Em menos de 45 dias, adolescentes atendidos no Centro de Internação Provisória (Cenip) Caruaru, no Agreste de Pernambuco, passam a ter uma relação diferente com as palavras e as imagens. É nesse tempo – prazo máximo em que aguardam sentença judicial pela prática de atos infracionais – que eles participam de um projeto de leitura desenvolvido em grupo, com o apoio de uma pedagoga e de uma assistente social. Duas vezes por semana, os socioeducandos se reúnem para compartilhar as histórias que conheceram e tomar emprestados novos livros para serem lidos em seus alojamentos. A iniciativa vem dando tão certo que pode ser replicada em outras unidades de internação provisória da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Funase) em todo o Estado.
O projeto nasceu há dois meses e foi pensado para superar um desafio desse tipo de atendimento: o pouco tempo que os internos permanecem no local e, consequentemente, a alta rotatividade da unidade. Atualmente, 17 socioeducandos participam da ação. “Sempre tivemos a consciência de que esses meninos não podem sair do mesmo jeito que entraram. Então, mesmo com apenas 45 dias para trabalhar com eles, temos realizado atividades que criam bases para os caminhos que eles vão seguir depois, seja a ida para uma medida socioeducativa em outra unidade da Funase, seja uma medida em meio aberto. Meninos que chegam sem saber assinar o nome vão para as audiências já assinando”, afirma a coordenadora geral do Cenip Caruaru, Maria Clara Amorim.
Na unidade, são atendidos adolescentes com idades entre 12 e 18 anos oriundos de 42 municípios do Agreste. O interno E.J.S., de 16 anos, por exemplo, é de Caruaru. Ele conta que, quando chegou à Funase, não sabia ler tão bem. Hoje, o cenário é outro. “Já li uns cinco livros desde que cheguei aqui. ‘Triste Fim de Policarpo Quaresma’, ‘A Batalha dos Mamulengos’… É bom porque, nos grupos, a gente tem que fazer o resumo do que leu e vai aprendendo mais”, diz o adolescente, pouco depois de detalhar o conteúdo do livro “A Ilha Perdida” (1944), de Maria José Dupré. Outro colega dele, H.S.S., também de 16 anos, de Santa Cruz do Capibaribe, faz planos após participar do projeto. “Parei os estudos por um erro. Isso aqui está me ajudando e quero voltar a estudar”, declara.
Sempre que terminam de ler um livro, os socioeducandos têm que escrever um resumo em uma ficha apropriada, que é anexada à documentação deles e acessada por promotores, defensores públicos e juízes responsáveis pelos processos. Também é essa a condição para que um novo livro seja emprestado no espaço de leitura do Cenip Caruaru. “A gente vê que eles cuidam, não rasgam, não amassam. É algo que mostra o valor que estão dando à leitura”, detalha a pedagoga Maurinúbia Moura. “Entre eles mesmos, estão estabelecendo essa cultura da leitura. Às vezes, um adolescente recém-chegado nem passou pelo primeiro atendimento e já está pedindo livro para ler, influenciado pelos colegas”, explica a assistente social Natália de Melo, também idealizadora do projeto.
EDUCAÇÃO – Além do projeto de leitura, desenvolvido por técnicas da Funase, o Cenip Caruaru também conta com uma professora ligada à Secretaria de Educação e Esportes do Estado, que desenvolve ações voltadas à alfabetização do público atendido no local. “A escrita, a música e outras formas de arte são muito trabalhadas, porque fazem com que a pessoa se desligue um pouco do mundo à volta e possibilitam o aprendizado de forma lúdica. Então, conseguimos desenvolver a escrita, a concentração e as emoções, tudo isso ao longo dos 45 dias em que os alunos ficam aqui”, afirma a professora Gilvaneide Tenório.
Imagens: Divulgação/Funase