No dia 20 de março, teve início, no município de Belo Jardim, a 180 km do Recife, a Residência ‘Belojardim’ (Ciclo de exposições artísticas em Belo Jardim), promovida pelo Instituto Conceição Moura. O projeto, que tem curadoria de Cristiana Tejo e Kiki Mazzucchelli, começa com a residência de dois meses do artista Marcelo Silveira na cidade. A ideia geral é levar artistas contemporâneos periodicamente para o município, estimulando o contato entre a população da cidade e as artes visuais.
Segundo Mariana Moura, presidente do Instituto Conceição Moura, há uma aposta no poder da arte em trazer novas perspectivas e ampliação da visão das pessoas sobre a própria vida e em sua possibilidade de arte e artista serem agentes de provocação para instigar no público o questionamento de velhos paradigmas. “Nossa proposta é a arte na vida das pessoas, em seu dia a dia, sem situações ou cenários especiais. O legado esperado é o que fica em cada sujeito que participa das experiências propostas. O que se deixa em Belo Jardim é a possibilidade de que qualquer lugar pode ser um centro de produção de arte contemporânea e pensamento crítico, que isto não se restringe aos grandes centros”, detalha.
Com curadoria de Cristiana Tejo e Kiki Mazzucchelli, a Residência ‘Belojardim’ é um programa de longo prazo que busca incentivar discussões em torno do significado sociocultural do termo Nordeste e do legado da arte popular da região nos dias de hoje, a partir da experiência in loco no município de Belo Jardim. A cada ano, um(a) artista será convidado a residir na cidade por um período de dois meses, desenvolvendo projetos especialmente comissionados para o contexto local. A Residência Belojardim prevê ainda uma série de eventos paralelos que serão idealizados em diálogo próximo com a proposta dos artistas residentes, podendo incluir desde conversas, performances, projeções de filmes, workshops, entre outros.
“Temos interesse em gerar uma aproximação de longo termo com um lugar como Belo Jardim através da arte contemporânea. Temos especial atenção na reflexão contemporânea sobre um pensamento gerado desde o início do século XX sobre a relação cultura popular e cultura erudita, artesanato e arte, artesanato e design. Esperamos ir observando no contexto de Belo Jardim como questões como estas se desenvolvem e se atualizam, aprendendo com o público e com o artista”, detalha Cristiana Tejo.
Durante sua temporada na cidade, Marcelo Silveira apresentará oito obras e, a cada semana, uma delas entrará em destaque. O artista vai transformar a antiga fábrica de doces Mariola em seu ateliê. É lá que, semanalmente, ele promoverá encontros com grupos diversos da cidade para um almoço. A ideia é que a obra da semana, sua poética, suas reflexões possam pautar as conversas. “É na mesa que surgem as melhores conversas, por isso nossa proposta de reunir as pessoas em torno dela. O foco não é a comida, ela é um acessório dentro do processo”, explica.
Segundo ele, o ateliê belo-jardinense estará aberto para receber os interessados em estabelecer diálogos. Silveira cultiva uma especial preocupação com a necessidade de fomentar pactos, trocas, conversas. “Para mim, a obra de arte só está completa quando entra em contato com o público. Temos que falar para além dos nossos pares, por isso imaginamos esse formato para a residência”, pontua.
O artista pretende lançar um olhar sensível sobra a cidade, encontrando beleza e estética em locais e práticas que talvez passem desapercebidos no dia a dia. Ele lembra que a própria paisagem do semiárido não é vista com frequência como algo bonito e rico. “Acho que valorizar esses elementos estéticos que estão no município ajudará a integrar a população ao projeto, envolvendo a cidade”, afirma o artista.
A passagem das obras pela cidade e parte das conversas à mesa serão registradas em vídeo e também vão gerar textos que serão disponibilizados num blog criado especialmente para a residência. Além disso, ao final, as curadoras irão organizar uma publicação impressa que vai se desenhar ao longo das próximas semanas.
O projeto Residência Belojardim (Ciclo de exposições artísticas em Belo Jardim), coordenado pela produtora Automática, do Rio de Janeiro, se insere no Circuito Cultural promovido pelo Instituto Conceição Moura em Belo Jardim, que tem como objetivo dinamizar a programação cultural local e regional, com a oferta de festivais, oficinas de formação e residências artísticas, ao longo do ano. A programação do Circuito Cultural busca envolver e valorizar os talentos do município e da região, fomentando a cultura como parte estratégica da formação dos cidadãos e cidadãs belo-jardinenses, e, ao mesmo tempo, como atividade econômica e profissional.
O Artista
Marcelo Silveira produz trabalhos com repercussões tanto no campo da escultura quanto dos objetos apropriados. Com sua hibridez local, o trabalho do artista ocupa um espaço entre: metade dentro e metade fora do museu. A acumulação é uma das suas estratégias favoritas: objetos reminiscentes de aparelhos domésticos descaradamente esvaziados de qualquer uso funcional, mas que parecem carregar significados; esferas feitas de vários materiais e tamanhos diversos, imóveis, como se esperassem algum evento anunciado; centenas de objetos de vidro (copos, garrafas ou meros cacos)… Esses objetos convergem nas grandes coleções e livros de artista de Marcelo Silveira. De fato, a idiossincrática organização do artista é fundamental para sua produção, permitindo, por meio de uma certa ordem, que o outro entre no seu trabalho.
Marcelo Silveira nasceu em 1962, em Gravatá, Pernambuco. Vive e trabalha em Recife. Participou da 1ª Bienal Internacional de Artes Plásticas de Buenos Aires, Argentina (2000); da 5ª Bienal do Mercosul, em Porto Alegre, Brasil (2005); da 4ª Bienal de Valência, Espanha (2007); da 29ª Bienal de São Paulo (2010); além das mostras coletivas O Guardião das coisas inúteis (MAMAM, Recife, Brasil, 2014); Além da biblioteca (Frankfurter Buchmesse, Frankfurt, Alemanha, 2013); Coleção Itaú de fotografia brasileira (Instituto Tomie Ohtake, São Paulo, Brasil, 2013; Palácio das Artes, Belo Horizonte, Brasil, 2013); MAC 50: doações recentes 1 (Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil, 2013); Travessias 2 (Galpão Bela Maré, Rio de Janeiro, Brasil, 2013); Nova arte nova (Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro, Brasil, 2009; Centro Cultural Banco do Brasil, São Paulo, Brasil, 2009); Panorama da arte brasileira — contraditório (Alcalá 31, Madri, Espanha, 2008); Geração da virada: 10 + 1 (Instituto Tomie Ohtake, São Paulo, Brasil, 2006). Entre suas exposições individuais recentes estão: Chronos (Galeria Nara Roesler, São Paulo, Brasil, 2012); Arquitetura de interiores (Galeria Nara Roesler, São Paulo, Brasil, 2008); e Marcelo Silveira (Centro Universitário Maria Antônia, São Paulo, Brasil, 2005).