Documentos oficiais indicam que o então presidente da República, Jair Bolsonaro, recebeu no Palácio da Alvorada o estojo com as joias que ingressaram de forma ilegal no Brasil, na bagagem de integrantes da comitiva do ministro de Minas e Energia (MME), à época sob comando Bento Albuquerque.
As joias faziam parte de um presente do governo saudita ao casal Bolsonaro. A caixa com joias femininas, destinadas à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, acabou retida na inspeção da Receita Federal no aeroporto de Guarulhos. A caixa destinada a Jair Bolsonaro, no entanto, não foi interceptada pelos fiscais da Receita Federal.
Um documento da Presidência da República, obtido pelo jornal O Estado de São Paulo, mostra que o estojo que guardava um relógio com pulseira em couro, um par de abotoaduras, uma caneta, um anel e um masbaha (rosário muçulmano), todos da relojoaria suíça Chopard, foram recebidos por Bolsonaro no Palácio do Alvorada, residência oficial da presidência da República.
Segundo o documento assinado pelo funcionário Rodrigo Carlos do Santos às 15 horas e 50 minutos do dia 29 de novembro de 2022, o item foi entregue e visto pelo ex-presidente.
As joias sauditas, que teriam ficado por mais de um ano em um cofre do Ministério das Minas e Energia, foram listadas no acervo pessoal do ex-presidente, diferentemente do que define a lei e resolução do Tribunal de Contas da União (TCU). Em 2016, a corte definiu que presentes recebidos pelos presidentes da República devem ser repassados à União. Com a inclusão no acervo pessoal, os presentes teriam sido levados por Bolsonaro quando deixou o país faltando apenas dois dias do final do mandato.
CGU entra no caso
Em mais uma frente de investigação, a Controladoria-Geral da União (CGU) entrou no caso. Ela se junta a outras três instituições que apuram a entrada das joias milionárias em outubro de 2021: Receita Federal, Polícia Federal e Ministério Público Federal. A Polícia Federal deve ser a primeira instituição a convocar para explicações, não só o ex-presidente, mas também a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.
O procedimento iniciado pela CGU é denominado Investigação Preliminar Sumária (IPS). O órgão justificou a investigação pela presença de autoridades que poderiam estar envolvidas e com a possível participação de servidores públicos de diversos órgãos federais no caso da entrada ilegal no país das joias.
A investigação da Receita Federal, por sua vez, deve apurar como o segundo estojo de joias, recebido por Bolsonaro, passou pela fiscalização do Aeroporto Internacional de Guarulhos. Já a investigação do Ministério Público Federal de São Paulo (MPF-SP), que pediu mais informações à Receita sobre a apreensão no aeroporto de Guarulhos, deve andar em conjunto com a investigação realizada pela Polícia Federal (PF), e deve apurar se aconteceram crimes. A entrada dos objetos no país com a comitiva do Ministério de Minas e Energia (MME), à época sob comando Bento Albuquerque, pode configurar ao menos três crimes, o descaminho, o peculato e a lavagem de dinheiro.
O descaminho é a tentativa de driblar o pagamento de impostos na entrada de mercadorias no país, com penas previstas de 1 a 4 anos de prisão. Já o peculato, é quando um funcionário público se apropria de qualquer bem, público ou privado, em função do cargo que ocupa, esse crime tem a previsão de 2 a 12 anos de prisão. A lavagem de dinheiro é a ocultação da origem ilícita de um bem, com penas que vão de 3 a 10 anos de prisão.
Outra investigação possível, pode ser apurar se aconteceu interferência na Receita Federal. O órgão, mesmo com o valor elevado das joias, só realizou a “notícia de fato”, comunicando ao Ministério Público Federal (MPF) a apreensão do item, mais de um ano depois, somente após a revelação do caso pela imprensa.
Usualmente a Receita comunica ao MPF após uma apreensão quando há indícios de crimes, como o descaminho ou a lavagem de dinheiro, para que o órgão decida se existem elementos para a abertura de uma investigação. Ao invés disso, a Receita já previa colocar as joias em leilão até a divulgação pública do caso.
Correio Braziliense