Artigo: a neutralidade e a democracia

Por Jaelcio Tenório, suplente de vereador

Nos últimos dias, a palavra ‘neutralidade’ tem recebido destaque na imprensa local. Lideranças políticas têm adotado essa postura diante do cenário que está posto no segundo turno das eleições municipais de Caruaru. Em um primeiro momento, pode-se pensar que esse comportamento representa um avanço, ou mesmo um protesto com relação à conjuntura política.

No entanto, uma análise mais aprofundada pode levar a uma compreensão completamente oposta. Os dicionários registram que a palavra ‘neutro’ vem do latim (‘neuter’), e significa “nem um nem outro”, isto é, “indiferença”. Em outras palavras, estar neutro é omitir-se, é recusar-se a fazer algo que deveria ser feito. A omissão não ajuda a ninguém. Em uma sociedade cada vez mais plural como a nossa, abster-se de participar de decisões importantes simboliza a relativização da esperança, apagando as potencialidades de um novo horizonte

A mensagem que fica por trás dessa pretensa ‘neutralidade’ é a seguinte: “Apenas EU conseguiria fazer as ações necessárias. Como EU não cheguei ao segundo turno, isso já não importa mais”. Parece criança, quando perde o jogo e diz que vai voltar para casa, levando a bola consigo. No entanto, Caruaru não pode ser tratada como brincadeira de criança. O debate eleitoral não pode ficar restrito a nomes, cores ou siglas, mas deve ser focado nas demandas da população.

Mais do que projetos de governo, os políticos de Caruaru precisam apresentar um projeto de cidade. E os quadros que possuem um verdadeiro senso de coletividade devem desenvolver esforços para transformar esse projeto – de uma cidade mais justa e melhor para se viver – em realidade. Abrir mão de participar desse momento político e histórico é lançar mão de uma responsabilidade social. E a falta de responsabilidade é filha da falta de autoridade. É o desejo de dissolver o ônus da construção, é manter-se em uma posição confortável para criticar, mas sem ‘arregaçar as mangas’ para contribuir.

O silêncio traz, em si, uma voz gritante de descaso.

Caruaru deve ser discutida com a seriedade e o respeito que os cidadãos merecem. É necessário implementar ações estratégicas levando-se em considerações aspectos geopolíticos, históricos, econômicos e sociais. A Educação necessita ser pensada de maneira holística, que auxilie na formação cidadã e garanta ascensão social. A Saúde precisa de cuidados plenos, desde o aspecto preventivo ao curativo. A Cultura não pode ser confundida com entretenimento, mas precisa estar aliada aos mais elevados padrões estéticos. Abster-se de discutir o segundo turno das eleições é silenciar-se diante das mais urgentes necessidades da Capital do Agreste.

Com isso, não quero dizer que é necessário tomar um lado e defendê-lo cegamente. De modo algum! Não existe partido perfeito, nem ideologia perfeita, aliás, nem ser humano perfeito. Todos temos luzes e sombras e as nossas ambiguidades também são refletidas em nossas instituições. Porém, não considero aceitável manter-se calado quando é momento para opinar. E a opinião não pode ser baseada no ‘achismo’, nas promessas, nos sofismas, mas sim em análises, em estudos, no entendimento. Para erguermos a bandeira da coletividade, precisamos baixar a bandeira do egocentrismo, dos projetos pessoais.

Afinal de contas, o eleitor também deverá levar em conta essa postura. A avaliação do comportamento do candidato não ficará restrita à sua performance no primeiro turno, mas deverá ser completa. O futuro mostrará quais serão os frutos do que for plantado agora. E a população reconhecerá os semeadores e o tipo de grão que está sendo semeado (e por quem).

Natural do Rio de Janeiro, é jornalista formado pela Favip. Desde 1990 é repórter do Jornal VANGUARDA, onde atua na editoria de política. Já foi correspondente do Jornal do Commercio, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e Portal Terra.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *