Por João Américo de Freitas
O conceito de tecnofeudalismo tem ganhado destaque nos debates contemporâneos, sugerindo que o capitalismo tradicional está sendo suplantado por uma nova estrutura econômica e social, onde grandes corporações tecnológicas exercem um controle semelhante ao dos senhores feudais da Idade Média. Nesse modelo, as relações de mercado são substituídas por dependências hierárquicas, mediadas por plataformas digitais que dominam vastos “feudos” na nuvem.
Yanis Varoufakis, em seu livro “Technofeudalism: What Killed Capitalism”, argumenta que o capitalismo, caracterizado pela busca incessante de lucros através de mercados competitivos, está sendo substituído por um sistema onde o poder econômico se concentra em plataformas digitais. Essas plataformas operam como feudos modernos, onde não apenas trabalhadores, mas também empresários e pequenos capitalistas se tornam vassalos, gerando valor que se traduz em rendas para os proprietários dessas infraestruturas digitais.
DMT EM DEBATE
No tecnofeudalismo, a posse e o controle de dados tornam-se centrais. As grandes corporações tecnológicas acumulam vastas quantidades de informações sobre os usuários, controlando não apenas os fluxos econômicos, mas também as narrativas sociais, políticas e culturais. A posse de dados permite prever comportamentos, influenciar decisões e, em última instância, moldar o próprio futuro das sociedades, consolidando ainda mais o poder dessas empresas.
Além disso, o tecnofeudalismo exacerba a desigualdade global. Enquanto os “senhores digitais” acumulam riqueza e poder, a maior parte da população enfrenta dificuldades para acessar os benefícios prometidos pela tecnologia. Em muitos casos, o avanço tecnológico não democratiza oportunidades, mas reforça a exclusão e a concentração de renda, criando um fosso ainda maior entre os que têm acesso às plataformas e os que são meros usuários ou trabalhadores precarizados.
A lógica do tecnofeudalismo não se limita à economia, estendendo-se à política e à cultura. Governos muitas vezes se veem dependentes das grandes corporações tecnológicas para a gestão de dados, segurança cibernética e infraestrutura digital. Essa dependência compromete a soberania estatal, colocando empresas privadas em posições de poder comparáveis, ou até superiores, às de nações. No campo cultural, algoritmos determinam o que consumimos, moldando nossas preferências e reforçando bolhas informativas que dificultam o diálogo democrático.
Apesar das preocupações, o tecnofeudalismo não é inevitável. Existem movimentos em defesa de uma internet mais descentralizada, regulação mais rigorosa das plataformas e maior proteção aos trabalhadores digitais. O debate sobre o papel das grandes corporações tecnológicas está ganhando força em esferas políticas e sociais, pressionando por mudanças que promovam maior equilíbrio e justiça nesse novo cenário.
O tecnofeudalismo nos força a questionar o futuro que estamos construindo. A promessa de um mundo digital democrático e inclusivo esbarra nas contradições de um sistema que concentra poder e riqueza em detrimento da maioria. Resta saber se teremos a coragem de enfrentar esses desafios ou se permaneceremos presos a uma nova versão de um sistema que já conhecemos bem
João Américo R. Freitas
Advogado