Segundo as estatísticas oficiais, o Brasil tem 19.699 alunos com superdotação ou altas habilidades matriculados na educação básica em todo país, dados do Censo Escolar de 2017. O número representa apenas 0,04% dos mais de 48 milhões de alunos matriculados nesta fase escolar. Em São Paulo, a rede municipal de ensino registrou 42 alunos com esse perfil. Mas será que realmente o país só conta com menos de 20 mil alunos de alto QI?
No início do ano passado, o MEC chegou a anunciar o iniciou de um trabalho para cadastrar crianças com superdotação e altas habilidades no país, mas o projeto ainda está em desenvolvimento. A ideia é de mapear os alunos com este perfil e elaborar um plano adequado para desenvolver o potencial destas crianças.
Fabiano de Abreu, filósofo e membro da Mensa, associação dos maiores QIs do mundo, afirma que os números são baixos pois existe uma subnotificação: “O Ministério da Educação, as escolas não tem programas específicos para identificar e principalmente trabalhar e desenvolver o potencial de crianças com superdotação ou altas habilidades. Isso faz com que muitos jovens que poderiam ter suas habilidades aproveitadas e direcionadas acabam por não serem identificados, notados e acabam em sua maioria sendo desperdiçados”.
O filósofo também destaca que procurou contato com o ministério da Educação para propor maneiras de identificar e apoiar jovens talentos: “ existe um teste que não é o teste de QI, mas um teste de aptidão que informa aonde a pessoa poderá se encaixar melhor no campo profissional. Isso ja é usado na Alemanha e na Suíça com êxito. No pós guerra isso foi fundamental para a Alemanha se tornar a potencia que é hoje. A maioria dos pesquisadores, cientistas e engenheiros dos países desenvolvidos são pessoas que foram trabalhados em escolas especiais à partir da descoberta de suas habilidades desde a infância. Eu gostaria que o MEC me ouvisse porque aí temos argumentos para encontrar novos talentos que irão impulsionar o Brasil”.
Um desses casos é o de Vinícius Raeli Mussauer Portugal Jorge, de apenas 5 anos, que segundo testes realizados pelo Dr. Paulo Mattos, psiquiatra e Doutor em Psiquiatria eSaúde Mental pela UFRJ, tem inteligência acima da média, situando-se entre os 1% de QI mais elevado da população, atingindo percentil 99% nos testes. No entanto, sua mãe, Thais Raeli, relata que os professores confundiam a superdotação e o comportamento excêntrico de Vinícius com autismo: “faço parte de um grupo com mais de 150 mães de filhos com superdotação e todas nós esbarramos no mesmo problema de inclusão. Para começar, escolas particulares que não estão preparadas, depois também tem o custo para conseguir laudos, além da falta de lugares que se possa estimular as habilidades. As pessoas realmente não entendem do assunto. São inúmeras as necessidades e a maioria dos profissionais de educação não sabem nem por onde começar.
As crianças com superdotação passam por tédio, falta de entendimento de regras, que são confundidos com autismo ou déficit de atenção. Também são crianças com um aprendizado acelerado. Se não são devidamente estimuladas, podem ter até depressão, isolamento social ou baixo rendimento”.
Fabiano de Abreu aponta que passou a ser procurado por muitas mães na mesma situação de Thais Raeli após ter divulgados seus resultados do teste de QI, que o apontam como um dos mais inteligentes do mundo, no topo dos 1%: “após ser divulgado meu teste de QI pela imprensa, fui procurado por diversas mães de alunos que se encontram na mesma situação e que não tiveram a devida atenção. Uma delas, mesmo tendo em mãos um teste que constatava sua superdotação, não encontrou apoio e trabalhos direcionados ao seu filho, apenas reclamações por parte da escola que dizia que ele era bagunceiro e disperso em aula. Se fosse feito um trabalho direcionado ele poderia ser um dos grandes profissionais que ajudariam o pais no seu desenvolvimento, mas muitos não sabem distinguir, não percebem”.
Na esperança de ter melhores políticas públicas para alunos com superdotação, pais de alunos com habilidades especiais estão buscando meios de serem ouvidos: “Estamos organizando uma audiência pública na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. O meu tio, Milton Raeli já teve uma audiência pública na ALERJ em 2017 onde foi abordada a necessidade de inclusão das crianças e jovens de altas habilidades, com foco nas famílias carentes. Foi levantado o tema de que se a escola/ sociedade não inclui, muitos podem acabar encontrando o caminho para a criminalidade.
Existem vários modelos de superdotação, que contradizem os estereótipos de habilidades focados somente no universo acadêmico. Até porque o modelo de estudos é desinteressante, ultrapassado. Estamos lidando com a geração dos cibernativos e as escolas não estão acompanhando. Acho que um bom caminho no governo federal pode ser a primeira-dama, que já está envolvida com a causa da inclusão”, conta Thais.