O diagnóstico de câncer quase sempre vem acompanhado por uma série de fortes e contraditórios sentimentos. Além do medo inicial e dos impactos emocionais, surgem dúvidas sobre as formas de tratamento e seus efeitos colaterais. Especialmente no caso das mulheres, um dos aspectos mais temidos é a perda de cabelo ocasionada por alguns medicamentos quimioterápicos.
“Essa aflição, muitas vezes, se sobrepõe aos resultados positivos das terapias e pode significar uma derrota na batalha pela autoestima. Estresse e depressão são consequências não raras entre as pacientes. Por isso, é preciso garantir não apenas que seja realizado o acompanhamento da condição patológica, como também atentar aos aspectos psicológicos e oferecer ao paciente um olhar complementar sobre os diferentes impactos que a doença traz para a sua vida”, explica Dr. Jean Pereira, do CPO Paraíba, unidade Oncoclínicas no estado.
Uma boa notícia é a utilização, cada vez mais frequente, da crioterapia capilar. O procedimento consiste no uso da chamada Touca Inglesa, sistema de resfriamento controlado do couro cabeludo que reduz o fluxo sanguíneo nos folículos capilares e diminui a absorção dos fármacos na região. Desta forma, ele aumenta as chances de preservação dos fios durante a quimioterapia e tem sido considerado importante aliado na manutenção do equilíbrio emocional de pacientes com câncer.
“Quando a quimioterapia é aplicada, pode acontecer um dano no folículo capilar, dependendo da ação da droga indicada para cada caso, o que faz o cabelo cair. A técnica da crioterapia capilar – que não pode ser confundida com terapia, uma vez que previne única e exclusivamente a queda dos cabelos – consiste no uso de uma touca refrigerada automaticamente, que resfria o couro cabeludo, levando à contração dos vasos sanguíneos e cria uma espécie de capa protetora que preserva esses folículos capilares”, diz o médico.
Ainda de acordo com o especialista, o tratamento com a Touca Inglesa pode ser aplicado em pacientes diagnosticados com todos os tipos de tumores sólidos. A taxa de sucesso depende do tipo de medicação administrada, 50% para as mais fortes e até 92% nas menos agressivas e a sensação de frio foi tolerada por 98% dos pacientes. Mas há restrições. “A contraindicação é para pacientes com câncer hematológico (que afeta o sangue), como leucemia e linfoma. Pessoas que apresentam alergia no couro cabeludo também não devem passar por esse processo”, ressalta.
No Brasil, desde 2013, já foram realizadas cerca de 80 mil sessões nos principais centros de referência e hospitais de 15 estados brasileiros, além do Distrito Federal. O sistema, criado no Reino Unido pela empresa Paxman, é o único no Brasil com certificação da FDA (agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA) e registrado na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Uma importante novidade foi divulgada pela NATIONAL COMPREHENSIVE CANCER NETWORK — NCCN, com impacto direto para pacientes de câncer de mama. O uso da crioterapia capilar, por meio da Touca Inglesa, agora faz parte das Diretrizes de Prática Clínica em Oncologia da NCCN para pacientes que vão iniciar o tratamento para câncer de mama. A inclusão foi publicada na atualização 2019.1 da NCCN. A novidade reforça a importância e consequências da possibilidade de manutenção dos cabelos durante a quimioterapia.
“Pacientes oncológicos experimentam no dia a dia todos os tipos de dor, física e psicológica. Assim, ao evitar a perda total dos fios, a crioterapia devolve qualidade de vida a pacientes, impactando positivamente no tratamento. Nos consultórios, é notável a melhora física e psicossocial de pacientes que conseguem manter os fios, o que gera mais confiança e segurança em relação ao tratamento e melhora os resultados. A crioterapia tem sido considerada, portanto, uma verdadeira aliada no tratamento oncológico”, pontua o Dr. Jean.
Vale lembrar que a cada ano são registrados cerca de 600 mil novos casos de câncer no Brasil, conforme dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA). Na Paraíba, a expectativa é que até o final de 2019 sejam registrados mais de 9 mil novos casos da doença.
O passo a passo da crioterapia
Cerca de 30 minutos antes da infusão dos medicamentos, o paciente veste uma touca anatômica que fica conectada diretamente ao sistema de resfriamento.O processo de resfriamento do couro cabeludo possui temperatura em torno de 4ºC negativo e é mantido durante toda a sessão de quimioterapia e continua até uma hora e meia após o termino dela, dependendo do protocolo adotado. “Esse resfriamento do couro cabeludo permite menor absorção dos medicamentos nessa região, já que diminui o fluxo sanguíneo nos folículos capilares e assim evita – ou reduz – a perda dos fios”, analisa o oncologista do CPO PB.
A resposta, mesmo em pacientes que fazem uso de medicamentos com alto potencial de agressão, é observada como sendo altamente positiva pelo especialista. “Para nós, sucesso é quando não há necessidade de usar uma peruca, lenços ou de raspar a cabeça”.