Pesquisa propõe modelo para acompanhar e prever a disseminação da Covid-19 no país, com foco no interior

A pesquisa científica brasileira continua dando sua contribuição para o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. É o caso de um projeto da Universidade Federal de Viçosa (UFV), encabeçado pelo pesquisador Sílvio Ferreira, que criou um modelo para acompanhar e prever a disseminação da Covid-19 pelo país, principalmente em cidades do interior. 

De início, o objetivo do professor de física era mapear a onda de propagação do novo coronavírus pelo país, ou seja, ver onde ela começou e em quanto tempo e com que intensidade chegaria em outros locais. A pesquisa evoluiu e, agora, tem a ambição de fazer previsões sobre o comportamento da pandemia em cada município do país, explica Silvio. 

“A ideia é fazer uma simulação integrada, onde tem os modelos epidêmicos tradicionais que você considera para cada cidade. Só que ainda tem a interação entre cada localidade, que é o fluxo de pessoas que se deslocam de um município para o outro e, com isso, poderemos ver a disseminação da Covid-19 no território brasileiro”, aponta. 

Inspirado em um trabalho semelhante da Espanha, o projeto brasileiro é independente e foi selecionado pelo Programa de Combate a Epidemias, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). “Ele vai ser importante para a gente continuar o projeto, porque vai nos permitir manter a estrutura computacional funcionando e, principalmente, tem bolsas. Vou poder manter a equipe trabalhando comigo”, destaca o professor. 

Como funciona

O projeto, atualmente, está em uma segunda etapa, que é dividida em duas frentes. Na primeira, os pesquisadores analisam a curva de contaminação do novo coronavírus em cada município, o índice de isolamento social e as medidas de proteção individual. 
 
O objetivo é determinar qual a taxa de infecção efetiva para aquela localidade específica.  Isto é, com que frequência uma pessoa infectada transmite a doença para outra, que ainda não teve a Covid-19. “Quanto maior essa taxa de infecção, maior é a possibilidade que o indivíduo infectado transmita a doença para um sujeito que está suscetível”, explica Silvio. 

Na segunda, que também está em curso, é feita a integração dos dados de mobilidade entre os municípios. Neste caso, observa-se o fluxo recorrente dos indivíduos entre as cidades, nos casos em que as pessoas de uma cidade estudam e trabalham em outra, por exemplo. Com os dados relativos a essas duas frentes consolidados, os pesquisadores pretendem medir qual o efeito da mobilidade na taxa de infecção. 

Silvio quer aplicar o modelo para estudar o avanço da Covid-19, sobretudo, nas cidades do interior do país. Ele afirma que a pesquisa pode ser útil nesses municípios, que possuem menos estrutura para lidar com a propagação da doença e carecem de “coordenação” entre si.” Você não pode tomar políticas públicas de maneira independente. Mas isso na prática não existe. Um município do lado do outro tem práticas completamente diferentes”, diz. Ele complementa: “O modelo matemático, como ele mede essa interação entre interior e capital, poderia ajudar na questão da coordenação das políticas públicas.” 

Assim seria possível projetar o impacto da reabertura econômica em uma grande cidade no município menor. “As cidades do interior são fortemente influenciadas pelos grandes centros urbanos. A doença não vem do nada. Ela vem de pessoas que se deslocam de um lugar para o outro. Se não tiver um planejamento coordenado das políticas e estratégias que vão ser tomadas nas capitais e no interior, isso vai gerar um grande problema”, ressalta. 

Interiorização

Dados da Fiocruz mostram como a pandemia se comportou nos municípios brasileiros no último mês. Quando o assunto é o número de casos confirmados entre 30 de julho e 30 de agosto, os municípios com menos de 10 mil habitantes são os que apresentam a maior taxa de crescimento de infectados. De 90.936 casos para 150.344, aumento de 65,3%. Já nos grandes centros, notadamente aqueles com mais de 500 mil habitantes, o índice foi de 37,9%, o que indica que, de fato, o novo coronavírus vem atingindo o interior com mais força. 

Marcelo Gomes, coordenador do InfoGripe, da Fiocruz, ressalta o impacto da pandemia nessas cidades. “Em termos de vulnerabilidade, o interior sofre muito mais do que os grandes centros urbanos, em termos de ter uma menor capacidade atendimento hospitalar, ou seja, número menor de leitos por habitante, além disso, condições sociodemográficas, como baixa renda familiar, escolaridade e acesso à saneamento básico. O interior sofre mais, principalmente nas regiões Norte e Nordeste”, destaca. 

Segundo ele, quase todas as capitais do país já estão em processo de queda na curva de contaminação algumas semanas, ao passo em que no interior há cidades em que a Covid-19 está em ascensão. Praticamente todos os estados possuem, no mínimo, uma macrorregião de saúde que ainda não iniciou o processo de queda”, complementa. 

Fonte: Brasil 61

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