Pedro Augusto
A afirmação acima é do especialista em Economia e colunista do Jornal VANGUARDA, Maurício Assuero, que analisou, através de entrevista, vários aspectos relacionados às finanças do país e do mundo, em tempos difíceis de propagação do novo coronavírus. O responsável pela coluna ‘Destaque Econômico’ do VANGUARDA também avaliou as situações do Estado e de Caruaru.
Jornal VANGUARDA – Que impactos financeiros já estão sendo observados em todo mundo devido à propagação do Covid-19?
Maurício Assuero – Nós temos observado uma queda intensiva nas bolsas de valores no mundo inteiro e perdas de fortunas individuais. Na primeira semana de março, aproximadamente, 500 investidores já tinham perdido algo em torno de US$ 450 bilhões de dólares. Lamentavelmente, esse cenário vai piorar porque em todo mundo as fronteiras estão fechadas, o consumo caiu vertiginosamente e, com ele, a produção. Os esforços, agora, do ponto de vista econômico, é salvar empregos. Se não conseguirmos, os resultados serão piores do que na Grande Depressão que ocorreu em 1929. Repare que até mesmo a circulação da moeda pode ser um agente propagador do vírus e, só isso, demonstra o cenário de horror econômico que vamos enfrentar.
JV – No Brasil, os efeitos negativos provocados pelo novo coronavírus poderão ser ainda maiores do que vêm sendo estimado pelos economistas?
MA – Eu acho que o cenário ainda é muito incerto. Não há dúvida de que se for reproduzido aqui o que aconteceu na Itália, o desastre será superlativo, até mesmo porque temos uma população bem maior. Mas os governos adotaram medidas drásticas no sentido de proibir a circulação de pessoas, mesmo com todos os danos que isso vai causar na economia. O governador de Pernambuco mandou fechar shoppings, academias, teatros, comércio de praias etc. A Feira de Caruaru foi suspensa, em Santa Cruz do Capibaribe, o Centro de Modas não funcionará. A gente sabe que neste último caso chegam pessoas de todo Brasil e isso seria um risco muito grande. Então, se conseguirmos sucesso em 30 dias, vamos perder menos do que o esperado. Nesse tempo, esperamos que surja uma vacina e tudo volte ao normal. Se conseguirmos amortizar a propagação, os efeitos serão atenuados, mas ponha um ano e meio para voltarmos aos níveis econômicos do inicio do ano. O pior cenário é caso não consigamos debelar o contágio. Se isso acontecer, dificilmente o país se recuperará num prazo de cinco anos.
JV – De que forma o senhor avalia as medidas que estão sendo postas em prática pelo Governo Federal no intuito de tentar minimizar ao máximo o caos financeiro impulsionado pela doença?
MA – Essa pandemia pegou o Brasil numa trajetória tímida de crescimento, mas o importante é trazer a confiança do empresário de volta. O governo anunciou um pacote de medidas para ajudar as micro e pequenas empresas, ajudar empreendedores individuais e pretende destinar R$ 15 bilhões para ajudar os autônomos. Também tem previsão de ajuda via programa do Bolsa Família. Essa é a questão fundamental: permitir que a população tenha renda e possa manter o nível de consumo que tinha antes. No meu entendimento houve um certo desprezo por parte do presidente Jair Bolsonaro. Em minha opinião, o Ministério da Economia perdeu uma semana cometendo o mesmo erro o qual Lula cometeu em 2008, quando disse que a crise “era só uma marolinha”. Lógico que as mortes de 2008 foram apenas de pessoas que perderam fortunas na bolsa de valores e, agora, têm pessoas morrendo por causas diferentes. Tanto em 2008 como agora, o governo pretendeu manter o consumo, mas internamente já se deveria estar negociando alternativas.
JV – Quais consequências em relação à economia nacional poderão ser identificadas com os constantes destemperos do presidente do Bolsonaro e de seus filhos, neste momento difícil de pandemia mundial?
