O recesso acabou na última quinta-feira, mas é esta semana que marca, oficialmente, a volta dos parlamentares ao Congresso, após 20 dias de descanso. Além das pautas pendentes, que incluem 11 medidas provisórias (MPs) prestes a caducar, eles terão que enfrentar o desgaste trazido ao ambiente político pelas declarações recentes do presidente Jair Bolsonaro e a segunda fase da reforma da Previdência. As discussões e os projetos na fila apontam que os próximos meses devem ser tão agitados quanto o fim do semestre passado.
A prioridade na Câmara é o segundo turno da reforma da Previdência. Antes das férias, os deputados aprovaram a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6/2019 na primeira rodada de votação, com 379 votos favoráveis. Com o objetivo de aprová-la o mais rápido possível na segunda fase, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já marcou oito sessões no plenário nesta semana só para tratar da PEC.
Se tudo ocorrer dentro das expectativas dele, a reforma será assunto resolvido em uma semana pelos deputados e passará a ser preocupação dos senadores. O primeiro teste para saber se isso vai dar certo é a reação dos deputados na primeira sessão após o recesso. O tom dos discursos e os temas que prevalecerem na tribuna podem gerar longas discussões e, a depender do nível das conversas, dificultar que o cronograma seja seguido à risca.
A oposição já sinaliza que vai subir o tom contra o governo. Na última segunda-feira, o líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS), mencionou que, se o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Ministério Público Federal (MPF) “nada fizerem, restará o impeachment”. Em publicação no Twitter, Pimenta afirmou que a oposição deve discutir uma “ação conjunta”. Mesmo que a ideia não vá para a frente, pode acabar mudando o foco das discussões.
A fala de Pimenta veio logo após Bolsonaro ter dito ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, que contaria como morreu o pai dele, opositor à ditadura militar. “Bolsonaro deu uma série de tiros no pé durante esses dias de recesso. Não ganha nada com isso, politicamente falando. Mesmo que alguns eleitores concordem com as falas dele, muitos discordam, e o clima fica instável”, avalia o cientista político Sérgio Praça, da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Página virada
A percepção geral, entretanto, é de que a Previdência avança, mesmo com as trocas de farpas esperadas. Assim, a não ser que o Senado mude o texto, o que significa que ele precisaria voltar à estaca zero, na Câmara, Previdência é “página virada”, comentou um deputado do Centrão.
Segunda reforma no radar, a tributária, embora seja posta como um dos temas mais importantes no semestre, também não será o único foco de atenções dos parlamentares. Até porque a discussão deve durar meses, talvez anos, até se chegar a um consenso. Há, pelo menos, quatro propostas circulando pelo Congresso, com palpites de todos os lados.
Enquanto o debate sobre tributos é amadurecido, o plenário terá agenda própria. Só de medidas provisórias (MPs), há 11 na lista. A MP 881/19, da Liberdade Econômica, é uma das prioritárias. Aprovada em 11 de julho por uma comissão mista de deputados e senadores, a matéria é considerada uma segunda fase da reforma trabalhista, que entrou em vigor em 2017. A matéria muda 36 artigos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
O objetivo da proposta é diminuir o papel do Estado no controle da atividade econômica, reduzir a burocracia e incentivar o empreendedorismo. Como a MP é complexa, deputados já se organizam para analisar o assunto. “Na volta do recesso, vamos encaminhar à Comissão de Trabalho um ofício solicitando a presidente uma audiência para discutir essa matéria com sindicatos do setor produtivo e todos os envolvidos”, disse o deputado Silvio Costa Filho (PRB-PE).
Além desses assuntos, muitas matérias brigam por espaço para entrar na pauta. Na última sexta-feira, Maia se encontrou com o ministro da Justiça, Sérgio Moro, que quer retomar a tramitação do que chama de “pacote anticrime”. O projeto, que chegou à Câmara no início do ano, está na pauta deste segundo semestre, mas também gera muita polêmica e deve render discussões longas. O trecho que previa a prisão em segunda instância foi vetado pelos deputados.
“Bolsonaro deu uma série de tiros no pé durante esses dias de recesso. Não ganha nada com isso, politicamente falando. Mesmo que alguns eleitores concordem com as falas dele, muitos discordam, e o clima fica instável”, Sérgio Praça, cientista político da FGV.
Correio Braziliense