Falta de impessoalidade

João Américo

A atividade administrativa pressupõe a adoção de diretrizes, padrões comportamentais, respeito e obediência às normas e procedimentos. Nesse sentido, todos aqueles que querem abraçar a vida no serviço público, ou seja, o corpo de agentes públicos que compõem os órgãos superiores ou dirigentes (aqueles indicados pela própria CF e que detêm o poder de tomada de decisões de políticas públicas), não podem esquecer de ter como liturgia sacramental o artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil, notadamente no que diz respeito à tratativa com os administrados, qual seja, a impessoalidade.

A política produz disfunções e distorções orgânicas ao modelo ideal no que diz respeito à norma edificante e balizadora dos comportamentos exigíveis dos administradores. Nos governos Estaduais e Federal a impessoalidade passou a largo.

Caruaru produz a maior festa do interior do Estado, o São João, e para este grandioso evento, o Governador do Estado, agente público, destinou o valor de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais).

Se comparamos outro evento de grande magnitude, também no agreste, o Festival de Inverno de Garanhuns, o Governo Estadual apresentou como investimento a quantia de R$ 8,5 milhões.

A equação está posta. Uma desavença política entre a Prefeita Raquel Lyra e o Governador Paulo Câmara fez quebrar a lógica jurídica da impessoalidade. O caráter analítico e não sintético do constituinte que preferiu consignar como elemento central vários princípios, dentre eles o da impessoalidade, não foi observado. A encarnação máxima de que o poder não pode ser posto a serviço dos aliados, amigos, ou ao bel prazer de quem ocupar o cargo de chefia, encontra-se, como dito, enclausurado na regra da a impessoalidade, traduzida na própria natureza da atividade gerencial das coisas alheias (res publica, coisa pública), o que infelizmente não foi observado pelo Governador. A destinação de baixo investimento para Caruaru aliado a sua ausência na festa, mitiga esse princípio caro, que deveria ter sido observado.

Agindo da mesma forma, só que de maneira mais tosca, o Presidente da República, referindo-se ao Governador do Estado do Maranhão, proferiu palavras de cunho discriminatório incompatíveis com o cargo de Presidente, quando cunhou a seguinte pérola verborrágica, fruto de uma diarreia oral: “Daqueles governadores de ‘paraíba’, o pior é o do Maranhão; tem que ter nada com esse cara”.

Esqueceu nosso presidente de atender o mega princípio da impessoalidade; o mesmo ingrediente que levou o Governador de Pernambuco a destinar valores incompatíveis com o tamanho da festa do São João de Caruaru, qual seja, divergências políticas irreconciliáveis, desta vez protagonizadas pelos Governadores do Estado com o Presidente, levaram o mesmo a proferir tamanho impropério.

Só que existe uma diferença comportamental digna de nota entre os dois, o último, qual seja, o Presidente, compreendeu a sua falta, e logo destinou tempo para desfazer o mal estar. Veio para o Nordeste, onde deixou claro, em palavras, seu amor pela região, e disse “eu amo o nordeste”. Esperamos, pois, que esse amor seja vertido em recurso, investimentos e obras.

O Governado do Estado de Pernambuco, bem que poderia se espelhar na atitude de Bolsonaro e dizer “eu amo Caruaru”, e adotar medidas que demonstrassem esse amor.

Que a impessoalidade supere as diferenças políticas.

João Américo é advogado é assessor jurídico da Câmara de Vereadores de Caruaru

Natural do Rio de Janeiro, é jornalista formado pela Favip. Desde 1990 é repórter do Jornal VANGUARDA, onde atua na editoria de política. Já foi correspondente do Jornal do Commercio, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e Portal Terra.

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