Congresso em Foco
Dos 252 dias úteis de 2017, os deputados estavam obrigados a comparecer à Câmara em apenas 119. Mesmo assim, oito parlamentares faltaram a mais da metade das datas reservadas a votações na Casa. Entre eles, dois condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF): Roberto Góes (PDT-AP), campeão em ações na corte, e Paulo Maluf (PP-SP), que cumpre pena de prisão no Complexo Penitenciário da Papuda. Além deles, também estão entre os que menos compareceram em plenário no ano passado José Otávio Germano (PP-RS), Giovani Cherini (PR-RS), Arthur Virgílio Bisneto (PSDB-AM), Sabino Castelo Branco (PTB-AM), Adail Carneiro (PP-CE) e Jovair Arantes (PTB-GO).
Apesar de ter justificado a maior parte das 471 ausências que acumularam, cada um deles teve mais de 60 faltas, à exceção de Bisneto, que exerceu o mandato por menor período. A maior parte das faltas foi atribuída pelos deputados a problemas de saúde. Esse foi o motivo mais comum entre os alegados pelos parlamentares para escapar do desconto no salário e do risco de perder o mandato por excesso de ausências.
Atestados médicos abonaram 4.418 faltas na Câmara em 2017. Missões oficiais pela Casa foram usadas para justificar 3.578 ausências. Foram atribuídas, ainda, 2.040 faltas a “decisão da Mesa”. Nesse caso, a Mesa Diretora não detalha a razão do não comparecimento. Em geral, porque o parlamentar participa de atos políticos em seu estado.
De acordo com o artigo 55 da Constituição, o congressista que deixar de comparecer a mais de um terço das sessões sem apresentar justificativa em até 30 dias poderá perder o mandato. A ressalva é, justamente, quanto às ausências por problemas de saúde, que podem ser justificadas a qualquer tempo.
Condenados e faltosos
Um dos deputados que mais faltaram foi o recordista em procedimentos no Supremo Tribunal Federal (STF). Das 68 ausências do deputado Roberto Góes em 2017, 38 foram atribuídas a licença-saúde e oito a missões oficiais. Outras 14 também aparecem sob a justificativa de “decisão da Mesa”, sem esclarecimento claro para o “perdão”. Foram oito faltas sem justificativa.
Por meio de nota, o deputado afirmou ao Congresso em Foco que a atividade parlamentar não se resume às presenças, mas também inclui “audiências nos ministérios, a liberação das emendas parlamentares, as viagens em missões oficiais e os compromissos institucionais e políticos que cumprimos no Estado”. O deputado disse ainda que suas ausências foram devidamente justificadas e “atendem as normas em vigência da Casa”, restando algumas justificativas “pendentes de deferimento”.
Ele responde a quase duas dezenas de inquéritos e ações penais no Supremo. Ele foi condenado em maio de 2016 a dois anos e oito meses de prisão por peculato, por ato de seu último ano de mandato como prefeito de Macapá. Nesse caso, porém, ele não corre o risco de ser preso. Como foi inferior a quatro anos, a pena foi convertida em trabalho voluntário e pagamento de 20 salários mínimos em gêneros alimentícios, material escolar ou medicamento. O parlamentar recorre da sentença.
Maluf também figura na lista dos mais faltosos. O deputado, que se entregou à polícia para cumprir a sentença de mais de sete anos de prisão em regime fechado no dia 20 de dezembro, apresentou atestado de saúde para 56 de suas 67 faltas. A saúde do deputado, inclusive, é um dos motivos apresentados pela defesa para tentar tirá-lo da Papuda.
O deputado, de 86 anos, tem câncer de próstata e outras doenças, de acordo com os seus advogados. Laudos de médicos legistas apontam que ele pode permanecer preso, mas precisa de acompanhamento adequado. Maluf está na ala de presos vulneráveis da Papuda – voltada para idosos, policiais e políticos condenados -, onde também está o ex-senador Luiz Estevão.
Lava Jato
O deputado José Otávio Germano é o campeão de ausências. Compareceu a apenas 37% das sessões de 2017. Entretanto, apenas 8 das 75 faltas dele não foram justificadas. As 62 ausências com justificativa foram atribuídas a tratamento de saúde. O deputado chegou a passar mais de um mês internado em Porto Alegre antes de ser transferido para continuar seu tratamento contra insuficiência renal no Rio de Janeiro.
De acordo com a assessoria de Germano, a doença renal acabou desencadeando outros problemas de saúde, dos quais, informa o gabinete, ele está recuperado. Germano também é um dos investigados em um dos braços do inquérito-mãe da Lava Jato, que o cita entre os mais de 30 deputados do PP que receberam dinheiro do esquema de corrupção na Petrobras.
Câncer e AVC
Giovani Cherini, o vice-campeão de faltas, também apresentou justificativa de saúde para quase todas as 73 faltas registradas, com apenas 1 ausência sem justificativa. Durante o primeiro semestre de 2017, o deputado passou por sessões de quimioterapia e radioterapia para combater um câncer na garganta. Ele informou que estava curado da doença pouco antes do recesso parlamentar do meio do ano e voltou à Câmara em meados de agosto.
Quem também teve grave problema de saúde foi Sabino Castelo Branco. Vítima de um AVC hemorrágico em 13 de agosto, chegou a ficar internado na UTI em um hospital de Manaus. Ele foi transferido em 15 de agosto para o hospital Sírio Libanês, em São Paulo, onde continua internado sem previsão de alta.
Outro caso em que o deputado apresentou atestados de saúde é o de Arthur Virgílio Bisneto, licenciado do mandato de deputado federal desde o início de setembro. Ele não compareceu a mais da metade das 76 sessões em que era obrigado a marcar presença. Entre as 23 faltas justificadas dele, 22 foram atribuídas a licença-saúde. Arthur Bisneto assumiu a secretaria da Casa Civil de Manaus, capital cujo prefeito é seu pai, Arthur Virgílio Neto (PSDB), em 1º de setembro. Adail Carneiro também apresentou atestado médico para 61 de suas 63 faltas.
Regras do jogo
Desde 2015, em tese, apenas missões autorizadas pela Câmara e atestados médicos podem abonar faltas dos parlamentares. Para os líderes, a Casa permite que eles se ausentem para cumprir atividades partidárias. No início da atual legislatura, em 2015, a Mesa Diretora da Câmara – à época sob a batuta de Eduardo Cunha (MDB-RJ), atualmente preso e condenado a mais de 14 anos de prisão em Curitiba – restringiu as justificativas para as faltas de deputados. Até então, além dos líderes partidários, a dispensa de justificativa também era prerrogativa de presidentes de comissões e membros de CPIs.
A autorização para se ausentar é o que alega um dos mais faltosos, o líder do PTB, Jovair Arantes. O deputado registrou presença em 57 das 119 sessões de 2017, mas apresentou justificativa para todas as 62 faltas, a maioria em missão autorizada pela Casa. A assessoria do petebista lembrou o ato da Mesa Diretora, de 2015, para justificar as ausências. “Regulamento da própria Câmara isenta os líderes dessa obrigatoriedade. A ausência do registro não significa que eu não estivesse trabalhando na Casa – nas comissões ou no próprio Plenário”, disse o deputado por meio de nota.