A discussão sobre a possível extinção do auxílio-moradia de magistrados não é simples e, em princípio, a medida não vai reduzir o impacto financeiro nos cofres da União, segundo especialistas ouvidos pelo Correio. Isso porque, nos bastidores, uma corrente aponta para a substituição da benesse pelo Adicional por Tempo de Serviço (ATS), três vezes mais caro para o Tesouro, como forma de reestruturação da magistratura e do Ministério Público.
De acordo com a Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, até agosto, a despesa anual com a moradia estava em R$ 1 bilhão. Por outro lado, em 2013, a Consultoria do Senado avaliou que o ATS ficaria, no mínimo, em R$ 3,17 bilhões por ano (R$ 1,84 bilhão para remunerar os ativos, e R$ 1,33 bilhão, os aposentados e pensionistas). O Senado levou em conta a idade média de ingresso na Magistratura (33,4 anos) e a no corpo funcional (49 anos) e calculou que o ATS significaria um incremento de 20% nos vencimentos de cada beneficiado. O ATS acrescenta 5% nos salários a cada cinco anos, como eram os quinquênios extintos na década de 1990.
José Robalinho, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), nega que haja relação entre o auxílio-moradia e o ATS. “Se o STF decidir pela extinção, obedeceremos, até porque o auxílio-moradia não é entendido pela população, mesmo sendo legal e pago há mais de quatro décadas. Agora, o ATS vai fazer justiça. Magistrados e procuradores que entram hoje recebem o mesmo que um profissional com experiência de 30 anos”, argumentou. Ele admitiu, no entanto, que o custo do ATS é “30% superior ao do auxílio-moradia”, apenas na sua carreira federal, que é recente. “Nos estados, sem dúvida alguma, o impacto vai ser muito maior”, disse o presidente da ANPR.
Volta do adicional
Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 163/2013) tramita no Congresso para ressuscitar o ATS. Não pode ser discutida por causa da intervenção de segurança no Rio. Mas, segundo fontes, “até a intervenção veio a calhar”. “A estratégia é deixar o povo esquecer o auxílio-moradia para, depois, rediscutir o ATS, apontando a grande injustiça com juízes, procuradores e defensores”, afirmou uma delas.
Para Roberto Piscitelli, especialista em finanças públicas e consultor do Senado, “essa é uma estratégia perigosa que pode provocar revolta na população”. O economista Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, declarou que não concorda sequer com o reajuste de 16,38% a magistrados e procuradores. “Na situação em que o país está, com previsão de deficit de R$ 139 bilhões no ano que vem e 13 milhões de desempregados, qualquer reajuste, penduricalho ou reestruturação de salário que implique aumento de gastos é irresponsável e injusta, porque nem todas as categorias conseguiram o mesmo tratamento”, afirmou Castello Branco. Leonardo Rolim, especialista em contas públicas da Câmara, disse que o debate do auxílio-moradia deve ir além. “O STF deve discutir também a legalidade do benefício nos estados. Só assim vai ser possível equilibrar as contas estaduais, onde juízes chegam a receber R$ 70 mil de penduricalhos”, ressaltou.
Correio Braziliense