A passagem de Jesus pela Terra não se deu em um vácuo político. A sociedade judaica naquela época estava dividida em pelo menos cinco grupos políticos intimamente vinculados a posicionamentos religiosos: (1) os fariseus, (2) os saduceus, (3) os herodianos, (4) os zelotes e (5) os essênios.
Os fariseus defendiam a ortodoxia religiosa, a observância extrema da lei, e adotavam uma postura nacionalista contrária à dominação romana. Os saduceus eram aristocratas que não levavam muito a sério as tradições do judaísmo e mantinham uma postura de acomodação e de colaboração em relação aos invasores romanos. Os herodianos eram burocratas ligados ao governo local para assuntos internos e faziam a ponte entre o Império Romano e a população nativa. Os zelotes eram remanescentes da revolta dos Macabeus, e, como exaltados nacionalistas, defendiam a via da violência para a restauração de um Israel independente. Por fim, os essênios eram piedosos, místicos e politicamente alienados, optando por viver afastados em pequenas comunidades rurais.
Logo após seu nascimento, Jesus e seus pais terrenos viveram como exilados políticos no Egito, para onde se refugiaram a fim de escapar da chacina de todas as crianças menores de dois anos, ordenada por Herodes, em resposta ao episódio da visita dos Reis Magos.
Na fase adulta, Jesus foi duro com a elite religiosa e nacionalista dos fariseus, verdadeiros legalistas julgadores do próximo, a quem os chamou, em discurso público, de “hipócritas”, “cegos”, “sepulcros caiados”, “serpentes” e de “raça de víboras”. Desmascarou-os: “tudo o que fazem é para serem vistos pelos homens” (Mateus 23:5).
Jesus sentou e conversou com todos, publicanos e pecadores, respeitosamente. Ao chamar os discípulos para compor o colégio apostólico, Jesus não fez distinção política. Mateus era cobrador de impostos, um colaboracionista da ordem imperial romana. Judas Iscariotes e Simão, o zelote, tinham associação com o movimento nacionalista radical. Jesus levou-os à transformação pessoal em busca de uma vida engajada, por Deus e para o próximo.
A história ensina que deve-se evitar opções partidárias da Igreja enquanto instituição, embora seja desejada a militância política dos cristãos enquanto indivíduos. Mas nenhum partido político é detentor de toda a verdade a ponto de merecer o apoio incondicional de Deus.
A separação entre a Igreja Católica e o Estado em 1891 significou a conquista da tão sonhada liberdade religiosa no Brasil, especialmente para a comunidade judaica em Pernambuco – que em 1654 tivera sido expulsa do Recife -, mas também para protestantes, espíritas, religiosos de matrizes africanas e indígenas.
Ontem e hoje, Jesus deixa a mesma lição: de que o exercício da tolerância político-religiosa é um dever de todos, seja no Império Romano ou numa democracia liberal.
Leo Salazar é cristão-anglicano e candidato a deputado estadual pelo Cidadania-PE.