Enquanto muitos estados lutam para evitar o colapso do sistema de saúde, o Paraná goza de situação privilegiada no combate ao novo coronavírus. Desde o início da pandemia, o governo estadual apenas orientou medidas restritivas, enquanto prefeituras estabeleceram regras mais ou menos rígidas, dependendo da situação.
Mesmo assim, as UTIs estão com 39% dos leitos ocupados e o estado registrou 2.616 casos e 137 mortes até então. Mas, a sensação de controle da situação levou ao relaxamento do isolamento social que caiu de 65% para 37% entre março e maio. Praticamente todas as atividades, com exceção de cinemas, teatros e baladas, estão funcionando.
A partir de segunda-feira (25), até os shoppings devem reabrir em Curitiba, enquanto, em cidades do interior, já haviam retomado as atividades há algumas semanas. As igrejas também receberam aval para funcionar no estado, embora com capacidade reduzida.
O afrouxamento ameaça o status do Paraná, que já viu um crescimento significativo de casos nos últimos dias, embora longe do descontrole. “É bem possível que isso tenha refletido no nos casos […]. Existe um crescimento exponencial da doença no Paraná”, alerta o presidente da comissão de Enfrentamento e Prevenção à Covid-19 da UFPR, professor Emanuel de Souza.
A rapidez para tomar medidas de distanciamento social, como suspensão das aulas pelo estado e fechamento do comércio por prefeituras, o respeito maior das regras pela população, e até a estiagem são motivos elencados pelas autoridades para a posição abaixo da média para casos do novo coronavírus no Paraná.
Mesmo com a chegada do frio, que já foi sentido em todas as regiões, o Paraná ocupava o 22º lugar do Brasil em registros da Covid-19 nesta sexta-feira (22). Entre os dias 11 e 18 de maio, o estado chegou a apresentar a menor taxa de crescimento de casos do vírus do país.
“Quando o estado recomendou o fechamento das atividades [19 de março], tínhamos apenas 13 casos. Isso foi fundamental para o resultado que temos hoje, que é o achatamento da curva que todo mundo fala, mas no Brasil é difícil de se obter”, aponta o presidente da comissão de Enfrentamento e Prevenção à Covid-19 da UFPR, professor Emanuel de Souza.
O secretário estadual de saúde Beto Preto acredita também que a estiagem do Paraná, a mais severa em 50 anos, “colaborou” para a situação. “A falta de umidade, sem as chuvas, atrapalhou a disseminação e transmissão do vírus”, explica, citando como comparativo o estado do Amazonas, onde houve grande taxa de transmissão da Covid-19.
Mas, o cenário começou a se reverter nos últimos dias. Uma curva crescente de registros de casos e mortes já está sendo vista no estado, reflexo, segundo as autoridades, do afrouxamento do isolamento social no início do mês, quando houve a comemoração do dia das mães e formação de filas nos bancos para retirar o auxílio emergencial do governo federal. Houve pico de 194 registros novos da doença na quinta-feira (21).
A chuva e o frio que atingem o estado na última semana também podem agravar o cenário. Tudo isso veio acompanhado da reabertura de comércios e serviços. O governo de Ratinho Jr. (PSD) nunca proibiu as atividades não essenciais e apenas recomendou o fechamento. Com isso, cada prefeitura ficou responsável por suas medidas.
Em geral, municípios do interior foram rígidos nas regras no início da pandemia, mas, com a pressão dos diversos setores e a impressão de situação “confortável” do estado em relação ao restante do país, acabaram afrouxando as medidas a partir da metade de abril. Nas últimas semanas, até academias e shoppings voltaram a funcionar nas maiores cidades.
O estado também baixou regras para funcionamento de templos religiosos, que puderam voltar a funcionar nesta sexta-feira (22) com até 30% da lotação máxima, afastamento mínimo de dois metros entre as pessoas e uso de máscaras.
Em contrapartida, o governo anunciou a ampliação da capacidade de testes para diagnósticos da Covid-19 em 830%. O número de exames diários saltou de 600 para até 5.600.
Em Curitiba, a aposta foi na sensatez da população. Nunca houve proibição explícita da prefeitura para funcionamento das atividades não essenciais. Em geral, apenas os shoppings continuam fechados, mas a maioria deles reabrirá na segunda-feira. A prefeitura afirma que até as casas noturnas podem funcionar, desde que atendam as regras de distanciamento estabelecidas pelo órgão.
“Todo mundo que abre sabe que, se precisar fechar, vai fechar, mas por consciência, civilização, por instinto de sobrevivência”, disse o prefeito Rafael Greca (DEM) em entrevista na quinta-feira (21) à BandNews TV.
Mesmo com as poucas regras, a taxa de incidência da Covid-19 em Curitiba é a menor entre as dez capitais mais populosas do Brasil. São 455 casos a cada um milhão de habitantes, enquanto a taxa nacional é de 1.292 casos. Em algumas capitais esse índice passa de 6.000.
A situação mais delicada está no Noroeste do estado onde o surto do novo coronavírus em um frigorífico de Paranavaí fez aumentar exponencialmente o número de pessoas contagiadas na cidade e em outros 21 pequenos municípios da região, onde moram seus 2.100 empregados.
A região Norte também fica mais exposta por conta da divisa com São Paulo, foco da doença no Brasil. No início da pandemia, a prefeitura de Maringá, terceira maior do Paraná, baixou decretos rígidos para forçar o isolamento da população. Após pressão, o comércio reabriu gradativamente, mas registrou aglomerações, principalmente em bares e restaurantes.
O aumento de casos e o registro de um surto da Covid-19 no hospital psiquiátrico da cidade fizeram a prefeitura retomar algumas medidas, como toque de recolher entre 23h e 5h, sob pena de multa de R$ 200. Foram proibidas mesas nas calçadas e música ao vivo em bares.
“O retorno das atividades passou para a população que estava tudo resolvido, então tivemos que ser mais duros nas medidas”, explica o prefeito Ulisses Maia (PSD).
Ele aponta que, pela proximidade, o feriadão prolongado em São Paulo também acendeu o alerta da cidade, mesmo que a situação dos leitos esteja relativamente controlada.
A ocupação de UTIs exclusivas para pacientes da Covid-19 no município era de 31% nesta sexta-feira. Na região Norte, de forma geral, a taxa é de 49%, a maior do estado, seguida da área Leste, onde fica Curitiba, com 40% de UTIs ocupadas. “O dado mais preocupante [do Norte] é derivado da comunicação maior com São Paulo”, explica Souza.
“Não existe situação confortável em relação ao coronavírus, mas uma fotografia diária”, ressalta o secretário Beto Preto. Ele diz que o governo pode revisar medidas de isolamento a qualquer momento caso seja observado um aumento exponencial da doença no estado.
Folhapress