Por Bernardo Lopes
Todos nós demos boas-vindas às ciclofaixas e ao espaço de lazer que se monta aos domingos e feriados em Caruaru. As ruas, principalmente a avenida Agamenon Magalhães, têm sido tomadas por pessoas andando, patinando, passeando ou correndo de bicicleta. E as ruas devem mesmo ser das pessoas, não dos automóveis. A iniciativa é ótima e merece elogios. Mas há alguns senãos.
A ciclofaixa, até alguns dias atrás, era montada desde as proximidades do campus esportivo da ASCES, na avenida Portugal, bairro Universitário, passava pela rua Marcionilo Francisco da Silva, avenidas Agamenon Magalhães e Manoel de Freitas, no Maurício de Nassau, e seguia ao longo da ferrovia desde o Espaço Major Clementino (Grande Hotel) até parar, abruptamente, nas proximidades da antiga CAGEPE, no Divinópolis.
Seu percurso poderia ter sido estendido, por exemplo, até alcançar a avenida Caruaru, que divide as duas primeiras COHAB’s, na Boa Vista. Agora, nem mesmo a CAGEPE ela alcança, pois seu caminho foi desviado em direção ao recém-inaugurado espaço de lazer no Pátio do Forró, a pouco mais de 700m do Grande Hotel, medida que gritava de tão óbvia. Mas para atingir o Pátio do Forró tinha que ser eliminada a perna até a CAGEPE?
Maurício de Nassau e Universitário são os bairros mais abastados da cidade e são, sem dúvida, os mais privilegiados com a ciclofaixa. Dá-se a entender que só os caruaruenses ricos podem passear de bicicleta. É isso mesmo? E os trabalhadores que a usam no dia-a-dia e têm que se arriscar em meio ao trânsito pesado dos veículos a motor e às linhas d’água criminosas de mais de 30cm da cidade?
É bom lembrar, ainda, que estamos no início da aprendizagem de convivência entre carros e bicicletas. Ciclovias e ciclofaixas não têm de servir somente ao lazer. É restringir demais seu público e sua utilidade. Elas têm de servir, democraticamente, a toda a população, de segunda a segunda. Mais: se são apenas de lazer, elas têm de ligar os poucos locais de lazer da cidade (os três parques e as maiores praças) e não terminar em meio ao nada.
E quando o sol baixa e a temperatura fica mais convidativa ao exercício, a ciclofaixa é desativada. Por que não deixá-la até às 20h, em vez de retirá-la às 18h?
Há uma quantidade enorme de gente que utiliza a bicicleta à noite como forma de se exercitar. Há uma quantidade ainda maior de gente que a usa como transporte durante o dia. E há uma quantidade gigantesca de gente disposta a trocar o carro pela magrela no dia-a-dia e que ainda não o fez por falta de vias adequadas.
A demanda por bicicletas nunca virá antes da criação da mínima estrutura necessária. Ela vem sempre depois. Se construir ciclovias (separadas fisicamente das vias para carros por barreiras) é caro e demorado, montar ciclofaixas com pinturas e cones, não. Por que, então, não as montamos no contrafluxo do trânsito? Pela manhã, no sentido contrário ao do Centro. À noite, no sentido do centro.
E não basta criar estes espaços de lazer. Faltam as pessoas preparadas para orientar os usuários. A ciclofaixa dos domingos e a ciclovia do Pátio do Forró são tomadas por caminhantes, corredores, crianças brincando e patinadores, prenunciando acidentes para breve, quando cada um desses usos tem seu espaço definido. Demos um passo importante (ou uma pedalada importante), mas a trilha é longa. Que as ciclovias, ciclofaixas e os espaços de lazer sejam menos voltados para os ricos. Há vida fora do Maurício de Nassau!
Bernardo Lopes é arquiteto, formado pela Universidade Federal de Pernambuco, sócio-diretor do Jirau Arquitetura e Urbanismo e que teve um de seus projetos exposto na Bienal de Veneza, na Itália.