A tão falada ‘transformação digital’ é a nova onda que busca adaptar as estruturas corporativas, aperfeiçoar desempenho e aumentar os resultados dentro das organizações, colocando a tecnologia como a grande protagonista destas transformações.
Não é novidade que temos sido inundados por novas tecnologias que buscam trazer facilidades e velocidade. Elas têm alterado até as nossas relações e proporcionando enormes oportunidades de crescimento. Dentro das organizações essas mudanças e ganhos não são diferentes e aproveitar essas oportunidades é praticamente uma obrigação, uma vez que sem inovação é muito difícil uma organização sobreviver no mercado atual e nas grandes alterações que especialistas têm previsto para um futuro próximo.
Por isso, é fundamental que as empresas e, principalmente, áreas de gestão de pessoas estejam de olho nessas mudanças e como elas influenciam os diferentes ambientes de trabalho e os distintos segmentos do mercado. Mais importante do que isso, acredito que as empresas precisam observar como essas novas tecnologias podem alterar e contribuir para mudanças na cultura interna de cada organização.
É preciso ainda criar condições para que elas permeiem o ambiente, redefinindo as estruturas organizacionais, bem como novas configurações de hierarquias e ainda revise e adote novos processos e metodologias para a gestão de pessoas e das suas relações com as máquinas.
É impossível prever todas as mudanças causadas pelas transformações digitais, mas ao observarmos atentamente o comportamento das pessoas, podemos dizer que o dinamismo e a velocidade dos acontecimentos são, sem sombra de dúvida, as alterações mais impactantes. Esse dinamismo foi descrito pelo sociólogo e filósofo polonês, Zygmunt Bauman, como modernidade líquida. De acordo com Bauman, vivemos em uma época histórica de liquidez, fluidez, volatilidade, intangibilidade, incerteza e insegurança, onde pequenas mudanças podem desencadear grandes quebras de paradigmas.
A solidez não existe, a transformação é inerente, as relações são líquidas e o comportamento dos indivíduos acaba por modificar também as relações entre empresa, colaboradores e clientes. Dentro dos ambientes profissionais, tudo está mais rápido e ágil. Do ponto de vista das empresas, os ambientes estão mais abertos e flexíveis, adotando modelos como ‘open space’ em que as paredes entre as pessoas são literalmente derrubadas e em que diferentes profissionais de diferentes áreas se mesclam e colaboram juntos em projetos.
Olhando para o relacionamento entre empresa e sociedade/clientes, a forma de se comunicar está mais dinâmica, menos formal e mais próxima. Se antes as organizações eram entidades intocáveis e distantes, hoje existe um movimento muito forte que as tornam mais acessíveis, permitindo um fluxo de informação muito mais direto, profundo e de verdadeira conexão.
Se as transformações digitais abriram portas para relacionamentos mais dinâmicos, elas também derrubaram inúmeras barreiras de entrada, fazendo com que o mercado recebesse novos players e, aumentando assim, a concorrência entre as empresas. Como a oferta de produtos e serviço se tornou maior, conquistar o consumidor passou a ser a ordem do dia – todos os dias. Esses, por sua vez, estão mais exigentes e com menor tolerância ao erro.
Se as nossas relações com as marcas estão nesse nível de exigência, por que seria diferente dentro das empresas onde trabalhamos? Nosso comportamento enquanto colaborador está diretamente ligado ao nosso comportamento enquanto consumidor. Queremos que esse dinamismo nos acompanhe em nosso local de trabalho e, é assim que a modernidade líquida impulsiona a conquista de mais liberdade dentro das empresas e proporciona, por exemplo, o crescimento das políticas de home office.
Algumas empresas consideram assustador dar esse tipo de autonomia para o funcionário. Essa flexibilidade de horário, trabalho remoto e engajamento por projeto são conceitos novos que assustam os modelos tradicionais de relação de trabalho, onde o microgerenciamento das ações é o processo mais comum para a gestão de pessoas. A única possibilidade é criar bases sólidas de confiança e criar programas fortes de gestão de pessoas para mantê-los engajados e conectados, de onde quer que eles trabalhem.
Mas você pode me perguntar: e o que tudo isso tem a ver com recrutamento e seleção? E eu posso dizer que: tudo. Essa necessidade de engajamento já nasce no processo seletivo, com a identificação entre o funcionário e a cultura organizacional. Nesse contexto, surge um novo desafio especificamente aplicado ao recrutamento e seleção de profissionais. O recrutador precisa encontrar as pessoas com perfil técnico para ocupar as vagas disponíveis, levando em consideração os valores, as características e, principalmente, as motivações de cada candidato e, tudo isso, precisa estar coerente com os valores da cultura empresarial. Isso quer dizer que o nosso papel nessa era vai muito além de analisar currículos e fazer entrevistas. É necessário desbravar e reconhecer nas pessoas o seu estilo de vida, o que acreditam, seus propósitos e os objetivos de vida tanto profissionais quanto pessoais e, descobrir, o quanto esses profissionais são adaptáveis a mudanças tecnológicas e até culturais.
Ainda como responsabilidade dos recrutadores, está o papel de se aprofundar verdadeiramente na política da empresa e descobrir dentro do discurso para o mercado quais são as experiências e propostas da marca. Uma contratação bem-feita, à longo prazo, leva em consideração o nível de felicidade do profissional, a liberdade criativa, sua capacidade de entrega, sua resiliência e a sua relação com a empresa que o contratou.
Assim, fica evidente que todo o processo de contratação precisa ser adequado à nova conjuntura de mundo. Não é à toa que muitas empresas começaram a enxergar a necessidade de colocar em prática o conceito de ‘marca empregadora’, que busca atrair e reter os melhores talentos, por meio de valores fortes e valendo-se de tecnologia para transmitir em alto e bom som sua voz no mundo.
Vamos juntos desbravar e repensar essa modernidade, organizações e relações cada vez mais tecnológicas e, por vezes, líquidas.
Felippe Virardi é formado em administração de empresas, executivo com mais de 10 anos de experiência na área de marketing e vendas e headhnter na Trend Recruitment, boutique de recrutamento e seleção para marketing e vendas