por organização criminosa e obstrução à Justiça, enredo que reabre o balcão de negócios do Planalto com o Congresso e dá margem a todo tipo de acerto – leia-se, liberação de verbas e distribuição de cargos.
E a peça acusatória, apresentada por Rodrigo Janot em seus últimos dias como procurador-geral da República, já chegou suscitando questionamentos, com promessa de muita disputa teórica. A questão é que a denúncia também inclui os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria Especial de Governo) no quesito organização criminosa, e a dúvida é se a análise e posterior votação deve considerar o conjunto da acusação ou um frações dela, separando-se o caso de Temer dos outros dois peemedebistas. Tendo chegado à Câmara na última quinta-feira (21), o documento primeiro tem que ser lido em plenário e, com a devida notificação à Presidência da República, levado ao exame da Comissão de Constituição e Justiça.
Será seguido o mesmo rito da primeira denúncia, barrada em 2 de agosto depois que Temer colocou a caneta – e a máquina pública – para funcionar e assegurar votos. Espera-se que na sessão plenária de amanhã (segunda, 25), ou no dia seguinte, esse processo tenha início formal na Câmara. E que, nos próximos dias, a torneira do orçamento comece a vazar para além do natural: segundo o jornalista Josias de Souza, o montante inicial da liberação de emendas orçamentárias para aliados, com o objetivo de interromper a segunda denúncia, será de R$ 1,02 bilhão. “Mas os aliados de Temer acharam pouco. Realçam que o enterro agora será coletivo: além das acusações contra o presidente, terão de sepultar imputações dirigidas a dois ministros palacianos: Eliseu Padilha e Moreira Franco. Pior: o Planalto exige que a lápide desça sobre a cova tripla numa única votação”, diz Josias.
Como complicador, Temer tem a sinalização do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), de que o jogo na base aliada será ainda mais difícil do que tem sido. Na última semana, depois de outras duas semanas de silêncio, Maia externou em alto e bom som, em rápida visita ao plenário como presidente da República em exercício, o descontentamento de seu partido, o Democratas, com o fato de o PMDB lhe ter surrupiado parlamentares propensos em mudar de partido.
Enquanto Temer estava em encontro de chefes de Estado na Organização das Nações Unidas (ONU), em Washington (EUA), Maia jantava com adversários como os senadores Kátia Abreu (PMDB-TO) e Renan Calheiros (PMDB-AL) e o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) – amigo e interlocutor frequente de Maia, Orlando tem dito que a sorte de Temer é que Maia não vai conspirar para derrubá-lo. Até o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), leal correligionário do presidente e a quem cabe tocar as pautas do Congresso (como a votação de vetos e as promulgações), esteve presente em um desses convescotes.
Entre um jantar e outro, Maia fez duras críticas ao comando do PMDB, na pessoa de seu presidente nacional, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), e aos próprios ministros Eliseu e Moreira Franco – este, casado com a mãe da esposa do presidente da Câmara, Patrícia Vasconcelos Maia. “Nós queremos saber qual é a verdadeira posição do PMDB e do governo em relação ao Democratas. Tem parecido um tratamento de adversário. Espero que não vire uma relação entre inimigos”, advertiu o deputado.