MA – Em relação aos filhos, pelo menos neste momento, eu vi um comentário infeliz do deputado Eduardo Bolsonaro culpando a China. Na verdade, somos todos vítimas. Começou na China, ocorreu omissão de dados por parte das autoridades de lá e tudo mais. O Brasil mantém uma matriz comercial com a China, temos até um escritório lá comandado por uma especialista na economia chinesa, de modo que não achei oportuno a forma como foi dito. Se essa era a opinião dele, deveria ter tido numa roda de amigos, mas não da forma que fez. Eu discordo de várias coisas que o presidente faz, mas minha preocupação neste instante é que aumentar a instabilidade política não vai ajudar. Acho que a população tem todo direito de criticar ou de apoiar, afinal vivemos numa democracia (pelo menos no papel). Agora, querer impor um processo de impeachment num momento deste é tão condenável quanto algumas coisas que ele faz e fala. Não iremos atrair investidores botando para fora um presidente a cada mandato. Eu não sou jurista, mas o artigo 4º da Lei Nº 1079/50, especifica os crimes de responsabilidade do presidente, pelos quais ele pode ser impedido. Eu não vejo como enquadrá-lo nos incisos deste artigo e vejo como pontos negativos para economia essas tentativas. Eu sou defensor da Constituição. Em minha opinião, a forma de tirar um governante ruim do poder é pelo voto. Vejo um defeito muito grande da oposição que é a falta de projetos estruturadores. Há 15 meses que a oposição só fala “fora Bolsonaro”. O problema é que todos estão interessados no poder e não no país. Deveriam votar contra o que fosse ruim, votar a favor do que fosse bom, mas não fazem isso. Intensificam o ódio vivenciado por ambos os lados.
JV – Quais serão os desafios após o controle do Covid-19?
MA – Imagine uma pessoa que vive confinada numa cadeira de rodas e faz um tratamento com células tronco e volta a andar… Tem todo um processo de reaprendizagem, de confiabilidade em se manter em pé. Teremos que fazer o mesmo. O governo baixou os juros para 3,75% ao ano. Na prática, isso significa que os juros reais serão negativos (juros reais são aqueles quando se desconta a inflação). Isso deve provocar uma fuga de aplicações de renda fixa e aumento na bolsa. A desvalorização do real poderia ter nos salvado com o aumento de exportações, mas o quadro foi esse: os países não compram nosso produto porque a produção deles também caiu. Todo mundo tem cobrado muito do governo investimento público, mas isso só vai ser possível se houver flexibilização da PEC dos gastos, que depende do Congresso. Costumo dizer que destruir é mais fácil do que construir ou reconstruir. Perdemos um ano e se antes eu achava que teríamos um crescimento entre 1,5% e 2%, com as medidas adotadas pelos governos estaduais, acredito que não haverá crescimento em 2020.
JV- É sabido que todas as classes econômicas estão sendo prejudicadas com a propagação da doença, mas atualmente tem se havido uma preocupação maior em relação às atividades dos trabalhadores informais e das micro-empresas. Quais seriam as alternativas para tentar se garantir impactos menos desastrosos em relação a este nicho específico de mercado?
MA – As micros e pequenas empresas representam algo em torno de 30% do PIB brasileiro. É preciso esforços para que elas não encerrem as suas atividades. Acredito que criar linhas de crédito direcionadas ao setor, rever dívidas etc. Também poderia se constituir em ações proativas que as ajudariam. As grandes empresas possuem recursos adicionais, podem fazer chamamento público de ações, podem captar recursos através de títulos de dívidas, como debêntures, por exemplo, mas as pequenas não.
JV – Em relação a Pernambuco e Caruaru, qual a análise a ser feita e as projeções futuras?
MA – No ano passado, Pernambuco obteve um crescimento econômico superior ao do país. Grande parcela do PIB do Estado, cerca de 75%, está concentrada em serviços, onde se destacam o turismo e o comércio. Temos uns 20% para indústria e uns 5% para o agropecuário. O impacto maior vai ser, exatamente, no segmento que mais contribui. O fechamento do comércio, a proibição de aglomeração, em bares etc, reduzirá essa parcela absurdamente. Turismo, fica para discutir políticas no segundo semestre do ano. No caso de Caruaru, a situação não é muito diferente. Temos a feira, que já foi afetada, temos o adiamento do espetáculo de Fazenda Nova e temos o São João se aproximando e, querendo ou não, isso, é uma grande preocupação. Temos dois meses para debelar esse surto porque se chegarmos em maio com suspeitas, não vai ser fácil.
JV – Quais são as recomendações econômicas para os atuantes dos setores formais e informais de Caruaru?
MA – É necessário ser feito esforços para manter o pessoal informal com renda, pois como dizia Keynes “pague a um cidadão para de manhã carregar pedras de um lugar para outro e de tarde trazê-las de volta”. Fazer uma avaliação de quanto pode ser tirado de investimento, de quanto se pode reduzir de gastos, para sobrar dinheiro e incentivar a atividade econômica. Buscar recursos externos, no Banco Mundial, no Bird, enfim, focar projetos que sejam geradores de renda no curto prazo. Olhar o quanto pode ser feito com os impostos, eventualmente postergando a cobrança. Como a prefeitura tem por base arrecadação, precisa planejar ações com um nível de arrecadação menor e no meu entender isso significa apertar o cinto.