Quando uma empresa passa por uma dificuldade financeira momentânea, e se vê sem condições reais de quitar suas dívidas, ela pode recorrer à Recuperação Judicial, medida que suspende momentaneamente seus pagamentos para que ela crie um plano para pagar cada credor. Reorganizando seus negócios, a empresa recupera o passivo, porque continua operando, mantém os empregos, volta a crescer e tem um prazo certo para sair da Recuperação Judicial. A ideia é que ela não tenha a falência decretada – por isso o nome “recuperação”. “É uma ação válida em muitos casos e, quando bem estruturada, garante não só os empregos, mas o pagamento desses credores e o restabelecimento dos negócios”, defende o advogado especializado em Recuperação Judicial, Fernando Tardioli – do escritório Tardioli Lima Advogados.
A Recuperação Judicial foi criada exclusivamente para a pessoa jurídica, mas, há alguns anos, parlamentares decidiram que seria uma boa ideia adaptar seu conceito para que pessoas físicas também pudessem negociar suas dívidas com concessionárias de energia elétrica, saneamento básico, escolas particulares, planos de saúde e outras instituições que correspondem a dívidas cotidianas. A ideia ganhou peso e, em 2011, foi levada à Câmara, mas, não passou. Agora, anos depois, o tema volta à discussão e está em tramitação o PL nº 7.590/2017, que altera a Lei nº 9.099/1995, e estabelece que Pessoas Físicas com dívidas com débito máximo de até 40 salários mínimos poderão recorrer à Recuperação Judicial.
Tardioli critica alguns pontos do Projeto de Lei 7.590/2017. “Nele consta que a determinação da Recuperação Judicial para pessoa física teria competência atribuída aos Juizados Especiais Cíveis (JEC). Ocorre que, em primeiro lugar, a Recuperação Judicial pode exigir a realização de perícia prévia e o JEC, como um juizado que trata de casos de menor complexidade, envolve processos que independem de perícia. Está aqui o primeiro descompasso do projeto de lei”, aponta.
Na visão do advogado, o Projeto de Lei é um convite e um estímulo à inadimplência, fazendo com que, diante do risco iminente de calote, instituições financeiras e administradoras de cartão de crédito, por exemplo, revejam as taxas praticadas, a fim de compensarem os calotes. “Como sempre, os justos pagarão pelos injustos”, opina.
As falhas do PL, na avaliação de Tardioli, não param por aí. No Artigo 8º, lê-se que o juiz nomeará o administrador judicial. Porém, no Artigo 16º, vem a contradição: “Art. 16. Não haverá a designação de Administrador Judicial, ficando a cargo do juízo em que se processa a ação acompanhar e atestar o cumprimento das obrigações impostas”. “Não se trata apenas de uma simples contradição. Na Recuperação Judicial de Empresas, a figura do administrador judicial é fundamental. É ele que conduz todo o processo, assegurando que a empresa cumpra seu papel. Sua remuneração vem dos custos da Recuperação Judicial, que são arcados pela empresa solicitante. Como o JEC tem natureza gratuita, não onerando quem recorre à Justiça, quem remunerará esse administrador? E se, por ventura, o juiz for incumbido de supervisionar o processo, não se pensou em mais uma sobrecarga ao Judiciário?”
Fernando Tardioli acredita que o Projeto de Lei nasceu sem qualquer possibilidade de seguir adiante e deixa um conselho: “Se você tem dívidas, não se deixe iludir por propostas populistas e demagógicas. Poupe, reveja as suas despesas, negocie com os credores e trabalhe de sol a sol, pois o suor é o meio mais eficaz de quitar as suas contas”, conclui.