Portal Marco Zero
Por Helena Dias e Joel Santos Guimarães
Na tarde dessa quinta-feira (5), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) lançou nota urgente anunciando uma reintegração de posse contra o Centro de Formação Paulo Freire, localizado no Assentamento Normandia, em Caruaru. A reintegração foi solicitada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e determinada na 24ª Vara Federal, no município do Agreste pernambucano, pelo juiz federal Thiago Antunes.
O centro de formação pertence ao Assentamento Normandia, criado em 1998. À época, o próprio Incra orientou o MST a utilizar a casa sede, onde funciona o centro, para fins coletivos de capacitação dos assentados de Pernambuco. Só em 1999, o local passou a ser oficialmente o Centro de Formação Paulo Freire e, de lá para cá, se consolidou através de diversas parcerias com universidades públicas, institutos federais, o governo do estado de Pernambuco e o próprio Incra. Desde então, mais de 100 mil pessoas passaram pelos cursos práticos e teóricos do centro.
Segundo o dirigente do setor de Direitos Humanos do MST em Pernambuco, Edgar Menezes Mota, o centro é uma “referência nacional e internacional para a classe trabalhadora”. “O que está sendo atingido por essa reintegração de posse são as formações de jovens e adultos trabalhadores, as formações acadêmicas. O centro é um espaço que acolhe professores e estudantes de diversos cursos do país e de fora. São cursos de especialização, de mestrado e doutorado”, explicou em entrevista à Marco Zero.
Atualmente, o espaço correspondente ao centro comporta salas de aulas, alojamentos, um auditório, creche, quadra esportiva e outros aparatos. Na nota, ao contar a história do espaço e explicar sua utilidade social e pública, o MST diz entender “que não há razão nenhuma para o Incra pedir a reintegração de posse, a não ser a motivação ideológica de tentar impor ao MST uma derrota aqui no estado de Pernambuco(…)”.
Recurso e reação
O integrante da coordenação estadual do MST em Pernambuco, Paulo Mansan, explicou que o processo na 24ª Vara menciona que, no dia 19 de agosto, uma notificação teria sido entregue a alguém presente no Centro de Formação. No entanto, esse documento nunca teria chegado às mãos da coordenação do movimento: “É provável que um aluno ou um agricultor que estivesse ali no momento tenha recebido o documento. Por causa desse desencontro, agora há pouco tempo para recorrer. Mesmo assim, nossos advogados estão trabalhando no recurso em caráter de urgência”.
A reação não vai ficar restrita aos procedimentos judiciais. “Estamos mobilizando agricultores de 240 assentamentos da região para fazerem vigília nas instalações do Paulo Freire e criar uma situação que leve à negociação. Não queremos o confronto, mas não vamos entregar o centro de formação de mão beijada”, avisou Mansan.
Um dos dirigentes nacionais do movimento, Clébson Santos, acredita que há relação entre o pedido de reintegração de posse em Caruaru e o anúncio de despejos de vários assentamentos do MST no Paraná. Clébson acredita que há uma ofensiva do governo de Jair Bolsonaro em todo o país, contra os sem-terra.
“Não é só Bolsonaro. O bolsonarismo está alavancando uma ofensiva para tentar isolar o MST e outros movimentos sociais ligados ao campo. Principalmente, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e entidades ligadas aos negros e quilombolas. São 70 famílias que vivem e produzem no Assentamento Normandia e, foram essas 70 famílias que construíram o Centro de Formação Paulo Freire”, afirmou Clébson que concedeu entrevista enquanto dirigia por uma rodovia no interior do estado.
Solidariedade do governo estadual
A assesoria do governador Paulo Câmara, que recebeu apoio do MST para sua reeleição em 2018, informou que o secretário de Desenvolvimento Agrário, Dilson Peixoto, foi designado para se posicionar pelo Governo do Estado em relação ao episódio. A equipe de comunicação da secretaria emitiu a seguinte nota às 23h16min de quinta-feira:
“A Secretaria de Desenvolvimento Agrário de Pernambuco se solidariza com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e os assentados da Fazenda Normandia, de Caruaru, e espera que a decisão judicial que determina a desapropriação do Centro de Formação Paulo Freire seja revista.
O Centro é um importante espaço de formação de trabalhadores e trabalhadoras rurais, com cursos que vão do ensino fundamental a oficinas de agroecologia e veterinária, contando inclusive com parcerias com o Governo de Pernambuco e as Universidades de Pernambuco, Federal e Federal Rural.
Com 29 anos de existência o assentamento Normandia conta com 41 famílias e se dedica ao desenvolvimento da Agricultura Familiar. Além do Centro Paulo Freire, sua estrutura dispõe de cooperativa agrícola, associação, agroindústrias e escola multisseriada até o quinto ano”.