ARTIGO — Os brancos, os nulos e as abstenções

Por Luiz Carlos Borges da Silveira

O resultado das últimas eleições apresentou um aspecto que foi muito comentado ainda no calor da apuração final, porém não analisado nem com a precisão e a profundidade requeridas. Refiro-me ao elevado, surpreendente e preocupante número de votos em branco, anulados e de abstenções nas eleições municipais do ano passado.

Só como exemplo: segundo dados finais e oficiais da Justiça Eleitoral, no primeiro turno a soma de brancos, nulos e abstenções superou o número de votos do candidato primeiro colocado em nove Capitais. No segundo turno a situação se repetiu em três Capitais, grandes colégios eleitorais: Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre tiveram mais votos inválidos que o candidato primeiro colocado. Isso se repetiu na maioria dos municípios, havendo casos em que vereadores se elegeram com baixíssimo número de votos, o que quer dizer que não adianta repudiar pela omissão, alguém será eleito.

O interessante, e negativo, foi a forma de como tais números foram encarados e, de certa forma, justificados. O presidente Temer declarou que era um alerta aos políticos. Correto, mas isso qualquer pessoa deduz, cabe analisar o porquê do alerta. Os políticos e lideranças da situação debitaram a avalanche de repulsa retratada pelas urnas aos malfeitos do governo anterior, associando o fato à corrupção. Já as lideranças da oposição, que representam o governo passado, sublinharam que os brancos, os nulos e as ausências eram a posição dos eleitores contra o processo de impeachment de Dilma Rousseff, que chamam de ‘golpe’, e à posse de Temer, que qualificam de usurpação.

Os dois posicionamentos são facciosos, parciais e remetem apenas ao desejo de uma justificativa perante os eleitores em particular e à população em geral. Ambos os lados contribuíram – e continuam contribuindo – para o descrédito da classe política que afeta, infelizmente, a política que em origem e princípio é sadia, positiva e honesta, sendo os maus políticos que deturpam essa essência. A política é o grande instrumento para a boa e correta administração dos governos e da sociedade. Portanto, acusações ou recriminações mútuas por parte de quem mutuamente contribui para denegrir a política nada acrescentam, a não ser acentuar o descrédito. O momento é de falar aberta e sinceramente com a sociedade, para que em 2018 a resposta negativa não venha a se repetir.

A classe política tem obrigação de convencer a população, em particular o eleitorado, que política é ciência indispensável. A sociedade tem obrigação cívica de participar, de atuar, de discutir e votar. Antes se usava a alegação de que no período militar havia tolhimento tanto em participação e discussão como de oportunidade do voto. Agora, que a liberdade é assegurada, os eleitores jogam as conquistas no cesto de lixo. Se a situação e o panorama não são bons com a plenitude democrática, pior serão se as oportunidades de mudança forem desprezadas.

Os eleitores devem ser conscientizados de que votar em branco, anular o voto ou desprezar as urnas é omissão e irresponsabilidade. Cabe aos líderes políticos e aos formadores de opinião transmitir essa mensagem, embora para isso devam reconquistar o respeito e a credibilidade. E, por fim, cabe aos cidadãos em geral, tão enfáticos em protestos, passeatas e manifestações, ter o entendimento de que não adianta ir para as ruas e não comparecer à seção eleitoral. A mudança se faz através da prática política e do voto, símbolo maior da democracia.

Pedro Augusto é jornalista e repórter do Jornal VANGUARDA.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *