As dúvidas sobre a legitimidade do impeachment

Por DANIEL LEITE
Da Folha de Pernambuco

No próximo dia 5 de outubro, a promulgação da última versão da Constituição brasileira completa 27 anos. O documento, confeccionado após a queda do Regime Militar, tem sido evocado por movimentos sociais e políticos oposicionistas para sustentar a abertura do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT). No entanto, apesar do aumento da insatisfação popular e do avanço da pauta no Congresso, ainda existe a dúvida em torno da validade jurídica do pedido. Afinal, o afastamento pode ser exclusivamente ancorado em fatores políticos? Complexa, a pergunta provoca uma reflexão em torno dos riscos que a democracia pode correr em episódios futuros de instabilidade econômica e politica.

A Constituição de 1988 descreve quais são os crimes que podem provocar o impedimento da presidente. De acordo com o advogado Emílio Duarte, membro da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Pernambuco, o texto associa o impedimento à comprovação de crimes de responsabilidade por parte do chefe do Executivo.

“A Lei fala em atos que comprometam a segurança do País, em prática de improbidade administrativa e irregularidades relacionadas à Lei Orçamentária. A gente pode citar o julgamento das contas de campanha de Dilma do ano passado, que está sendo feito pelo Tribunal de Contas. Da mesma forma, o Tribunal Superior Eleitoral anda investigando possíveis irregularidades na campanha presidencial do ano passado. Porém, mesmo com tudo o que já foi divulgado, ainda não se encontrou elementos suficientes que possam provar que Dilma incorreu em crime de responsabilidade”, disse.

Na sua opinião, a motivação da bancada oposicionista no Congresso ainda é o principal motor da manobra. “O problema é que o instituto do impeachment é político. Mesmo sem comprovação jurídica concreta, a oposição pode dar sequência ao processo”, reiterou.

Segundo o advogado, a precipitação dos oposicionistas pode abrir um precendente preocupante. “Do jeito que está sendo feita, esta articulação pode prejudicar a própria democracia. Este movimento pró-impeachment começou a ser defendido muito pouco tempo depois de Dilma ter ganho as eleições. Me parece que o PSDB não soube perder o pleito. Se caminharmos neste sentido, daremos motivos para que o impedimento seja solicitado em qualquer circunstância, sendo estendido para casos referentes às eleições estaduais e municipais”, defendeu o jurista.

Nas últimas manifestações de rua contra o governo, a imagem da Constituição foi bastante utilizada. No entanto, Emílio Duarte alerta para uma deturpação grave da legislação, neste caso. “A Constituição está no topo da hierarquia jurídica. Mas, hoje, a utilização deste instrumento está sendo feita de forma equivocada. Neste sentido, a Constituição sai enfraquecida, pois não se pode usar o texto para ancorar um pedido de impeachment que não tem fundamento”, destacou.

Natural do Rio de Janeiro, é jornalista formado pela Favip. Desde 1990 é repórter do Jornal VANGUARDA, onde atua na editoria de política. Já foi correspondente do Jornal do Commercio, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo e Portal Terra.

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