Com vigência de 2014 até 2024, o Plano Nacional de Educação (PNE) conta com 20 metas, das quais oito têm prazos intermediários já vencidos. Além disso, a lei tem 254 estratégias relacionadas a essas metas e 14 artigos que definem ações a serem realizadas pelo País. Completando três anos neste 25 de junho, apenas seis dos 30 dispositivos relacionados à Educação Básica que deveriam ter sido cumpridos até o ano de 2017 foram realizados total ou parcialmente, segundo dados reunidos por parceiros do Observatório do PNE (OPNE), neste balanço sobre o Plano.
Os desafios, porém, ainda são muitos. Em relação às metas 1, 2 e 3, de acesso, ainda temos 2,5 milhões de crianças e jovens de 4 a 17 anos fora da escola. A faixa etária mais atingida é a de jovens de 15 a 17 anos, em especial, os de renda mais baixa, os moradores das áreas rurais e os pretos e pardos. A diferença nas taxas de atendimento entre os mais pobres e mais ricos é de 14 pontos percentuais; entre os que vivem na zona rural e na zona urbana, de 6 pontos; entre pretos e brancos, de 5 pontos, e entre pardos e brancos, de 4 pontos. A desigualdade, porém, começa bem mais cedo: dentre o quartil (25%) de famílias brasileiras mais ricas, 52,3% das crianças de 0 a 3 anos estão matriculadas na creche no Brasil. Já dentre o quartil de famílias mais pobres, essa taxa é de 21,9%.
Debatido ampla e democraticamente, o PNE é um marco na Educação nacional por ter tido grande participação e acolher os principais pleitos da sociedade. Por essa razão, é ambicioso. Ainda que não seja cumprido integralmente até 2024, o plano oferece uma visão comum do que é preciso ser alcançado para que seja reduzido o atraso educacional. O plano também é pauta para o controle social por parte das famílias, da sociedade civil e do sistema de justiça. Dentre todas as metas e estratégias, há evidente clareza para os membros do OPNE e também outros atores do campo educacional de que todas são urgentes.
Mas, há também avaliação de que o plano é uma lista de tarefas entre as quais há pouca priorização ou integração. Esse é o principal entrave ao seu cumprimento. Para que saia do papel é essencial a elaboração de um plano de ação que trace um caminho a ser percorrido, começando pelas políticas que embasam e sustentam as demais, criando mecanismos para que os gestores públicos, os agentes de fiscalização e a sociedade possam debater e acompanhar os processos.
Segundo as organizações parceiras do OPNE, esse plano de ação precisa priorizar as metas e estratégias que versam sobre o aprimoramento da transparência e da governança; a formação inicial e continuada dos professores; a valorização salarial e da carreira docente; a redução das desigualdades; e a garantia do acesso em estabelecimentos com infraestrutura digna para alunos e profissionais da Educação.
Nesse sentido, é importante que as políticas públicas sejam desenhadas tendo em seu cerne a redução das desigualdades, com o direcionamento de mais e melhores insumos educacionais justamente para as localidades e segmentos populacionais que mais precisam. Os dados do OPNE mostram, por exemplo, que as escolas de Educação Básica de menor nível socioeconômico (NSE) têm indicadores bem abaixo das de NSE mais alto no quesito infraestrutura (ao qual se refere a estratégia 7.18) – apenas 1,6% das que atendem a alunos mais pobres contam com todos os itens previstos no PNE, frente a 70,2% das que atendem aos mais ricos. A situação não é diferente em relação à formação docente (tema da meta 15) – nos anos finais do Ensino Fundamental, apenas 13,2% dos docentes têm formação em todas as disciplinas em que lecionam nas escolas de NSE muito baixo, ante 68,7% no de maior NSE. O impacto dessa desigualdade no aprendizado e nas oportunidades das crianças e jovens ao longo da vida é enorme.
Dentre os fatores internos à escola determinantes para a aprendizagem dos alunos, o professor é apontado de maneira unânime como o principal deles. Desde os primeiros anos de vida, na creche, até o Ensino Médio, eles são os principais agentes promotores do desenvolvimento dos alunos. Apenas será possível garantir Educação Infantil de qualidade, a alfabetização plena, o aprendizado adequado em cada ano e, mais importante, a preparação do aluno para a vida e para ser um agente transformador na sociedade, se os professores tiverem uma formação de qualidade que os prepare para os inúmeros e incomparáveis desafios da sala de aula e sejam valorizados e reconhecidos como os principais profissionais do País.
Não há novidade nessas constatações. Mas por que ainda não existem políticas que priorizem a qualidade para os mais vulneráveis? Os mecanismos de financiamento atuais, em especial o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), ajudaram em grande medida na redistribuição de recursos, mas ainda não focam na equidade como deveriam – por exemplo, enquanto municípios paulistas receberam em 2017 um valor de R$ 3.586,93 por aluno dos anos iniciais do Ensino Fundamental, em Alagoas, um dos estados com piores indicadores educacionais do País, o valor é de R$ 2.875,03 por aluno.
Por outro lado, mesmo nos estados com maior valor por aluno no Fundeb, ainda é gritante a desigualdade e distante a qualidade do ensino. Isso indica que o debate sobre financiamento (abordado na meta 20) não se resume ao aumento de recursos, mas também à distribuição e à eficiência da gestão. Nesse sentido, a falta de mecanismos mais robustos de acompanhamento e controle dos gastos educacionais, bem como de ferramentas de monitoramento da demanda e de avaliação da qualidade do Ensino – especialmente na Educação Infantil, para a população com deficiência e Educação de Jovens e Adultos, que ainda contam com nenhum ou poucos instrumentos de avaliação –, é um dos principais desafios segundo os especialistas. Eles apontam a transparência e a governança como pontos-chaves tanto para a gestão – que precisa de bons diagnósticos para a elaboração de políticas públicas focalizadas –, como para o exercício do controle social – peça fundamental para que a sociedade possa cobrar resultados e apoiar avanços.
Além disso, a intersetorialidade é vista pelo Observatório do PNE como um caminho necessário para que os objetivos educacionais se concretizem, uma vez que diversas evidências mostram a relação das diferentes áreas sociais – como assistência social, segurança, saúde, cultura, transportes e infraestrutura – com a Educação.