O setor de educação vive um momento instigante. Com a pandemia, todo mundo fez o possível para se adaptar. No ensino privado, com mais recursos, houve uma corrida para preservar as atividades com a estruturação, relativamente rápida, de ambientes de aprendizagem online ou outras aplicações colaborativas.
A regra geral foi acelerar a digitalização, em um movimento sem precedentes em nível global. Um exemplo é um dado da Microsoft: em abril de 2020, passado um mês da eclosão da pandemia, mais de 183.000 instituições de ensino já usavam o Teams, plataforma de videoconferência da empresa sediada em Seatlle, nos Estados Unidos. Na ocasião, o próprio CEO da empresa, Satya Nadella, disse que a Microsoft tinha visto uma transformação digital inicialmente prevista para acontecer em dois anos sendo acelerada para apenas dois meses.
Também nos Estados Unidos, em 2020, o número de laptops e tablets enviados para escolas primárias e secundárias quase dobrou — de 14 milhões para 26,7 milhões, de acordo com dados da Futuresource Consulting, uma empresa de pesquisa de mercado da Grã-Bretanha. O movimento também chegou ao mercado de investimentos: o financiamento de risco e capital para start-ups de tecnologia educacional mais do que dobrou, subindo para US$ 12,58 bilhões em todo o mundo no ano passado, de US$ 4,81 bilhões em 2019, de acordo com um relatório da CB Insights, uma empresa que monitora startups e capital de risco.
No Brasil, embora essa jornada de transformação não possa ser comparada – em termos de volume – a de países mais avançados, o movimento foi similar em rapidez, especialmente no ensino privado, capaz de decisões mais ágeis.
Sem poder abrir as portas, muitas instituições foram à luta e conseguiram manter as atividades de ensino e aprendizagem empregando ambientes virtuais, via videoconferência e outros aplicativos de aprendizagem. Os balanços anuais dos principais grupos educacionais são testemunhas dessa crescente migração para o ensino digital.
A jornada transformacional, no entanto, não deve se limitar a uma mera adaptação de ferramentas tecnológicas ou do treinamento de gestores e professores para essa realidade. Quem saiu na frente, antes mesmo da pandemia, estava desenhando esse salto do modelo educacional do analógico para o digital.
Em paralelo, tem sido necessário repensar metodologias educacionais para promover engajamento e melhor experiência para o estudante. O ensino digital, afinal, não pode ser uma mera transposição da lousa para a tela do notebook.
Daí a importância de atrair as startups para inovar. Não há dúvidas de que o ensino jamais voltará a ser 100% presencial, mesmo quando passada a pandemia, como todos nós esperamos. Leva vantagem, no score, quem, lá atrás, desenvolveu programas de aceleração de startups de tecnologia educacional.
Esse mercado, aliás, está aquecido. De acordo com um estudo da Associação Brasileira de Startups, o Mapeamento Edtech 2020, trata-se de um segmento de mercado em franco crescimento. O levantamento identificou a existência de 449 edtechs ativas no Brasil – 70,6% delas oferecendo soluções para o ensino básico (infantil, fundamental e médio). Somente a Ser Educacional anunciou um plano de investimentos com R$ 100 milhões alocados para a compra das edtechs em 2021.
Outra tendência é acoplar plataformas de marketplace. O que já bem funciona no comércio eletrônico também vale para a educação. É o típico caso de limão que vira limonada. O marketplace permite reunir centenas de cursos online de educação continuada – o que permite desde a oferta de cursos europeus, em um curso de extensão que seria caríssimo se presencial, até treinamentos para equipes corporativas, que saem formadas com um diploma de uma instituição de ensino superior.
Diante de um mercado com déficit de mão de obra em Tecnologia da Informação, que pode chegar a 290 mil profissionais em 2024, de acordo com dados da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), os cursos digitais também dialogam bem com demandas por gente qualificada.
É muito mais fácil estruturar, inclusive com a participação de gigantes do setor, cursos de Big Data, Cloud Computing, TI In House, Inteligência Artificial, Segurança de Dados, User Experience, Design Thinking, Java, Banco de Dados e Internet das Coisas.
Ou para os empreendedores do conteúdo digital, cursos de streaming, design de jogos e produção de vídeos para internet. A digitalização traz para o jogo essa flexibilidade e rapidez, o que não aconteceria tão facilmente em um campus, onde é preciso casar disponibilidade de professores com salas de aula.
No nosso entendimento, a tendência mais forte, assim que for possível retomar plenamente e com segurança as atividades presenciais, é o ensino híbrido.
Significa, em uma definição simples, combinar o melhor dos ambientes virtual e presencial, ou seja – as já conhecidas vantagens de estudar em casa com os inquestionáveis benefícios de ir à faculdade (laboratórios, para ficar em um único exemplo). É uma fusão em que os dois modelos se se complementam, permitindo uma educação mais acessível, fluida e sem fronteiras de espaço ou tempo, com várias possibilidades exploratórias que beneficiam o aluno.
Não é mais cabível encaixotar o ensino num modelo anacrônico. Longe de ser uma ferramenta, a tecnologia é uma maneira de pensar e deve estar no centro da estratégia das empresas de educação.
Mais do que nunca, as instituições têm o dever de ajudar os alunos a aprender com mais eficácia e de desenvolver suas habilidades e capacidade de inovar.
Só assim serão capazes de fomentar um desejável senso de empreendedorismo e de adquirir os conhecimentos técnicos e comportamentais tão procurados nos profissionais de hoje: versatilidade, desejo infatigável de aprender e inteligência emocional para lidar com os desafios desse mundo tão imprevisível.
*Joaldo Diniz é Diretor Executivo de Inovação e Serviços do Grupo Ser Educacional, um dos maiores grupos educacionais do País e líder nas regiões Norte e Nordeste