Congresso do PMDB deve aprofundar cisão entre sigla e petistas

Da Folha de S. Paulo

Partido do vice-presidente Michel Temer e principal aliado do governo Dilma Rousseff no Congresso, o PMDB se prepara para fazer na terça-feira (17) uma demonstração vigorosa de seu descontentamento com os rumos do governo e de sua aliança com o PT.

Os peemedebistas convocaram um congresso para debater uma agenda de reformas econômicas proposta pela Fundação Ulysses Guimarães, centro de estudos do partido. O evento é visto pelos líderes da sigla como um primeiro passo na direção de um rompimento com os petistas.

Críticos do governo e da política econômica de Dilma terão microfones abertos para exibir sua insatisfação e pregar a ruptura com o governo durante o congresso, que será realizado em Brasília.

Produzido com o incentivo de Temer, o documento que resume a nova agenda do PMDB, “Uma Ponte para o Futuro”, atribui as dificuldades atravessadas pela economia a excessos cometidos no primeiro mandato de Dilma e defende políticas austeras, incluindo cortes de gastos e uma reforma na Previdência.

Com o documento, o PMDB quer se apresentar a líderes empresariais e formadores de opinião como um partido capaz de formular políticas que tirem o país da crise, invadindo uma seara que era dominada pelo oposicionista PSDB.

O documento foi recebido com desconfiança pelos tucanos, que viram nele uma tentativa de Temer de acenar para setores do meio empresarial, usando o discurso do PSDB, e se credenciar como alternativa segura para o Planalto, caso a presidente Dilma não conclua o mandato.

Coordenador do congresso e aliado de Temer, o ex-ministro Moreira Franco diz que o programa elaborado pela fundação mostra que, ao contrário do PT e do PSDB, o PMDB tem “uma proposta”.

“Sabemos como tirar o país da crise econômica e queremos nos preparar para contribuir com o país”, afirma.

O documento enfrenta resistência internas e foi visto com reservas pela ala governista do PMDB. Nos bastidores, representantes desse grupo veem a agenda como irrealista e impopular. Dizem que a proposta não atrai votos e que a defesa enfática de políticas austeras pode prejudicar candidatos da sigla nas eleições municipais de 2016.

Informado sobre a dissidência, Temer atuou nos últimos dias para conter os descontentes e evitar censuras públicas ao documento durante o congresso na terça.

Aliados do vice passaram os últimos dias ressaltando que o encontro não tem poderes para decidir os rumos da sigla e que uma eventual censura à aliança com o governo Dilma só será deliberada em março, quando a sigla fará sua convenção nacional.

“Quem organizou esse encontro foi a fundação, que tem esse papel mesmo, de debater. O que chamam de programa é um estudo técnico, apresentado como parecer”, disse o senador Eunício Oliveira (CE). “Só a convenção tem poderes para decidir.”

Na última quinta (12), numa reunião para discutir o documento, aliados de Temer disseram que ele deveria ser lido como a “Carta aos Brasileiros”, o documento apresentado na campanha eleitoral de 2002 pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para vencer desconfianças que o PT enfrentava no mercado.

Segundo esse raciocínio, o documento não deveria ser encarado como peça de apelo eleitoral nem como um gesto com peso suficiente para deteriorar ainda mais a relação da sigla com o Planalto no Congresso, por exemplo.

APERITIVO

A proposta inicial era que o congresso da Fundação Ulysses Guimarães tivesse poderes deliberativos, mas as divisões internas fizeram com que o comando nacional do partido o transformasse numa espécie de fórum preparatório para o evento de março.

Os entusiastas do rompimento do PMDB com o governo federal ressaltam que o adiamento da palavra final sobre a aliança com Dilma não deve ser visto como uma vitória da ala governista.

Para eles, essa decisão mantém o Palácio do Planalto sob alta pressão e empurra o desfecho da crise política para o ano que vem, quando a recessão econômica deverá ter reflexos mais visíveis para a população, como o aumento do desemprego e dos índices de inflação.

Dez propostas da agenda do PMDB

1 Fim das vinculações previstas na Constituição, como os gastos mínimos obrigatórios com saúde e educação, que deixam o governo sem margem de manobra para administrar o Orçamento

2 Tornar obrigatória a execução do Orçamento aprovado pelo Congresso, exceto em caso de frustração de receitas, quando as despesas seriam revistas de acordo com índices aprovados pelo Congresso

3 Fim da indexação de salários e benefícios da Previdência Social que hoje são corrigidos de acordo com a variação do salário mínimo

4 Criação de comitê independente para avaliação anual dos programas federais. Ele poderia recomendar a extinção de programas ineficazes. O congresso teria a palavra final

5 Criação de uma Autoridade Orçamentária, para articular o Executivo e o Legislativo

6 Para conter o crescimento dos gastos da Previdência, estabelecer idade mínima para aposentadoria no setor privado, 65 anos para homens 60 para mulheres

7 Rever a atuação do Banco Central no mercado cambial, em que a instituição intervém para conter variações bruscas das cotações do dólar, com custos para o Tesouro

8 Incentivar a participação do setor privado na realização de investimentos em infraestrutura e na operação dos serviços após as obras

9 Extinguir o regime de partilha criado pelos petistas para a exploração do pré-sal, dando à Petrobras direito de preferência nos leilões de futuras concessões

10 Busca de novos acordos comerciais com os Estados Unidos, a Europa e países asiáticos, com ou sem os parceiros do Brasil no Mercosul