Os desafios ambientais que enfrentamos atualmente exigem ações concretas de todos os setores da sociedade, e os municípios têm um papel fundamental nesse processo. O conceito de “lixo zero” é uma dessas iniciativas que, mais do que um objetivo, representa uma mudança profunda na forma como nos relacionamos com o que consumimos e descartamos. Adotar o lixo zero não é apenas uma questão de gestão de resíduos, mas sim uma oportunidade para repensarmos os modelos de produção, consumo e descarte que historicamente deixaram marcas profundas no meio ambiente.
Quando falamos em lixo zero, estamos nos referindo a minimizar ao máximo os resíduos destinados a aterros e incineradores, priorizando a redução, a reutilização e a reciclagem. Isso exige comprometimento e criatividade, tanto por parte das administrações municipais quanto da população. Afinal, de nada adianta políticas públicas inovadoras se não forem acompanhadas por uma mudança cultural que envolva todos os cidadãos.
Um ponto que merece destaque é o aproveitamento do gás metano gerado pela decomposição de resíduos orgânicos em aterros sanitários. Normalmente, esse gás é liberado na atmosfera, contribuindo significativamente para o aquecimento global. No entanto, com a tecnologia certa, ele pode ser capturado e utilizado de forma eficiente. Muitos municípios têm a oportunidade de transformar esse passivo ambiental em uma fonte de energia renovável e até mesmo em receita.
Ao investir em usinas de biogás, os municípios conseguem capturar o metano e utilizá-lo para abastecer órgãos públicos, como escolas, hospitais e repartições, reduzindo custos com energia e ampliando a sustentabilidade no funcionamento dessas estruturas. Além disso, o gás excedente pode ser comercializado, gerando renda para o município e estimulando a economia local. Trata-se de um exemplo claro de como o compromisso com o lixo zero e o carbono zero pode trazer benefícios econômicos concretos.
Um dos pilares dessa transformação é o planejamento urbano integrado. Municípios que abraçam a pauta do lixo zero tendem a investir em programas de coleta seletiva eficientes, além de fomentar parcerias com cooperativas de catadores e estimular a compostagem doméstica e comunitária. Mas o trabalho não para aí. É essencial educar a população sobre a importância dessas práticas e oferecer ferramentas para que sejam adotadas no dia a dia. Muitas vezes, as pessoas têm boa vontade, mas falta informação ou acesso aos recursos necessários.
Outro aspecto importante é a conexão entre a ideia de lixo zero e os compromissos relacionados ao carbono zero. Ao reduzir resíduos, automaticamente diminuímos as emissões de gases de efeito estufa associadas à decomposição de materiais orgânicos em aterros ou à incineração de resíduos. Além disso, práticas como a compostagem ajudam a regenerar o solo e contribuem para a captura de carbono, reforçando um ciclo virtuoso que beneficia o planeta como um todo.
É inspirador ver como algumas cidades ao redor do mundo já estão liderando esse movimento. Cada caso nos ensina que, embora os desafios sejam grandes, as soluções são possíveis e, muitas vezes, simples. Pode ser por meio da substituição de plásticos descartáveis por alternativas biodegradáveis, do incentivo a feiras livres que funcionem sem embalagens ou da criação de pontos de troca de materiais reutilizáveis.
No fundo, a caminhada rumo ao lixo zero é também uma jornada de reconexão com nossos valores. Estamos falando de criar comunidades mais conscientes e solidárias, que enxerguem o lixo não como um problema isolado, mas como um reflexo de como vivemos e consumimos. Trata-se de entender que cada escolha importa e que, juntos, podemos construir um futuro mais limpo e justo. Os municípios que liderarem essa mudança estarão não apenas cumprindo seu papel institucional, mas inspirando uma transformação que tem o potencial de alcançar cada canto do planeta.
Marcelo Augusto Rodrigues, é advogado especialista em direito ambiental e urbanístico, ex-Secretário de Meio Ambiente do Recife, e sócio proprietário do escritório de advocacia Marcelo Rodrigues Advogados. Estudante de Botânica.