O Senado decidiu cortar na raiz a discussão de tornar o funk uma prática criminosa. Por unanimidade, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) rejeitou a sugestão popular que pretendia tornar o funk um crime à saúde pública de crianças, adolescentes e à família. A rejeição foi liderada pelo senador Romário (Pode-RJ), que deu parecer contra a transformação da ideia em proposta legislativa. O entendimento dele foi acompanhado pelos demais integrantes do colegiado, que puseram um ponto-final na discussão: o texto não tramitará no Senado.
Os senadores consideraram que o texto era inconstitucional por cercear a livre manifestação cultural e de pensamento. Romário também criticou o mérito da sugestão legislativa ao lembrar que gêneros musicais hoje consagrados como o samba e o jazz também já sofreram tentativas de criminalização ao serem tratados como coisa de “gente impura” e “ralé”.
Para o relator, não há qualquer fundamento na vinculação entre o ritmo musical e a prática de estupros ou assaltos, feita pelos autores da proposta. “Infelizmente a prática de crimes ocorre nos mais diversos ambientes da sociedade brasileira, inclusive nos bailes funk. Para isso, já existem aparatos de repressão e judiciais que devem cumprir seu dever”, defendeu.
O senador ressaltou que o funk é uma das principais formas de lazer para parte da população do país e representa uma manifestação artística e cultural importante para jovens, sobretudo em lugares de população de baixa renda. “E estes bailes também são uma alternativa de diversão para milhões de jovens em nosso país, e nas áreas mais carentes, é muitas vezes a única”, lembrou Romário.
“O samba, outrora, foi considerado ritmo lascivo e pertencente à gente da ‘ralé’. No mesmo sentido, o jazz já foi considerado um estilo musical degenerado, de gente ‘impura’. Embora se tenha tentado, o Estado nunca conseguiu proibir a manifestação da cultura popular. A sabedoria do tempo ensinou que não se consegue algemar o pensamento; ele sempre encontrará um caminho para se libertar”, escreveu o senador em seu parecer.
No pedido para transformar a sugestão em proposta legislativa, os defensores da criminalização do funk atacaram o movimento como uma “falsa cultura”, e os “pancadões” como um recrutamento organizado nas redes sociais para “atender criminosos, estupradores e pedófilos a prática de crime contra a criança e o menor adolescentes ao uso, venda e consumo de álcool e drogas, agenciamento, orgia e exploração sexual, estupro e sexo grupal entre crianças e adolescente, pornografia, pedofilia, arruaça, sequestro, roubo e etc.”.
Vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos, Paulo Paim (PT-RS) disse que se fosse para proibir todos os eventos onde ocorrem violências e abusos, “então todo o carnaval teria que ser cancelado no Brasil”.
A sugestão legislativa foi apresentada pelo empresário Marcelo Alonso no portal e-Cidadania, que prevê o envio do texto à Comissão de Legislação Participativa caso ele alcance o apoio de pelo menos 20 mil pessoas. Foi o que ocorreu. Mas a conversão da sugestão em projeto de lei dependia da aprovação do colegiado, o que não houve.
Fonte: Congresso em Foco